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Migrantes sírios relatam "inferno" na fronteira entre Belarus e Polônia

A escalada diplomática entre a Belarus e a União Europeia atingiu um novo patamar nesta quinta-feira (11). O presidente bielorusso, Alexander Lukashenko, ameaçou interromper o funcionamento do gasoduto Yamal-Europa, que atravessa o país e transporta gás russo para o bloco europeu, caso Bruxelas adote novas sanções contra seu governo autoritário. A Alemanha e outros países do bloco têm defendido uma posição firme contra as chantagens de Minsk.  

Família migrante proveniente do Oriente Médio que chegou à Belarus observa a barreira de arame farpado instalada pela Polônia. 10/11/2021.
Família migrante proveniente do Oriente Médio que chegou à Belarus observa a barreira de arame farpado instalada pela Polônia. 10/11/2021. AP
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Romain Lemaresquier, da RFI

Lukashenko, que decidiu se vingar das sanções impostas pela Comissão Europeia após uma violenta onda de repressão a opositores, tem transportado, há meses, migrantes do Oriente Médio para seu território, para que entrem na União Europeia através da fronteira com a Polônia. A maioria são sírios e curdos iraquianos. Sem imaginar que seriam usados como reféns, várias famílias, algumas delas com crianças pequenas, aceitaram os vistos de trânsito oferecidos por Minsk.  

Desde que a polícia polonesa instalou barreiras de arame farpado e passou a rechaçar os migrantes, cerca de 3 mil a 4 mil pessoas, segundo uma estimativa da última segunda-feira, se encontram bloqueadas em uma estreita área de floresta entre os dois países, sob temperaturas que vão se tornando glaciais com a proximidade do inverno. Todos dormem ao relento em uma área de floresta descrita como inóspita.

A líder da oposição bielorrussa, Svetlana Tikhanovskaya, considera a ameaça de Lukashenko aos europeus um "blefe" que não deve ser "levado a sério". Já o presidente russo, Vladimir Putin, aliado de Lukashenko, pediu nesta quinta-feira aos europeus que restabeleçam contato com a Belarus. 

Enquanto a crise diplomática se agrava, e já é apontada como uma guerra híbrida por analistas, em Podlasie, na fronteira bielorrussa com a Polônia, os migrantes vivem uma tragédia humanitária. Tanto representantes do Alto Comissariado da ONU para Refugiados, quanto ONGs e jornalistas foram proibidos de se aproximar da área pelas autoridades polonesas.

A reportagem da RFI conversou com três migrantes sírios que conseguiram entrar no território polonês há alguns dias e pedir ajuda à associação Grupa Granica, uma das únicas presentes a dois quilômetros da fronteira. Os três sírios – Karam, Bitar e Thair – passaram um mês no "inferno", relatou Thair, um eletricista de 28 anos. Eles chegaram a Minsk, a capital da Belarus, em um voo direto proveniente de Damasco, há cerca de um mês. Muito rapidamente, tentaram atravessar para a Polônia, mas ficaram reféns da queda de braço entre a ex-república soviética e a União Europeia.

“Tínhamos que tentar entrar na Polônia. Em nossa primeira tentativa, a polícia me deteve, junto com um amigo, e outras duas pessoas. Os agentes disseram para nós: 'Se você tem advogado, pode ficar na Polônia'. Ficamos muito felizes! Mas, à noite, dois soldados vieram e nos colocaram em um carro para retornar à fronteira e nos mandaram de volta para a Belarus", contou o sírio. Depois de insistir que não queria voltar para trás, ele acabou apanhando dos militares poloneses. O sírio ainda implorou para ficar, dizendo que não tinha água e comida, nem um chip de celular para sobreviver. Mas o apelo foi em vão. 

Violência

Os três jovens nascidos em Homs foram três vezes reconduzidos à Belarus. Em uma das ocasiões, foram levados por bielorrussos para a fronteira da Lituânia, onde também apanharam depois de entrar no país europeu e serem repelidos de volta. De tanto apanharem, um dos jovens acredita que tem costelas quebradas.

Apenas a quarta tentativa de chegar à Polônia deu certo. A ONG Grupa Granica os acolheu e obteve que Karam, Bitar e Thair ficassem sob a proteção do Tribunal Europeu de Direitos Humanos, que emitiu documentos temporários para os refugiados. Essas certidões devem impedir que os três sírios sejam enviados de volta à Belarus, de acordo com Marisha, uma das coordenadoras da ONG polonesa.

Garantir o respeito dos direitos dos migrantes

Depois de obterem a documentação, os três sírios foram transportados por guardas de fronteira para um alojamento do Estado. Teoricamente, eles poderão dar entrada em seus pedidos de asilo. A medida provisória do Tribunal Europeu de Direitos Humanos deve servir como garantia para que não sejam mais expulsos na Polônia. Thair, Karam e Bitar sobreviveram a um mês de incertezas, medo, frio, fome e violências.

Para ter certeza que os guardas de fronteira respeitarão essa proteção provisória, uma parlamentar da oposição polonesa, Anita Sowinska, veio testemunhar essa operação na floresta. Ela se tornou a representante legal dos três sírios, depois de acrescentar seu nome ao documento oficial do tribunal.

Os jovens migrantes de Homs conseguiram, finalmente, deixar o inferno da zona de fronteira. Eles admitiram ter visto mortos durante sua jornada. Até agora, de sete a 12 pessoas morreram em virtude dessa nova crise migratória nas portas da Europa.

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