No Irã, mineração de bitcoins coloca em risco abastecimento de energia no inverno
Durante o verão, os cortes de energia no Irã se multiplicaram. A população de 84 milhões de habitantes teve de enfrentar temperaturas de até 50°C sem se fiar em congeladores ou no ar-condicionado devido a apagões quase diários e que podiam durar horas. Com a queda na temperatura, os iranianos já temem novos cortes no abastecimento de eletricidade durante o inverno.
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De Bahar Makooi, da France24
A falta de energia é causada pela proliferação de locais de mineração de criptomoedas, incluindo fazendas gigantescas administradas por empresas chinesas.
O Irã foi um dos primeiros países a legalizar a "mineração" de bitcoins em setembro de 2018, com permissão prévia das autoridades. A ideia era, com as transferências de criptomoeda geradas por mineração, escapar do sistema de sanções internacionais que sufoca e economia iraniana.
No entanto, a economia da mineração tornou-se um problema sério no abastecimento de eletricidade do país. Por conta dos cortes de energia, as autoridades iranianas proibiram a as operações em meados de maio, mas foram pressionadas pela economia a reautorizar essa forma de obter dólares.
Mineração para conseguir dólares
A mineração de bitcoin consiste em adquirir criptomoeadas prestando um serviço para a rede que consiste em resolver problemas matemáticos usando computadores muito poderosos. O problema é que esses milhares de máquinas e seus sistemas de refrigeração estão agrupados em "fazendas de bitcoin", pontos de alto consumo de energia.
Além das empresas legalizadas no país, a loucura por criptomoedas e o preço em alta desta moeda virtual – um bitcoin vale cerca de US$ 55 mil – levaram a um aumento no número de "operações de mineração" destinadas a obter estas preciosas moedas no território iraniano.
No último domingo (10), a empresa pública de distribuição de eletricidade lançou o alerta: ao menos "10% dos cortes de energia do próximo inverno" podem ser causados pelo "uso de computadores de mineração ilegais", advertiu o fornecedor de energia.
Investidores chineses fazem suas bitcoins no Irã
Desde 2018, empresas estrangeiras, incluindo as chinesas, correram para o Irã para extrair bitcoins pagando tarifas baixas pela eletricidade.
Foi durante os repetidos cortes de energia que a maioria dos iranianos descobriu que as fazendas mais consumidoras eram dirigidas por investidores chineses.
"A primeira vez que ouvimos falar da presença de investidores chineses nesta indústria no Irã foi quando houve uma onda de cortes de energia em janeiro de 2020. (...) Tudo o que sabíamos era que os investidores iranianos que tinham laços estreitos com o governo, parceiros comerciais do governo ou mesmo militares, tinham fazendas de bitcoin. Por exemplo, eu conheço um perto de Shiraz. Eles não compram mais nem mesmo eletricidade do governo e construíram sua própria usina elétrica", diz este empreendedor iraniano, que recentemente tentou e não conseguiu montar sua própria fazenda de bitcoin no Irã.
A maior dessas fazendas de bitcoin iranianas pertence à empresa chinesa RHY e está localizada no sudeste do país. Uma investigação realizada pela France 24 Observers em janeiro revelou que o local consome 175 megawatt-hora (MWh), equivalente ao consumo de eletricidade de uma cidade de 30.000 habitantes ou um quinto da eletricidade de Rafsanjan, a cidade mais próxima.
Consumo de uma cidade de 100.000 habitantes
As autoridades iranianas afirmam que existem até 14 fazendas de bitcoin legais no país, sem especificar seus proprietários. No total, de acordo com números oficiais, estas fazendas consomem cerca de 300 MWh. Mas de acordo com estimativas independentes citadas por The Observers, estes números são subestimados e as mega-fazendas consumiram a energia necessária para abastecer uma cidade de 100.000 habitantes.
A Turquia é outro país que tem sido favorecido para a obtenção de licenças de mineração e permissão para construir gigantescas indústrias de produção de criptomoeda. Como uma empresa turca recentemente instalada em Semnan, ao norte do país.
Fazenda ilegal no subsolo da Bolsa de Valores de Teerã
Segundo um relatório parlamentar iraniano, das 324.000 bitcoins extraídas anualmente no mundo todo, 19.500 são extraídas na República Islâmica. Estes números não levam em conta a existência de fazendas ilegais.
Mais de mil locais de mineração ilegal foram desmantelados no país no ano passado, de acordo com a empresa pública de distribuição de eletricidade.
A última descoberta, e não menos surpreendente, foi que computadores não-declarados usados para mineração de criptomoedas foram encontradas no subsolo da Bolsa de Valores de Teerã. O escândalo levou à renúncia do presidente da instituição financeira, Ali Sahraï, no início de outubro.
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