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Candidato governista à Presidência da Argentina recebe ajuda financeira do Brasil e apoio de Lula

O ministro da Economia da Argentina e candidato governista à Presidência, Sergio Massa, será recebido nesta segunda-feira (28) em Brasília pelo próprio presidente Lula, que vai anunciar o financiamento às exportações brasileiras à Argentina, com garantia em yuans chineses. O crédito é crucial para a indústria argentina não parar na reta final da campanha eleitoral. A presença do argentino ao lado de Lula visa diferenciar Massa de Javier Milei, o candidato da extrema direita argentina, aliado de Jair Bolsonaro.

Sergio Massa, ministro argentino da Economia, em Buenos Aires, em 13 de agosto de 2023
Sergio Massa, ministro argentino da Economia, em Buenos Aires, em 13 de agosto de 2023 © MARIANA NEDELCU / REUTERS
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Márcio Resende, correspondente da RFI em Buenos Aires

O ministro da Economia e candidato do Peronismo à Presidência, Sergio Massa, viajou na noite deste domingo a Brasília. Nesta segunda-feira, ele vai procurar capitalizar para a sua campanha eleitoral as ajudas do governo Lula.

O objetivo é que a Argentina se torne membro do Brics e, desta forma, o BNDES financie a construção do gasoduto argentino que levará gás ao Brasil . Outra meta é que o governo ofereça uma linha de crédito às exportações brasileiras à Argentina, cruciais para a economia vizinha não parar, apesar da escassez de dólares no Banco Central argentino.

“Sergio Massa precisa que a economia não colapse nesta reta final porque a sua candidatura depende da sua gestão. O candidato Massa depende do ministro Massa. A ajuda de Lula permite esse objetivo e também na prática, exibir ares de presidente com projeção internacional”, disse à RFI o analista político Sergio Berensztein.

Numa reunião com o chanceler brasileiro, Mauro Vieira, Sergio Massa vai agradecer pela gestão do Brasil para que a Argentina se torne membro do bloco formado por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul (Brics).

O avanço do financiamento ao gasoduto e a nova linha de crédito do Banco do Brasil aos exportadores brasileiros serão tratados com o ministro da Fazenda, Fernando Haddad. Os três assuntos serão anunciados pelo presidente Lula ao lado de Sergio Massa após reunião às 17h30 no Palácio do Planalto.

Para a reunião com o presidente Lula, a delegação argentina deveria ser liderada pelo presidente argentino, Alberto Fernández, atualmente um ex-presidente em exercício com poderes transferidos a Sergio Massa, protagonista do governo.

Espelho político brasileiro na Argentina

A foto com Lula é a que Massa procura em plena campanha eleitoral durante a qual, até as eleições de 22 de outubro, o ministro-candidato pretende polarizar com o candidato ultra liberal, Javier Milei, aliado de Bolsonaro.

“Lula pode ser um líder que gere consenso e simpatia no eleitorado governista, mas no restante do eleitorado não tem impacto e até pode ser um tiro pela culatra. Este Lula III, para os olhos do Ocidente, é diferente daquele que muitos esperavam. Tem questionado o papel dos Estados Unidos na guerra na Ucrânia e tem-se aproximado da China”, aponta Berensztein.

Ao contrário de Lula e em sintonia com a campanha de Bolsonaro em 2018, o libertário Milei já avisou que a sua política externa consistirá “num alinhamento total com os Estados Unidos e com Israel”, a ponto, inclusive, de transferir a Embaixada argentina em Tel Aviv a Jerusalém.

Milei também rejeita a entrada da Argentina no Brics porque “não faz acordos com comunistas”, incluindo nessa lista o próprio presidente Lula, motivo pelo qual também pretende romper com o Mercosul.

Massa pretende traçar esse paralelismo, ficando do lado de Lula, numa advertência implícita ao eleitorado argentino sobre como termina esse discurso disruptivo extremista.

“Se rompermos com o Mercosul e com a China, a primeira coisa que devemos saber é que vamos romper com os nossos dois mercados mais importantes”, advertiu Sergio Massa, na quinta-feira (24) diante de 150 empresários, reunidos pelo Conselho das Américas em Buenos Aires.

A candidata da centro-direita, Patricia Bullrich, tem no Brasil o seu principal aliado, mas também rejeita a entrada da Argentina no BRICS por ter o bloco uma maioria de países sob regime autoritário, por ter a invasora Rússia sob comando de Vladimir Putin e, principalmente, pela entrada do Irã, acusado pelo Supremo Tribunal argentina de ser o autor intelectual de dois atentados terroristas em Buenos Aires, em 1992 e 1994.

Crédito brasileiro com garantia em moeda chinesa

O ponto mais urgente da viagem é a possibilidade de o Brasil continuar a exportar à Argentina sem que o Banco Central argentino, com reservas negativas, precise desembolsar dólares. Vários setores da economia argentina começam a parar por falta de componentes importados, necessários para o produto final na Argentina. É o caso da indústria automotiva argentina, dependente das autopeças brasileiras para a terminação de automóveis.

“Sergio Massa quer aliviar o efeito da falta de dólares na atividade econômica argentina porque há muitos setores, sobretudo o automotivo, que têm limitado as suas importações, freando fortemente a economia”, indica Berensztein.

O governo brasileiro vai abrir uma linha de crédito de até 700 milhões de reais através do Programa de Financiamento às Exportações (Proex) aos exportadores brasileiros que venderem à Argentina. O crédito terá como garantia os yuans de uma linha de crédito “swap” entre Argentina e China, disponíveis no Banco Central argentino. O crédito é um financiamento da China para que a Argentina compre os produtos chineses.

Os recursos serão convertidos de yuans a reais através do Banco do Brasil, que manterá a custódia do montante das operações e executará a garantia em caso de inadimplência por parte do importador argentino.

Atualmente, os importadores argentinos mantêm uma dívida superior a US$ 20 bilhões com exportadores estrangeiros sem que o Banco Central argentino libere esse dinheiro por absoluta falta de dólares. Cerca de 210 empresas exportadoras brasileiras têm tido atrasos superiores a 180 dias para receber os pagamentos.

Para o presidente Lula, a criatividade financeira desse crédito está em sintonia com o seu objetivo de substituir o dólar das transações comerciais entre terceiros países, optando por moedas locais. Para a China, é mais um passo para a internacionalização da sua moeda.

“É um procedimento para aliviar ainda mais o uso de reservas num momento no qual temos de cuidá-las”, indicou Sergio Massa, dias atrás quando o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, antecipou a proposta brasileira.

Interesse do Brasil pelo mercado argentino

Na quarta-feira passada (23), numa entrevista coletiva em Johanesburgo, à margem da reunião do Brics, Haddad revelou ter proposto uma linha de crédito à Argentina com garantia em yuans chineses.

Embora a Argentina seja o terceiro maior comprador da produção brasileira, atrás de China e Estados Unidos, o mercado argentino é o principal para as exportações brasileiras industrializadas, aquelas que mais empregos geram no Brasil.

Nos últimos tempos, justamente por não contar com um instrumento como a China, o Brasil perdeu parte do mercado argentino para os produtos chineses. A escassez de dólares no Banco Central argentino tem sido uma barreira para produtos importados na Argentina, com exceção dos chineses, financiados por esse crédito da China à Argentina.

No dia 2 de maio, o presidente Alberto Fernández viajou com Sergio Massa a Brasília com o objetivo de conseguir uma linha de crédito do BNDES, mas, diante da falta de uma garantia, o presidente argentino voltou com as mãos vazias.

No dia 4 de julho, durante a reunião de Cúpula do Mercosul, em Puerto Iguazú, Lula e Massa acertaram ter uma reunião em Brasília, quando fosse habilitado um mecanismo para financiar as exportações brasileiras à Argentina.

Gasoduto argentino ao Brasil

O ministro-candidato argentino também incluiu na agenda da reunião o financiamento do BNDES às exportações de bens e serviços brasileiros de um gasoduto entre a reserva patagônica de Vaca Muerta, a segunda maior jazida de gás de xisto e a quarta de petróleo não-convencional do mundo, até o Sul do Brasil. O gás argentino é suficiente para o Brasil substituir o da Bolívia cujas reservas têm caído anualmente.

O BNDES vai financiar os canos de aço para o gasoduto. Esses canos são produzidos no Brasil pela empresa argentina Techint.

O gasoduto também é uma forma de Sergio Massa capitalizar avanços concretos numa campanha que rema contra a corrente de uma economia em agonia, com uma inflação que em agosto deve superar os 12%, encerrando o ano acima de 150%.

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