Distúrbios se espalham pela França após morte de jovem por policial perto de Paris
Os distúrbios em ruas da França continuaram pela segunda noite consecutiva e se estendendo pela madrugada desta quinta-feira (29). A morte de Nahel, 17 anos, durante uma abordagem policial há dois dias comoveu o país e foi condenada por autoridades, políticos e celebridades. Também gerou distúrbios em Nanterre, local da morte na periferia de Paris, apesar da mobilização anunciada de 2.000 policiais do batalhão de choque.
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Mais de uma dezena de veículos e mobiliário urbano foram queimados em Nanterre, a oeste da capital francesa, onde também foram erguidas barricadas. Para evitar incidentes como a invasão e saque de uma escola na noite de quarta-feira (28), autoridades locais se organizaram para fazer vigílias em prédios públicos e alertar a polícia se fosse preciso, constatou a reportagem da RFI.
Violências e degradações também foram registradas em outros municípios da periferia da capital, onde ônibus, carros, viaturas de polícias e lixeiras foram incendiados, bem como os prédios de duas prefeituras, cinco escolas e quatro delegacias.
No resto do país, outras grandes cidades francesas também foram palco de violências e vandalismo, como Lyon, no centro-leste, Lille, no norte, Toulouse, no sudeste, e Nice, no sul.
Segundo o Ministério do Interior, 150 suspeitos foram abordados e 150 policiais ficaram feridos.
A mãe de Nahel convocou uma passeata silenciosa para esta tarde em Nanterre.
Já o policial que disparou contra o adolescente passou uma segunda noite detido para interrogatório e ratificou sua versão de legítima defesa. Ele será investigado por homicídio doloso.
Nesta quinta-feira, o procurador da República de Nanterre, Pascal Prache, indicou que o policial seguirá em detenção preventiva e que até o momento o Ministério Público considera que não havia necessidade para o uso de arma no momento da abordagem de Nahel.
O Ministério do Interior informou que 40 mil policiais serão mobilizados em toda a França para a próxima noite, cinco mil apenas em Paris.
Morte do adolescente
A morte do jovem Nahel ocorreu na manhã de terça-feira (27). Inicialmente, fontes da polícia disseram que o guarda atirou quando o motorista do veículo tentou atropelar dois policiais em Nanterre. No entanto, um vídeo publicado nas redes sociais, cuja autenticidade foi comprovada pela AFP, mostra o momento em que o agente aponta uma arma para o motorista e atira à queima-roupa quando ele acelera o veículo.
Na gravação, é possível ouvir a frase: "Você vai levar um tiro na cabeça", mas não fica claro quem a pronuncia.
A fuga do jovem terminou metros à frente, quando o carro bateu contra um poste. A vítima morreu pouco depois de ser atingida no tórax.
O agente de 38 anos, suspeito de ser o autor do disparo, está sob custódia da polícia como parte da investigação de homicídio doloso por parte de um funcionário público, anunciou o Ministério Público.
Reações
"Nada justifica a morte de um jovem", disse o presidente francês, Emmanuel Macron.
O porta-voz do governo francês, Olivier Véran, pediu "calma" em um contexto de "emoção muito forte".
"As imagens sugerem que as regras de uma ação legal não foram respeitadas", declarou a primeira-ministra Elisabeth Borne.
"A pena de morte não existe mais na França. Nenhum policial tem o direito de matar, exceto em caso de legítima defesa", tuitou o político de esquerda Jean-Luc Mélenchon.
"Estou sofrendo pela minha França. Uma situação inaceitável", tuitou o atacante Kylian Mbappé, do Paris Saint-Germain (PSG), que em 2020 também reagiu ao espancamento de policiais a um produtor musical negro, Michel Zecler, em Paris.
Essas declarações foram criticadas por um dos principais sindicatos policiais, Alliance, e por dirigentes da extrema direita.
Alliance considerou "inconcebível que o presidente da República, assim como alguns dirigentes políticos, artistas e outros desconsiderem a separação de poderes e a independência da Justiça condenando nossos colegas antes do resultado das investigações".
A ex-candidata presidencial Marine Le Pen, líder do Reunião Nacional (RN, extrema direita), denunciou uma reação "irresponsável" por parte de Macron.
Passeata em homenagem
A primeira noite de distúrbios na região de Paris, concentrados principalmente em Nanterre, terminou com mais de 40 carros incendiados, 31 pessoas detidas e 24 policiais levemente feridos.
"Nossa cidade acordou em choque, abalada, marcada e preocupada com esta onda de violência", disse o prefeito de Nanterre, Patrick Jarry, que também pediu calma e "justiça para Nahel".
A mãe do adolescente convocou, em uma mensagem na rede social TikTok, uma passeata em homenagem ao filho, na tarde de quinta-feira, perto do local da morte. "Será uma manifestação de revolta pela morte do meu filho".
Porém, a tragédia mais recente provoca uma onda de indignação. A França registrou 13 mortes em 2022 durante incidentes similares. Antes da morte de Nahel, em meados de junho, um guineense foi morto a tiros por um policial perto de Angoulême (centro).
Em maio, vários países expressaram às Nações Unidas sua preocupação com a violência policial e a discriminação racial na França, durante uma avaliação periódica à qual se submetem a cada quatro anos os países da ONU.
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