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Níger: “À medida em que a junta se mantém no poder, a perspectiva de uma solução diplomática diminui”

No Níger, 20 mil apoiadores do golpe se reuniram, no sábado (26), na capital Niamey, no estádio General Seyni Kountché. Na noite de sexta-feira, a junta golpista enviou um ultimato de 48 horas à França para que seu embaixador deixe o país. Por outro lado, a Cedeao continua preparando uma intervenção armada no país para restaurar a ordem constitucional e libertar o presidente deposto, Mohamed Bazoum, ainda detido com a sua esposa e filho.

Níger: 20 mil apoiadores do golpe de Estado se reúnem em Niamey
Níger: 20 mil apoiadores do golpe de Estado se reúnem em Niamey AFP - -
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Por Marion Cazanove

Um mês depois do golpe, o jornalista, professor e presidente do Centro Internacional de Reflexões e Estudos sobre o Sahel (zona entre o Saara e a Savana africana), Seidik Abba, conversou com a RFI e fez um balanço da situação. Ele é o autor de Mali-Sahel, notre Afghanistan à nous (Mali-Sahel, nosso Afeganistão, em tradução livre).

RFI: Milhares de nigerinos apoiam os golpistas. Cerca de 20 mil se manifestaram no sábado, 26 de agosto, em Niamey. Hoje, qual é o sentimento da população? A maioria apoia este golpe?

Seidik Abba: É difícil ter uma avaliação muito precisa da popularidade da junta. Simplesmente notamos a sua capacidade de mobilizar as pessoas para mostrar que não está sozinha. Há este confronto com a França e também, paralelamente, o confronto com a Cedeao (Comunidade Econômica dos Estados da África Ocidental). Então, para a junta, é fundamental mostrar que não está sozinha e que pode mobilizar o máximo de pessoas.

Mas quando você mobiliza uma multidão assim, não é homogêneo. Há pessoas que vêm apoiar a junta, há outras que vêm porque são contra qualquer plano de intervenção militar. E, finalmente, há uma terceira categoria de pessoas que vem porque acreditam que a soberania do Níger deve ser afirmada e que o confronto da junta com a França merece ser apoiado.

RFI: A Cedeao ainda está preparando esta intervenção armada para restaurar a ordem constitucional no país. Na sua opinião, esta crise ainda pode ser resolvida por meios diplomáticos?

Seidik Abba: À medida em que a junta se mantém no poder, a perspectiva de uma solução diplomática e política diminui, uma vez que hoje as posições estão tão distantes que não vejo qualquer compromisso político. A junta está instalada desde o último discurso do seu presidente, general Abdourahamane Tiani, numa perspectiva de transição. Isso significa que, para ela, a Sétima República ficou para trás. Agora, é preciso considerar a Oitava República, implementar a transição enquanto a comunidade internacional e a Cedeao defendem um regresso à ordem constitucional normal com Mohamed Bazoum como presidente.

Então, as posições estão tão distantes que a perspectiva de um compromisso político recua e à medida em que o compromisso político recua, a Cedeao não terá outra opção senão a intervenção militar, uma vez que, para além do caso do Níger, a comunidade põe em risco a sua credibilidade. Ela não conseguiu controlar as transições em Burkina Faso, no Mali e na Guiné, e não quer perder, no caso do Níger. Porque, para ela, abriria caminho, no espaço da África Ocidental, para uma devolução do poder pelas armas.

RFI: Segundo as ordens da junta, o embaixador francês deve deixar o Níger esta noite, após um ultimato enviado na sexta-feira. A França, que não reconhece a autoridade do Conselho Nacional para a Salvaguarda da Pátria (CNSP), não deseja repatriar o seu embaixador. No sábado, durante esta manifestação de apoiantes do golpe, o CNSP declarou que “a luta não iria parar até ao dia em que já não houvesse soldados franceses no Níger”. Este é claramente o próximo passo para você?

Seidik Abba: Não, haverá um confronto porque a posição da França, mesmo antes do processo do embaixador, era não reconhecer a denúncia de vários acordos militares, porque existem acordos que regem a cooperação entre o Níger e a França. A junta os denunciou e a França disse que não os reconhecia. Aqui estamos em uma nova etapa. A junta exigiu a saída do embaixador, Sylvain Itté, no prazo de 48 horas. O Quai d'Orsay respondeu que ele não iria embora. Assim, gradualmente, avançaremos para um confronto aberto entre a junta e a França.

Que tipo de confronto? Como ele vai acontecer? Isso não se sabe, mas me parece que hoje já existe uma posição de confronto de ambos os lados. Não esqueçamos que a França dispõe de recursos militares significativos no Níger: 1.500 soldados. Ela vai alistá-los na proteção da embaixada? A junta irá à embaixada procurar Sylvain Itté para colocá-lo no avião?

Existe um nível bastante elevado de conflito entre a junta e a França. E isso será importante nos próximos dias.

RFI: Como analisa esta estratégia da França, apresentada durante o mês, que consiste em enviar sistematicamente a junta de volta à sua ilegitimidade?

Seidik Abba: Acredito que a França compreendeu que, como sabemos, no início, o golpe de Estado começou a partir da guarda presidencial. Mesmo que depois tenha havido uma declaração de mobilização do alto comando militar.

O Alto Comando Militar deixou claro que reconheceu a declaração do golpe. Não que compartilhe das razões apresentadas para o golpe, mas porque queria evitar um banho de sangue no país.

Assim, a França, na sua avaliação, vê que a junta talvez não seja tão popular no exército e que, se em algum momento houver um confronto com a Cedeao, essa união pode desmoronar. Acredito que estes são os elementos que levam a uma espécie de frente comum entre a Cedeao e a França para se recusarem a reconhecer a junta.

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