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"Uma noite de horror": moradores de Huwara testemunham violência inédita na Cisjordânia

O caos é total em Huwara, cidade da Cisjordânia ocupada. Uma centena de colonos israelenses realizaram uma incursão durante a noite de domingo (26) para se vingar de dois assassinatos. Um palestino foi morto a tiros e cerca de cem foram feridos na madrugada. Dezenas casas e carros foram incendiados. "Um verdadeiro massacre", afirmam militantes israelenses antiocupação.  

Colonos judeus incendiaram dezenas de casas e carros em Huwara, a Cisjordânia ocupada, na noite de domingo (26).
Colonos judeus incendiaram dezenas de casas e carros em Huwara, a Cisjordânia ocupada, na noite de domingo (26). © Sami Boukhelifa/RFI
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Sami Boukhelifa, enviado especial da RFI a Huwara 

"Foi a guerra nua e crua", diz Ali Abderahmane, socorrista da ONG Crescente Vermelho. "Não podíamos nem mesmo sair para ajudar as pessoas. O exército israelense e os colonos bloquearam a passagem. A cidade foi tomada por gás lacrimogênio e a fumaça dos incêndios. Trabalho como socorrista desde 1999 e nunca vi nada parecido", reitera. 

Os moradores de Huwara estão em choque e relatam ataques indiscriminados da parte de colonos judeus.  A violência sem precedentes assustou os palestinos já acostumados com agressões. Famílias inteiras não foram queimadas vivas por pouco, muitas foram retiradas de suas casas pelos próprios militares israelenses.

Morador de Huwara, Youcef avaliava os destroços da noite de violências na manhã desta segunda-feira. Segundo ele, colonos vindos de Itsar queimaram seu carro e um caminhão-cisterna que usa para trabalhar. À reportagem da RFI ele mostra as casas queimadas em seu bairro, algumas ainda sob a fumaça dos incêndios. "Que catástrofe! Tudo foi reduzido a cinzas. Essa perda vai custar milhões. E eles fizeram tudo isso sob a proteção do exército israelense", garante. 

O palestino Youcef avalia os estragos do ataque de colonos judeus em Huwara, na Cisjordânia ocupada.
O palestino Youcef avalia os estragos do ataque de colonos judeus em Huwara, na Cisjordânia ocupada. © Sami Boukhelifa/RFI

Seu irmão, Atta, testemunha "uma noite de horror", que traumatizou seus filhos. "Os colonos estavam armados e atiravam para matar. Minhas crianças não conseguiram dormir, eles estão aterrorizadas. Meu caçula não quer sair de perto de mim. Assistimos, impotentes, à destruição de nossos bens. Se ousássemos reagir, eles teriam nos assassinado", conta. 

 

Uma vingança cega 

As violências ocorreram na tentativa de vingar a morte de dois colonos assassinados por um palestino no domingo. Enquanto o agressor segue em fuga, uma cidade inteira parece pagar pelo crime.

Empolgados, alguns colonos israelenses se filmavam enquanto atacavam a cidade. Ao fundo das imagens, Huwara queimava, em um cenário quase bíblico. "Os judeus não ficarão mais quietos", dizia um dos agressores em uma gravação publicada nas redes sociais.  

Neste interminável conflito entre israelenses e palestinos, que dura décadas, há fases mais calmas e outras de violências incontroláveis, a exemplo do que ocorre neste momento. Enquanto isso, o exército israelense realiza duras operações em cidades palestinas, que frequentemente termina com a morte de civis e combatentes. Do outro lado, colonos pagam o preço da ocupação com suas vidas. "É olho por olho, dente por dente", diz um morador de Huwara à RFI sem se identificar. 

120 ataques em 8 meses

Huwara está no caminho das colônias do norte da Cisjordânia ocupada. Há meses, colonos israelenses agridem os moradores, vandalizam seus bens, sob a total impunidade. Impulsionados pelo novo governo ultraconservador, no poder desde o final de dezembro, os agressores estão fora de controle. 

"Nos últimos oito meses, contamos 120 ataques de colonos", diz Kamel Oudeh, secretário-geral do Fatah em Huwara, partido no poder na Cisjordânia ocupada. "Eles chegam, destroem e atacam com o aval das forças de ocupação. Mas o ataque da noite passada é sem dúvida o mais violento já visto", diz.

Casas, lojas e infraestruturas foram incendiadas. "Olhando as imagens, a impressão que temos é que Huwara foi bombardeada. Eles sistematicamente queimaram tudo", ressalta Oudeh. 

Na manhã desta segunda-feira, a cidade está deserta. Os números oficiais apontam para 75 casas queimadas e mais de cem carros incendiados. "Tudo ficará fechado ao menos três dias", diz outro morador à RFI. 

Encontro em prol da paz na Cisjordânia

As violências são registradas em um momento em que a Jordânia acolhe um encontro de autoridades de segurança israelenses e palestinas que tentam restabelecer a paz na Cisjordânia. A extrema direita de Israel rejeita a iniciativa.  

Em uma tentativa desesperada de acalmar os ânimos, o primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, lembrou que "não se faz justiça com as próprias mãos". O premiê pediu que os moradores de Huwara deixem "as forças de segurança cumprirem sua missão". 

Organizações de defesa dos direitos humanos denunciam um "massacre" apoiado pelo governo israelense. Já o presidente palestino, Mahmoud Abbas, acusa Tel Aviv de "proteger atos terroristas perpetrados por colonos".

Desde o início deste ano, mais de 60 palestinos foram mortos pelo exército israelense ou por colonos judeus. Onze israelenses morreram em ataques realizados por palestinos. 

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