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Reportagem

Em Paris, brasileiros relembram golpe e pedem plebiscito da reforma política

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Em 31 de março de 1964, o exército brasileiro destituiu o presidente eleito democraticamente João Goulart e estabeleceu um Estado de exceção, apoiado pelos Estados Unidos e a burguesia conservadora. Embora o Golpe Militar complete 50 anos nesta segunda-feira (31), não se pode dizer que ele ficou no passado.

Manifestantes reunidos na Place de La Reine Astrid, em Paris.
Manifestantes reunidos na Place de La Reine Astrid, em Paris. RFI
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Além das marcas evidentes sobre as famílias de quem foi torturado, assassinado ou desapareceu nas mãos do regime, resta em nossa estrutura política, policial e administrativa um legado nefasto dos mais de 20 anos de ditadura. A anistia de 79 equiparou algozes e vítimas e permitiu que figuras icônicas dos governos militares se perpetuassem no poder indefinidamente. O regime de exceção à brasileira virou regra.

À solta

José Sarney, por exemplo, que chegou até a presidir a Arena, comandava o Senado Federal até o ano passado. Hoje todo-poderoso na CBF, José Maria Marin foi deputado da Arena e amigo do torturador Sérgio Fleury.Foi também o homem que pediu uma "providência" para que "a paz voltasse a reinar no jornalismo da TV Cultura", um dos poucos lugares onde ainda sobreviviam críticas - ainda que moderadas - ao regime militar. A "providência" dos militares foi o assassinato sob tortura do então diretor de jornalismo do canal, Vladimir Herzog, nas dependências do DOI-Codi em São Paulo. A lista dos esqueletos no armário federal não caberia nesta reportagem.

Por essas e outras, a data deve ser lembrada. Por todo o Brasil, as manifestações sucedem com as faces mais diversas: dos perfis em redes sociais que foram substituídos pelas fotos de vítimas do regime aos atos de "Ditadura Nunca Mais", que aconteceram nas principais cidades do país. Em Paris, militantes de partidos de esquerda como PT e PSOL se reuniram a alguns estudantes na Place de La Reine Astrid, perto da embaixada brasileira, para entregar uma carta ao embaixador e pedir punição aos torturadores de ontem e hoje.

Comissões da verdade

Para a historiadora Francine Iegelski, uma das organizadoras da manifestação, encarar o passado é o único meio de prepararmos o caminho para o futuro. Uma opinião compartilhada pelo pesquisador e cineasta Nicolau Bruno, que representou o coletivo Merlino no ato em Paris. Nas mãos da ditadura, o então companheiro da mãe de Nicolau, o jornalista Luiz Eduardo da Rocha Merlino foi torturado, assassinado e teve seu cadáver destruído por um caminhão.

Na manifestação, ele pediu mais atenção das comissões nacionais da verdade com as vítimas pouco conhecidas da ditadura, exigiu que os torturadores sejam interrogados e criticou a lei de anistia, que não permite que se processe criminalmente os assassinos de Merlino: Carlos Brilhante Ustra (Capitão Tibiriçá), Dirceu Gravina (Jesus Cristo) e Carlos Alberto Augusto (Carlos Metralha).

Reforma contra restos da Ditadura

Torturadores conhecidos como esses permanecem impunes no Brasil. E servem de modelo para uma polícia que, até hoje, não tem uma cultura interna de democracia. O Brasil convive com a contraditória e aberrativa polícia militar que, pela própria acepção do termo, não se encarrega de "proteger e servir" a população, mas de eliminar um inimigo. Foi para isso que ela foi treinada na Ditadura e é essa a cultura que ela guardará até que ela seja desmilitarizada.

Mas uma proposta como essa só pode ser posta em prática no Brasil com uma ampla reforma política, que elimine do poder esse espólio tardio da ditadura que povoa nossos poderes legislativo e executivo. Por isso, uma das principais demandas da manifestação era o estabelecimento de um plebiscito pela Constituinte Exclusiva e Soberana do Sistema Político. Em outras palavras: levar a reforma política à consulta pública, como explicou Carla Sanfelici, militante do PT em Paris. Para ouvi-la, clique no link acima.
 

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