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França/sociedade

Salão de beleza parisiense transforma mulheres em situação precária

Psicólogos, cabeleireiros, manicures e outros voluntários ajudam as clientes a recuperar a autoestima e fazer as pazes com o espelho e a vida.

Cabelereiras com a mão na massa no salão parisiense Joséphine Beauté
Cabelereiras com a mão na massa no salão parisiense Joséphine Beauté (Foto: Taíssa Stivanin/RFI)
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São 10h da manhã de uma terça-feira ensolarada em Paris e as primeiras clientes do salão de beleza Joséphine Beauté já estão na sala de espera. Inaugurado há cerca de sete anos no bairro popular de Barbès, o salão recebe, a preços módicos, mulheres das mais diferentes faixas etárias em situação precária: sem moradia, mães solteiras, sem trabalho ou família.

Algumas, como revela a psicóloga do salão, Anne Fois, chegam a um nível tão baixo de autoestima que simplesmente param de tomar banho. Não se enxergam mais como mulheres e passam reto na frente de um espelho, com vergonha de si mesmas. Aí é que entra o trabalho da terapeuta. “Nossa missão é torná-las mais bonitas por dentro e por fora”, diz.

Por isso, antes do corte de cabelo, das unhas feitas e da depilação, Anne, que é voluntária, assim como todos os outros profissionais da casa, tenta entender a história e as diferentes trajetórias das clientes. “Mesmo que o que eu faça não seja uma terapia de fato, nossas conversas as ajudam. Elas gostam de falar da vida delas, são muito dignas e nunca se queixam”, explica.

A psicóloga Anne Fois recebe as clientes em um espaço improvisado
A psicóloga Anne Fois recebe as clientes em um espaço improvisado (Foto: Taíssa Stivanin/RFI Brasil)

“Penteadas e bonitas”, viram outra pessoa

O perfil mais comum da cliente do Joséphine Beauté é o de uma mulher que cortou seus vínculos sociais por conta do excesso de precariedade, entre 40 e 60 anos. Mas também há aquelas que, depois de perder o emprego, mudam de categoria social e acabam caindo na pobreza. Uma situação mais comum do que parece na França, principalmente nas grandes cidades, onde o custo de vida é altíssimo.

“É uma queda livre”, descreve Anne. “Em alguns meses, elas têm a impressão de não existirem mais”, analisa. Mães solteiras, que vivem sozinhas com seus filhos em quartos de hotéis baratos porque não têm moradia, também frequentam o salão. “Aí é que entra a missão do salão, e isso é formidável. Quando vão embora penteadas e bonitas, viram outra pessoa. Conseguem se olhar no espelho, o que em muitos casos não acontecia há muito tempo. E têm a impressão que tudo vai mudar e dar certo”, diz.

Este é o caso de Agathe, que frequenta o salão há cerca de um ano. O local foi recomendado pela sua assistente social. Além de cortar o cabelo, ela vem uma vez por semana conversar com Anne, a psicóloga. “Desde que frequento o salão me sinto mais “zen”, e, principalmente, sei que alguém está tomando conta de mim”, diz. Como milhares de franceses, Agathe vive no quarto de um hotel barato pago pelo governo. “Perdi minha casa e foi muito difícil. Morava com minha mãe, muito doente, e quando ela foi para um asilo me mandaram embora”, conta. “Há quatro anos espero por uma moradia, sem resposta”.

Na sala de espera do salão Joséphine Beauté, em Paris
Na sala de espera do salão Joséphine Beauté, em Paris (Foto: Taíssa Stivanin/RFI Brasil)

“Vou achar um emprego”

Anna* me recebe com um sorriso largo, enquanto a cabeleireira refaz cuidadosamente suas pontas escuras. “Cuidar de nós mesmas faz bem para o ego. Conheci o salão através de uma amiga. A vida às vezes nos reserva momentos muito difíceis, minha história é delicada, mas posso dizer que estou me saindo muito bem. Tenho projetos, procurar um emprego e voltar à vida ativa. É uma pena que só exista um salão como esse em Paris”, diz.

Ajudar as clientes a achar um emprego também faz parte das missões do salão. Por isso um espaço foi reservado para “vestir” as candidatas a um novo trabalho. Nesse closet improvisado estão empilhados roupas, sapatos e acessórios doados por associações.

Salão em crise

A coordenadora do salão, Jadwiga Efrassoni, no comando da equipe há dois anos, conta que o local está atualmente em dificuldade financeira e quase fechou. “Antes tínhamos um funcionário, mas desde dezembro temos só voluntários. Estamos em um bom período com a abertura da temporada de estágios. Mas é um verdadeiro exercício de acrobacia, já que temos vários serviços: não só cabeleireiros, mas também psicóloga, ateliês de sofrologia e estética e maquiagem. Isso demanda tempo. Felizmente tenho uma equipe de voluntários formidável e conseguimos atingir nosso objetivo: que as mulheres saiam daqui sorrindo”, conta.

*O nome foi trocado a pedido da entrevistada
 

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