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TPI quer julgar crimes ambientais; desmatamento e uso de mercúrio estão no visor da corte internacional

O Tribunal Penal Internacional (TPI) poderia julgar “crimes ambientais” sem alterações do estatuto do órgão. O procurador Karim Khan alegou nesta quarta-feira (7), em entrevista, que danos ambientais são muitas vezes causa ou consequência de crimes de guerra ou contra a humanidade que já fazem parte da alçada do TPI. Denúncias contra o ex-presidente Jair Bolsonaro por desmatamento foram novamente apresentadas ao TPI. Destruição da Amazônia e uso de mercúrio no garimpo estão no visor da corte.

Uma vista aérea mostra área desmatada próxima a Uruara, no estado do Pará, em 21 de janeiro de 2023.
Uma vista aérea mostra área desmatada próxima a Uruara, no estado do Pará, em 21 de janeiro de 2023. REUTERS - UESLEI MARCELINO
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“Atacar uma central nuclear, uma barragem, utilizar produtos químicos, financiar um conflito através da extração de minerais preciosos, todos estes podem ser métodos pelos quais são causados ​​danos ambientais num contexto de genocídio, crimes de guerra , crimes contra a humanidade, até crimes de agressão", declarou o procurador, enumerando os quatro crimes já abrangidos pelo TPI, que tem sede em Haia, de acordo com o Estatuto de Roma, o seu texto fundador.

A destruição maciça ou a poluição do ambiente poderiam, portanto, ser suficientes para fornecer motivos para a acusação de crimes de guerra. Estes ataques, descritos como ecocídios, já documentam crimes contra a humanidade, como no caso da deportação de crianças, investigada pelo TPI, que conduziu a um mandado de detenção contra o presidente russo, Vladimir Poutine.

O gabinete de Khan prepara um documento de política geral, que ele pretende promulgar em dezembro, que deve estabelecer o quadro jurídico para abranger os crimes ambientais sem ter de acrescentar um quinto crime aos enumerados pelo estatuto de Roma.

“Estamos tentando ver, de forma mais precisa e eficaz, como os crimes ambientais já estão incluídos no Estatuto de Roma”, explicou o procurador.

"O Estatuto de Roma se centra acima de tudo nos crimes contra indivíduos ou objetos protegidos, como igrejas, mesquitas, sinagogas ou patrimônio da Unesco, mas devemos alargar o nosso horizonte durante os conflitos. O meio ambiente é muitas vezes alvo e muitas vezes a luta pelos recursos em detrimento do meio ambiente é um motor de conflitos", sublinha Khan, questionado sobre se os bombardeios massivos na Ucrânia ou em Gaza poderão entrar na definição de crimes ambientais.

“Olhem para o Darfur”, disse o procurador que acaba de voltar da região. “A escassez de água e as secas, (...) também desencadearam animosidade”, em uma área em plena desertificação há mais de 50 anos, alimentada pelo aquecimento global.

“Muitas vezes, o conflito pode assumir a forma de uma oferta comercial para obtenção de terras raras, diamantes, ouro e madeira. Neste contexto, o meio ambiente sofre danos consideráveis”, afirma o magistrado britânico.

Desmatamento no visor

Karim Khan cita ainda “o uso de cianeto” e “mercúrio para extrair” minerais preciosos. “Ecossistemas inteiros são degradados, até mesmo destruídos, rios cheios de vida, plantas selvagens e peixes tornam-se terrenos baldios onde há morte e desespero", lamenta. 

“Esta é a primeira vez na história do Tribunal Penal Internacional que temos um documento de orientação sobre as formas que os crimes ambientais podem assumir, no âmbito do nosso atual mandato”, afirmou.

Sua antecessora, Fatou Bensouda, já tinha anunciado em 2016 que o TPI se concentraria na “devastação ecológica, na exploração ilícita de recursos naturais ou na expropriação ilícita de terras”, um alerta aos empresários e políticos, mas que não foi seguido de efeitos visíveis.

“Uma ideia como promessa ou esperança é muito diferente de uma política ponderada”, justificou-se Khan para defender a natureza sem precedentes de sua iniciativa.

Em 2021, pelo menos duas denúncias por “crimes contra a humanidade” foram apresentados no TPI contra o presidente brasileiro Jair Bolsonaro por seu papel no desmatamento da Amazônia. Nenhuma informação vazou desde então.

“Hoje inicia-se um processo de pré-consulta que, na próxima semana, convidará os Estados, as empresas, as partes interessadas e a sociedade civil a dizer o que acham que deve ser incluído neste documento de orientação”, cuja primeira versão deve ser publicada em abril, antes de sua promulgação em dezembro, detalhou Khan.

Ele falou às margens de uma reunião sem precedentes de cerca de 100 de procuradores e juízes de tribunais supremos ou regionais para debater, no Conselho Constitucional de Paris, a inclusão das gerações futuras no desenvolvimento da justiça ambiental. 

(Com AFP)

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