Depois de Mali e Burkina Faso, Exército francês deixa o Níger e vê derrota diplomática no continente
As últimas tropas francesas destacadas no Níger deixaram o país na manhã desta sexta-feira (22), marcando o divórcio entre Paris e o regime militar que chegou ao poder em um golpe em Niamey, e pondo fim a mais de dez anos de esforços franceses anti-jihadistas no Sahel. Um a um, os parceiros internacionais estão se reaproximando das autoridades militares que tomaram o poder em um golpe no Níger, na esperança de preencher o vazio deixado pela França.
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Os Estados Unidos, que têm uma base aérea no norte do país, foram os primeiros a contemporizar sua posição e anunciaram na quarta-feira (20) que estavam prontos para retomar a cooperação com o Níger, desde que o regime militar se comprometesse com uma transição rápida.
Os países europeus, por sua vez, começaram a se distanciar da França, que fechou sua embaixada e continua a adotar uma postura firme, recusando-se a reconhecer a legitimidade das autoridades militares.
O Ministro da Defesa alemão, Boris Pistorius, que está visitando Niamey, disse que a Alemanha estava "interessada em assumir projetos" no Níger como parte da cooperação militar.
"Estamos tentando entender a abordagem francesa. A França está se afastando do Sahel, mas precisamos ser capazes de encontrar um terreno comum e uma abordagem europeia para a região, em vez de cada lado falar por si", disse um diplomata europeu.
De acordo com outro diplomata ocidental, a União Europeia se encontra em uma "posição insustentável", com os Estados-membros sem pressa para chegar a um acordo sobre uma resposta comum.
Saída dos franceses
"A data de hoje (...) marca o fim do processo de retirada das forças francesas no Sahel", disse um tenente do Exército do Níger, Salim Ibrahim, em uma cerimônia que marcou o fim da presença militar francesa no Níger.
No entanto, cerca de mil soldados franceses ainda estão no Chade, cuja capital, N'Djamena, abriga o centro de comando das operações francesas no Sahel.
A cerimônia foi realizada na base aérea de Niamey, que abriga uma base aérea planejada, onde estavam alguns dos cerca de 1.500 soldados e aviadores franceses no Níger. Os últimos soldados franceses decolaram em duas aeronaves, conforme observado por um jornalista da agência AFP. Seu destino não foi informado.
A cerimônia foi concluída com a "assinatura" de um "documento conjunto" pelo chefe do Estado-maior do Exército do Níger, coronel Mamane Sani Kiaou, e pelo comandante das forças francesas no Sahel, general Eric Ozanne, disse o tenente Salim Ibrahim.
O texto foi assinado "na presença do Togo e dos Estados Unidos", respectivamente "representados pelo chefe do Estado-Maior das Forças Armadas" e "pelo adido de defesa militar", acrescentou. A base aérea foi devolvida ao Níger.
O tenente Ibrahim disse que, durante o processo de retirada das tropas francesas, foram realizados "145 voos", "15 comboios terrestres" e "cerca de 1.500 soldados foram retirados". "Estamos satisfeitos com o bom andamento da retirada, pois "nenhum incidente grave foi registrado", disse ele.
Os franceses não deixaram "nenhum equipamento ou capacidade" no local, disse o Estado-maior francês.
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Sanções
Os Estados Unidos, a União Europeia e a França suspenderam a cooperação militar e o apoio orçamentário, enquanto a Comunidade Econômica dos Estados da África Ocidental (CEDEAO) impôs pesadas sanções econômicas ao país, enquanto se aguarda a restauração da ordem constitucional.
Quatro meses depois, o presidente Mohamed Bazoum ainda continua sequestrado no palácio presidencial. Os militares ainda não decidiram oficialmente sobre a duração da transição, mas a CEDEAO abriu caminho para aliviar as sanções, condicionando-as a uma "transição curta" antes que os civis retornem ao poder.
E o regime está gradualmente saindo do isolamento diplomático. Na quinta-feira, o presidente do Benin, Patrice Talon, disse que queria "restaurar rapidamente as relações" entre o Níger e o Benin.
Na segunda-feira, a Assembleia Geral da ONU deu luz verde ao pedido de credenciamento de um embaixador apresentado pelos generais em Niamey.
Desafio logístico
No Níger, a maior parte das tropas francesas foi posicionada na base aérea de Niamey, e as outras, ao lado das forças nigerinas, em dois postos avançados na área da tríplice fronteira entre Mali, Níger e Burkina Faso, considerada um refúgio para grupos ligados à Al-Qaeda e ao Estado Islâmico (EI).
A retirada das tropas francesas representou um desafio logístico e de segurança, pois envolveu, entre outras manobras, uma longa jornada de cerca de 1.700 km por estradas e trilhas, atravessando um país desértico e, às vezes, áreas pantanosas onde os grupos jihadistas estão presentes, antes de chegar a N'Djamena.
Outra parte da retirada foi feita por via aérea. Em janeiro, novas rotações estão planejadas com a ajuda do Qatar, entre N'Djamena e a França, de acordo com o Exército francês. O restante do frete será transportado de N'Djamena para o porto de Douala, em Camarões, até o próximo verão.
Após um impasse de dois meses com as novas autoridades de Niamey, que denunciaram vários acordos militares com Paris, o presidente francês Emmanuel Macron anunciou, em 24 de setembro, que as tropas francesas sairiam do Níger "até o final do ano".
O Níger era um dos últimos aliados de Paris em uma região assolada pela violência de grupos armados antes do golpe de Estado de 26 de julho.
Aproximação com Moscou
A França também decidiu fechar sua embaixada no Níger, onde "não é mais capaz de funcionar normalmente", disseram fontes diplomáticas na quinta-feira.
Desde o golpe de Estado no Níger, que derrubou o presidente eleito Mohamed Bazoum, que ainda está sequestrado em sua residência, os generais nigerinos no poder romperam os laços com vários parceiros ocidentais e se aproximaram da Rússia.
Os Estados Unidos e a Alemanha disseram que estão prontos para retomar as negociações com os nigerianos. Mali e Burkina Faso - de onde as forças francesas também se retiraram - se aproximaram de Moscou. Mali, Burkina e Níger formaram uma aliança para combater os jihadistas.
Após essa série de reveses no Sahel, a França está reorganizando sua presença na África e pretende reduzir significativamente sua força militar em todos os países onde ainda opera, exceto Djibuti.
(Com AFP)
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