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Terrorismo/crianças

“Traumas de crianças que vivenciam terrorismo podem durar a vida toda”, diz especialista

Saffie Rose Roussos, de 8 anos, foi a primeira criança identificada entre os mortos do ataque terrorista em Manchester, no norte da Inglaterra. Seu rosto estampa jornais do mundo todo e páginas da Internet falam de uma menina meiga e cheia de vida, vítima de um ato de selvageria ignóbil e incompreensível. Outras doze crianças e adolescentes de menos de 16 anos estavam na lista provisória de quase 60 feridos.

Saffie Rose, vítima do atentado de Manchester.
Saffie Rose, vítima do atentado de Manchester. twitter
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O diretor da escola onde Saffie estudava, numa comunidade rural em Lancashire, falou ao jornal Le Parisien sobre o choque da notícia e declarou que “todos os habitantes do vilarejo vão ter que se ajudar mutuamente para superar a dor”. Ele informou ainda que uma célula psicológica será instalada para acompanhar os coleguinhas de Saffie.

Vigilância permanente

No caso da França, existem dispositivos específicos de ajuda psicológica para situações de estresse de várias magnitudes, as chamadas “células de urgências médico-psicológicas”, formada por psiquiatras, psicólogos e enfermeiros treinados, em vigilância permanente. Em caso de eventos coletivos, a mobilização se dá em escalas departamental, regional ou nacional.

No caso dos ataques em Paris (130 mortos e 400 feridos), as células foram colocadas à prova de maneira exaustiva, lembra Alexis Lebrun, porta-voz da Associação “Life for Paris”, de ajuda a vítimas do atentado de 13 de novembro de 2015. O grupo, que surgiu no Facebook inicialmente para troca de informações e de relatos de experiências, se organizou e hoje dispõe de estruturas de ajuda legal e orientação médica.

“Há falta de profissionais, principalmente médicos de psiquiatria infantil, mas isso ocorre em todo o país em relação a outras especialidades”, acrescenta Lebrun. Ele próprio sobrevivente do ataque à casa de espetáculos Bataclan, Alexis estima que a França dispõe de um bom sistema de ajuda para as vítimas de traumas psicológicos, comparado a outros países atingidos.

Juventude e luto

Entre as 130 vítimas fatais do Bataclan havia muitos jovens na faixa dos 20 e 30 anos, dados que chocaram o mundo. E agora o grupo Estado Islâmico, em crise, se supera em crueldade ao escolher um alvo repleto de crianças e adolescentes.

Thierry Baubet,professor de psiquiatria infantil e de adolescentes, do Hospial Avicenne (AP-HP), em Bobigny, ao norte de Paris, fala sobre possíveis consequências do ataque de Manchester: “As crianças afetadas diretamente, que foram testemunhas, têm forte probabilidade de desenvolver problemas pós-traumáticos. Há também as que estão em luto, que perderam alguém com quem tinham um laço afetivo, amigos, pais. Isso pode gerar consequências nos próximos meses e até mesmo para o resto da vida. Há ainda as que vivenciaram a situação à distância, sem perigo de vida, mas que podem ter sido afetadas, que podem desenvolver problemas principalmente de ansiedade”, analisa o especialista.

Ele ressalta que o trauma atinge tanto crianças quanto adultos: “O fato de ser jovem não é uma proteção, as crianças desenvolvem problemas pós-traumáticos tanto quanto adultos. Para a criança, a gravidade vem em dobro: há o sofrimento do trauma e os sintomas resultantes, que pode acarretar uma paralisação no desenvolvimento normal da criança”.

Estimular a expressão dos sentimentos

Baubet explica que a terapia é diferente para crianças e jovens, “diferente de um adulto que pode se sentar numa sala diante de outra pessoa e falar sobre o que sente”. Ele explica que os traumas, se aparecerem, podem demorar um pouco para se manifestar. “Enquanto isso, podemos trabalhar com essas crianças, estimular a expressão de emoções que elas vivenciaram. Uma opção é formar grupos com mediação em torno de outros assuntos, onde o trauma também pode ser evocado”, explica.

“Algumas crianças perderam os pais no Bataclan e continuam sob acompanhamento, que pode durar ainda algum tempo. Elas passaram por mortes traumáticas; não é o avô que está doente, que sabemos que vai morrer. São crianças que os pais as colocaram na cama para dormir e quando elas acordaram eles estavam mortos. São situações extremamente traumatizantes, pois é uma ruptura total na vivência cotidiana da criança”, diz o especialista.
 

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