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Quase dois livros são publicados por dia sobre Napoleão desde sua morte há 200 anos

A França comemorou em 2021 os 200 anos da morte de Napoleão Bonaparte. O ano foi rico em publicações de livros, artigos de jornais, reportagens, documentários e exposições sobre o "Imperador dos franceses". Chegou a hora de fazer um balanço desta vasta produção.

Seleção de livros lançados em 2021, ano do bicentenário de morte de Napoleão Bonaparte.
Seleção de livros lançados em 2021, ano do bicentenário de morte de Napoleão Bonaparte. © Patrice Martin, 2021.
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Por Florian Riva e Patrice Martin

Dezembro marca o fim das comemorações do "Ano Napoleão”. Durante todo o ano, a RFI revelou, em uma série de reportagens e podcasts especiais, aspectos desconhecidos da ação e do legado de Napoleão Bonaparte na França, mas também em vários países do mundo, como o Brasil, Rússia, Espanha, Portugal e Romênia.

Mas 2021 também foi ritmado pela publicação de uma centena de livros dedicados ao "Imperador dos franceses" que morreu em 5 de maio de 1821, na Ilha de Santa Helena, onde era detido pelos ingleses.

"Vivo, ele não conquistou o mundo; morto, ele o domina”: François-René de Chateaubriand

Uma frase de Jean Tulard, que entrou para a história, afirma que desde a morte de Napoleão, em 1821, mais de um livro por dia é escrito e publicado no mundo sobre ele. Mas essa máxima pode estar muito aquém da realidade. Segundo Chantal Prévot, bibliotecária da Fundação Napoleão que realizou um novo levantamento baseado no banco de dados das maiores bibliotecas do mundo, entre 1,8 a 2 livros são publicados por dia desde a morte de Bonaparte. Se forem adicionados os formatos audiovisuais, o número é superior a 3 publicações por dia.

Ao todo, isso representa cerca de 220 mil obras, contando apenas as publicações que têm “Napoleão” ou “Bonaparte” no título. Se cada livro tivesse uma média de 200 páginas, um leitor assíduo, ao ritmo de duas páginas por minuto, levaria um século para ler tudo!

Desde sua morte, Napoleão fascina o mundo da literatura e da edição, seja para escrever sua "lenda negra" ou para transformá-lo em mito. Há algumas décadas, ele passou a ser tema de estudos historiográficos sérios.

Ao contrário do que poderia se esperar, o bicentenário de sua morte não provocou uma explosão editorial. Os livros publicados este ano seriam de qualquer forma lançados, independentemente da efeméride. O número de títulos e estudos sobre Napoleão é regular e estável.

No entanto, houve em 2021 uma expansão das tiragens que foram muito mais significativas do que em anos anteriores, incentivadas pelo sucesso de vendas de alguns títulos. Quase 20 mil exemplares de “Pour Napoléon” (Para Napoleão, editora Perrin) de Thierry Lentz, já foram vendidos, o que representa um recorde para este tipo de publicação.

Outro sucesso nas livrarias este ano foi “Napoléon à Saint-Hélène” (Napoleão em Santa Helena, editora Perrin), de Pierre Branda. Isso ocorreu graças à visibilidade midiática e às polêmicas suscitadas pelas comemorações da morte do "Imperador dos Franceses" que foram rapidamente superadas. Um fato marcante neste ano foi a não publicação de uma obra de peso anti-Napoleão.

Outro aspecto deste bicentenário foi a profusão de obras a partir de exposições e publicação dos catálogos respectivos. A primeira delas, “Napoléon n’est plus” (Napoleão morreu) no Musée de l’Armée (Museu do exército) de Paris, foi visitada por quase 45 mil pessoas apesar do impacto da crise sanitária. Em seguida, vieram a monumental “Napoléon” (Napoleão) na Grande Halle de la Villette, também em Paris, que fica em cartaz até 24 de dezembro; “Un Palais pour l’Empereur” (Um Palácio para o Imperador) no Castelo de Fontainebleau, que tem, aliás, uma das mais bonitas bibliotecas de Bonaparte, restaurada para a data, ou ainda a exposição “Napoléon et la littérature” (Napoleão e a literatura) no museu Masséna de Nice, que explora as razões da presença do Imperador na criação literária.

“Sempre ele, por todos os lados! Sua imagem me abala constantemente”: Victor Hugo

Na imprensa, terreno que Napoleão temia mais do que 100 mil baionetas, a visibilidade foi ainda maior e, em alguns aspectos, mais inesperada. Napoleão desconfiava tanto da mídia que colocava os jornais sob vigilância policial. A desconfiança da imprensa em relação a ele não era diferente e os jornalistas tentavam controlar o personagem pela moral ou pela história.

Batida policial nos ateliês de liberdade da imprensa.
Batida policial nos ateliês de liberdade da imprensa. © Grandville. 1833

A explosão de matérias sobre o Imperador no momento do bicentenário de morte mostra que a mídia continua a se interessar por ele. Mas isso quer dizer que as relações entre Bonaparte e a imprensa se apaziguaram? Uma pista de reflexão é o fato de muitas polêmicas, principalmente sobre a responsabilidade dele em relação à condição humana, seja de escravos, mulheres, soldados ou civis, terem provocado longos debates na França.

Vale ressaltar que inúmeros jornais rivalizaram em criatividade para ilustrar a data simbólica e explicar a necessidade - histórica, artística, literária, jurídica e política - desta comemoração.

Entre as revistas semanais, a Le Point foi a primeira a publicar, em dezembro de 2020, um número especial sobre o bicentenário, seguida, por exemplo, do Le Figaro, Le Monde, e Paris Match. Cada edição utilizou um adjetivo elogioso ou crítico para sublinhar, uma vez mais, a relação ambígua que o Imperador mantinha com a imprensa.

Isso também explica por que os veículos satíricos e de opinião não ficaram de fora da cobertura. O melhor exemplo foi uma capa do Charlie Hebdo, que preencheu a primeira página com um desenho de um Napoleão gigante apontando canhões contra prédios de moradia popular e a manchete: “Mais um militar da reserva que vem nos encher o saco!”, em referência a um manifesto de militares que agitava a França no mesmo período.

A imprensa diária regional publicou com frequência, em diversas regiões do país, os eventos, grandes ou pequenas, em torno do Imperador dos Franceses. Finalmente, e logicamente, a imprensa especializada em História, publicou grande número de artigos destinados ao grande público para marcar a data.

Os leitores, tanto dos livros quanto da imprensa, marcaram presença, embora sua prática de consumo tenha revelado uma mutação. Eles seriam menos numerosos do que no passado, mas adquirem mais títulos e são atraídos por obras que propõem formatos menos clássicos: dicionários, romances gráficos, história em quadrinhos, assim como livros e artigos mais curtos.

“O que ele não conseguiu com a espada, farei com a pena”: Honoré de Balzac

A multiplicação de livros, exposições, edições especiais e matérias na imprensa, que se acumulam desde a morte de Napoleão, é como uma homenagem póstuma ao Imperador, que foi um leitor compulsivo, mas também um censor enérgico.

Ele devorava qualquer tipo de livro: de história, geografia, filosofia, poesia, teatro e, até, de entretenimento. A única exceção eram as obras religiosas, fazendo jus à imagem do homem herdeiro do espírito da Revolução francesa e filho da filosofia das “Luzes”.

Biblioteca da Galeria Diana, Castelo de Fontainebleau, na França.
Biblioteca da Galeria Diana, Castelo de Fontainebleau, na França. © Florian Riva, 2014

Napoleão tinha um acervo impressionante de 70.000 livros, distribuídos em várias bibliotecas que ele mesmo organizava, da aquisição à catalogação. Napoleão lamentava muito que sua última biblioteca, em Santa Helena, tivesse apenas 5.000 obras! Prisioneiro e isolado, a paixão pelos livros ganhou uma dimensão ainda maior e a leitura passou a ser o seu passatempo favorito, até sua morte em 5 de maio de 1821.

A RFI se despede deste ano Napoleão e se prepara para as comemorações dos 400 anos de um outro francês famoso no mundo inteiro: Jean-Baptiste Poquelin, conhecido como Molière.

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