Alfredo Gomes, o primeiro negro a representar o Brasil nos Jogos Olímpicos

Foi em 1924, em Paris, que o primeiro atleta negro representou o Brasil em Jogos Olímpicos. Aos 25 anos, Alfredo Gomes, neto de escravos, foi escolhido para carregar a bandeira brasileira na abertura da Olimpíada no estádio de Colombes, nos arredores de Paris. 

No centro, o corredor Alfredo Gomes com uma tocha simbólica em percurso feito em 1945 © Divulgação/AC Paula

A trajetória desse paulista no esporte é feita de muita determinação - e alguma sorte. Nascido em 1899, no vale do Paraíba, Alfredo se muda jovem para a zona leste de São Paulo, onde, nas horas de folga, joga futebol na várzea e corre.

Em 1919, às margens da represa de Guarapiranga, Alfredo Gomes participa de uma corrida e ganha. "O interessante é que o prêmio dessa corrida era uma coisa inusitada: uma caixa de charuto, para atletas que precisam tanto do fôlego", brinca o neto e biógrafo do corredor, Antônio Carlos de Paula. 

É a partir desta vitória que o corredor será incorporado ao grupo de atletas do Clube Esperia. "Isso era uma coisa difícil na época, pois o clube tinha sido criado por um grupo de imigrantes italianos, quando o preconceito era algo muito mais arraigado que hoje", lembra De Paula. 

Dois anos mais tarde, lembra o neto, o presidente brasileiro Epitácio Pessoa veta a participação de jogadores negros da seleção brasileira que vai à Copa América.

Percurso olímpico 

Alfredo Gomes treinava nas pistas do clube durante a noite, após jornadas de trabalho extenuantes como eletricista na companhia telefônica de São Paulo. Sem técnico, mas com grande dedicação individual, o corredor chama atenção nas provas em que disputa e coleciona vitórias.

Quando chegam os Jogos Olímpicos de 1924, no entanto, não é certo que o Brasil enviará atletas para Paris. Apesar de ter recebido o convite, o presidente Artur Bernardes decide não custear a viagem e a estadia dos atletas. Depois de meses de briga com a Confederação Brasileira de Desportos, a Federação Paulista de Atletismo, com apoio do Jornal O Estado de São Paulo, custeia o envio de 12 atletas, entre eles, Alfredo Gomes, que venceu todas as provas eliminatórias realizadas.

Com bom desempenho esportivo, Alfredo é escolhido para carregar a bandeira brasileira na cerimônia de abertura dos Jogos em Paris. Contudo, na imagem oficial, ele aparece no canto esquerdo da delegação. 

Equipe de Atletismo do Brasil participante dos Jogos Olímpicos de Paris. Alfredo Gomes, à esquerda, é o primeiro brasileiro negro a disputar uma Olimpíada © Foto do Centro de Memória do Esporte da UFRGS

Para Antonio Carlos de Paula, essa é uma marca do racismo ainda que velado. "Eventualmente naquela foto, se tirasse aquele pedacinho do canto, é como se não fizesse falta, não atrapalha o resto da fotografia", comenta. 

Alfredo representa o Brasil na prova de cross country, ao lado de outros 37 atletas. No entanto, a competição é realizada em um terreno muito acidentado e sob condições extremas de calor, por volta dos 40° C, de acordo com relatos da época. Alfredo é um dos 23 corredores que não terminaram a prova.

Contudo, isso não coloca fim à viagem dos atletas brasileiros. A revolução tenentista de 1924 leva a delegação brasileira a ficar presa na Europa por seis meses, conta o biógrafo. Nesse período, Alfredo Gomes participa de provas de atletismo e aprende a falar algumas línguas estrangeiras.

Uma das medalhas conquistadas durante esse período na Europa será fundida para virar o par de alianças do seu casamento, relata Antônio Carlos de Paula.

Na volta para o Brasil, o corredor continua os seus treinamentos e, em 1925, ele vence a primeira Maratona de São Silvestre. Nos anos seguintes, fica em segundo lugar por três vezes.

Apesar de todos os seus feitos esportivos, Alfredo Gomes vai seguir no esporte amador por toda a vida, no contraturno de seus 51 anos de trabalho na companhia telefônica.