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Terceira colocada nas eleições, Patricia Bullrich anuncia apoio a Milei e provoca terremoto na política argentina

A política Argentina acaba de ser sacudida por uma bomba: a candidata da direita moderada, Patricia Bullrich, com apoio do ex-presidente argentino, Mauricio Macri, defendeu o voto na extrema direita de Javier Milei, citando um decálogo de condições e perdoando graves ofensas do ultraliberal populista. A decisão implica uma virtual ruptura na principal coalizão opositora, em que muitos defendem uma “neutralidade” entre Sergio Massa e Javier Milei.

A candidata da direita moderada, Patricia Bullrich, declarou apoio ao candidato de extrema direita, Javier Milei, no segundo turno das eleições argentinas, causando um verdadeiro terremoto no cenário político local, em 25 de outubro de 2023.
A candidata da direita moderada, Patricia Bullrich, declarou apoio ao candidato de extrema direita, Javier Milei, no segundo turno das eleições argentinas, causando um verdadeiro terremoto no cenário político local, em 25 de outubro de 2023. © RFI/Márcio Resende
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Márcio Resende, correspondente da RFI em Buenos Aires

Interpretando que os 23,8% dos argentinos que votaram nela preferem uma mudança, a candidata de centro-direita Patricia Bullrich anunciou seu apoio ao ultraliberal de extrema-direita Javier Milei, que disputará, contra o peronista de centro-esquerda Sergio Massa, o segundo turno das eleições na Argentina, em 19 de novembro.

“A urgência nos desafia a não sermos neutros. A neutralidade é funcional ao ‘kirchnerismo’. Ratificamos os valores da mudança e da liberdade”, justificou Patricia Bullrich, durante entrevista coletiva, ao lado do seu candidato a vice, Luis Petri.

A candidata explicou que os 6,2 milhões de argentinos que votaram em sua chapa preferem uma mudança e que essa mudança, num segundo turno, é Javier Milei, porque “Sergio Massa significa a continuidade do kirchnerismo e a garantia de impunidade para Cristina Kirchner”, aliada de Massa.

“A pátria está em perigo. Há 20 anos, mergulhamos na decadência”, alertou Bullrich.

Bullrich, o pato, Milei, o leão: o desenho estampado em todas as mídias argentinas

Como condição para seu apoio, Patricia Bullrich leu um decálogo de posições, aparentemente negociadas com Javier Milei, indicando que o extremista promete respeitar determinados parâmetros democráticos e republicanos.

“A Argentina precisa de uma mudança de raiz que garanta um capitalismo e que termine com a emissão monetária para atacar a inflação”, citou Bullrich como primeira medida de uma lista que inclui ainda a continuidade da “educação pública gratuita e de qualidade”, o “combate ao tráfico de drogas”, o fim dos impostos às exportações, a vigência da atual legislação em matéria de armas e de doação de órgãos, o respeito pelo plano de vida de cada pessoa e a defesa da diversidade, o respeito irrestrito pela liberdade de expressão e pela liberdade de imprensa, a integração comercial com o mundo, o desenvolvimento sustentável e o respeito pela Constituição nacional.

“Guerrilheira joga-bombas e assassina”

Os pontos podem parecer óbvios, mas limitam qualquer aventura de Javier Milei, que, em declarações passadas, punha em questão alguns pontos que assustam a população e colocam um teto à sua capacidade eleitoral.

Questionada sobre o apoio ao libertário sem um consenso interno de sua coalizão, Patricia Bullrich disse falar em nome da chapa e que os demais partidos têm liberdade de ação.

“Espero que isso não signifique uma ruptura no diálogo interno”, pediu.

Quando a pátria está em perigo, tudo está permitido, exceto não defendê-la

A candidata derrotada, mas representante de uma parcela importante de eleitores, disse ter perdoado as ofensas de Javier Milei, que, durante a campanha, acusou-a de “guerrilheira joga-bombas e assassina”, devido à participação de Patricia Bullkrich de uma organização subversiva no começo dos anos 1970. O perdão veio numa reunião secreta na noite de terça-feira (24) entre Javier Milei, Patricia Bullrich e Mauricio Macri.

“Tivemos uma conversa e nos perdoamos mutuamente. Tenho diferenças com Milei. Não ocultamos. A maioria dos argentinos elegeu uma mudança. Nós representamos parte dessa mudança. Não podemos ser neutros. Estamos diante de uma mudança ou de uma máfia”, justificou Bullrich, citando uma frase do general San Martín, libertador da Argentina:

“Quando a pátria está em perigo, tudo está permitido, exceto não defendê-la”, insistiu.

Bullrich ainda garantiu que o apoio não implica uma participação num eventual governo Milei.“Não falamos de governo, não estamos num pacto, não há um diálogo de (aliança de) governo. É uma decisão política estratégica”, diferenciou.

No entanto, diversos analistas veem nessa decisão o embrião de um acordo de programa político entre Javier Milei e as forças de centro-direita, no caso de vitória, ou de uma nova coalizão opositora no Congresso, no caso de derrota. Quanto ao tiro no pé que o apoio pode representar na principal coalizão opositora, Patricia Bullrich deu uma visão contrária.

“Se o ‘kirchnerismo’ ganhar, vamos a uma dissolução total. Nossa decisão é unilateral e por princípios. Não queremos que a Argentina continue pela via da corrupção e da criminalidade”, argumentou, ciente de que as duas outras forças da coligação preferem uma “neutralidade” entre Javier Milei e Sergio Massa.

Histórico

No domingo passado (22), o peronista de centro-esquerda Sergio Massa venceu o primeiro turno com 36,7% dos votos, enquanto a extrema direita de Javier Milei obteve 30%. O vencedor em 19 de novembro deve ser quem for capaz de seduzir os eleitores da candidata de centro-direita, Patricia Bullrich, que terminou com 23,8% dos votos.

O analista político Alejandro Catterberg, diretor da consultora Poliarquia, interpretou o anúncio de Patricia Bullrich como “a implosão” da oposição por não ter consultado as demais forças políticas e setores de seu próprio partido, contrários a Javier Milei. No passado recente, diversos integrantes da coligação avisaram que “Milei era o limite”.

“O que estamos assistindo ao vivo é a implosão da coalizão opositora sem coordenação interna, sem diálogo direto. Os eleitores dessa coalizão estão vivendo um trauma depois de uma dolorosa derrota eleitoral e tendo à frente duas opções que não consideram aptas por óbvias razões. A decisão de Patricia Bullrich prejudica a construção de um espaço comum”, interpreta Catterberg.

De acordo com suas medições anteriores ao domingo do primeiro turno, 40% dos eleitores de Patricia Bullrich diziam preferir Javier Milei, caso Bullrich não entrasse no segundo turno. Uma menor parte, 20%, preferia Sergio Massa, mas outros 40% estavam em dúvida.

A primeira pesquisa pós-primeiro turno, divulgada nesta quarta-feira (25), antes do anúncio de Patricia Bullrich, indica uma paridade entre Javier Milei e Sergio Massa.

Para a consultoria CB Opinião Pública, uma das quatro que acertaram as previsões, Javier Milei tem 41,6% de intenções de voto, enquanto Sergio Massa soma 40,4%. Sem os votos brancos e nulos, a projeção fica em 50,7% para Javier Milei e 49,3% para Sergio Massa.

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