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Argentina aumenta imposto para deter cotação do dólar que passa de 1.000 pesos

Com uma emissão monetária descontrolada por parte do candidato e ministro da Economia, Sergio Massa, e com declarações a favor da dolarização da economia por parte do ultraliberal e candidato a presidente líder nas pesquisas de intenção de voto, Javier Milei, a cotação da moeda norte-americana passa de 1.000 pesos argentinos (cerca de R$14) a 12 dias das eleições. 

Governo argentino aumenta imposto para venda de dólares para evitar aumento do preço da moeda americana, nesta terça-feira, 10 de outubro de 2023.
Governo argentino aumenta imposto para venda de dólares para evitar aumento do preço da moeda americana, nesta terça-feira, 10 de outubro de 2023. REUTERS/Murad Sezer
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Márcio Resende, correspondente da RFI em Buenos Aires

Nas últimas 24 horas, o país entrou numa nova corrida cambial contra o peso, motivado por declarações de Milei, quem lidera a disputa eleitoral, além de inconsistências fiscais do governo. Para minimizar o impacto e desestimular a procura por dólares, o governo aumentou o preço da moeda americana, via aumento de impostos. O dólar passou de históricos mil pesos, aumentando o fôlego inflacionário.

Através de uma resolução da Administração Federal de Receita Pública (a Receita Federal argentina), o governo introduziu novas medidas que dificultam e que encarecem o acesso ao dólar através do uso de cartões de débito e de crédito, passando de 5% a 25% um dos impostos.

Antes da nova medida, os argentinos pagavam dois impostos ou taxas sobre o valor do dólar se gastassem até U$ 300 no cartão, uma das únicas formas legais de gastar em moeda estrangeira. Esses impostos somavam 75% sobre o valor da cotação oficial. Para quem gastasse mais de U$ 300, eram três os impostos ou taxas que somavam 80% a mais sobre a cotação do dólar oficial, ao qual ninguém tem acesso na prática.

A partir de agora, todas as formas de acesso ao dólar se unificam em três impostos (o de 25% e outros dois de 30% e 45%) que somam 100%, duplicando o valor da cotação oficial. A modificação implica um aumento de 11% para ter acesso a gastos em moeda estrangeira.

Como exemplo, até segunda-feira (9), com todos os impostos incluídos, o dólar custava 639,63 pesos (para gastos até U$ 300 mensais) e 657,90 pesos (para gastos superiores a U$ 300). A partir desta terça-feira (10), pela atual cotação, o dólar passa a valer 731 pesos.

O aumento visava aproximar o valor do dólar legal ao dólar paralelo. No entanto, o país entrou numa nova corrida cambial que elevou o valor do dólar paralelo em 7,5% na segunda-feira (945 pesos) e mais 10% nesta terça-feira, fazendo a moeda norte-americana chegar a 1.040 pesos, ultrapassando a barreira psicológica dos mil pesos por dólar.

Enquanto as modificações sobre acesso a moedas estrangeiras duplicam o valor do dólar oficial, no mercado paralelo esse valor é triplicado. E como o dólar paralelo é a referência dos argentinos, os preços da economia seguem essa lógica, alimentando a inflação que em agosto alcançou 12,4% mensais, valor que deve se repetir no índice de setembro.

 

Influência da corrida eleitoral

O candidato a presidente e ministro da Economia, Sergio Massa, tem anunciado medidas para incentivar o consumo e para diminuir os efeitos da inflação. A injeção de dinheiro, equivalente a cerca de 1,8% do Produto Interno Bruto, tem impacto direto no índice inflacionário num país sem reservas no Banco Central e sem acesso ao crédito internacional.

Por outro lado, Javier Milei promete aplicar a dolarização total da economia, em detrimento do peso argentino. As recomendações do candidato ultraliberal têm incentivado os argentinos a se livrarem dos pesos e a não renovarem investimentos financeiros em moeda argentina.

“Os correntistas e os agentes econômicos estão antecipando a dolarização proposta por Javier Milei à medida que o candidato aumenta as suas chances de ser eleito. As pessoas dolarizam os seus investimentos antes que isso se torne uma política pública”, explica à RFI Gustavo Marangoni, diretor da consultora M & R.

Nas últimas 24 horas, em declarações à imprensa e nas redes sociais, Javier Milei definiu a moeda argentina como “excremento” e avisou que “manter investimentos em peso é, no mínimo, temerário”. Na semana passada, o candidato tinha dito que “quanto mais alto o preço do dólar estiver, mais fácil é dolarizar a economia”.

“Jamais em pesos, jamais em pesos”, foi a resposta de Javier Milei quando perguntado o que as pessoas deveriam fazer na data de aniversário das suas poupanças e fundos de investimento.

“O peso é a moeda que o político argentino emite. Portanto, não pode valer nem excremento. Esse lixo não pode valer nem para adubo”, disparou. “Com esta taxa de inflação, ficar com pesos, temerário é uma palavra conservadora”, acrescentou.

 

Troca de acusações

Sergio Massa, culpou Milei pela corrida ao dólar na qual o país entrou nas últimas horas. “São um bando de irresponsáveis que não pensam na Argentina”, acusou Massa. “Agitar os correntistas para que retirem os seus depósitos de maneira irresponsável. Por um voto, são capazes de atear fogo à casa”, continuou.

“Eu nunca diria como Milei que ‘retirem o dinheiro do banco’ porque você gera uma corrida, gera uma hiperinflação. Um candidato a presidente não pode brincar com o dinheiro de 46 milhões de argentinos. Isso é inadmissível”, criticou a candidata Patricia Bullrich.

Sobre Massa, a candidata de centro-direita acusou de “gastar dinheiro público para ganhar um voto”.

“Vergonhoso espetáculo dão os políticos inventando responsabilidades. Se quiserem encontrar os responsáveis, olhem-se no espelho, sem-vergonhas. Essas são as consequências de defender a emissão monetária e de votar orçamentos com déficit fiscal”, defendeu-se Javier Milei.

O risco, advertem os economistas, é que a corrida cambial se torne uma corrida bancária, levando as pessoas a retirarem os seus depósitos do sistema, como aconteceu em dezembro de 2001 numa crise com traços parecidos com a atual.

“O sistema financeiro se sustenta em função da credibilidade. Se quem for eleito diz que não vai pagar, o sistema não se sustenta. Milei pensa que quanto pior, melhor”, avalia a economista Marina Dal Poggetto, diretora da consultora EcoGo.

O Banco Central, o mesmo que Milei promete fechar, emitiu uma nota para tentar acalmar o mercado ao garantir que “o sistema financeiro está líquido e solvente”.

“O sistema financeiro argentino apresenta uma sólida situação de solvência, de capitalização e de liquidez. A poupança dos argentinos depositada no sistema financeiro está protegida por um seguro de depósito e pelo Banco Central que age como credor de última instância”, reforçou a entidade que regula o sistema.

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