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Reportagem

"Fotografia foi a minha forma de vida”, diz Sebastião Salgado em Paris sobre 50 anos de carreira

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Às vésperas de completar 79 anos, Sebastião Salgado diz estar pronto para “dar lugar aos jovens”. Nesta entrevista exclusiva à RFI Brasil, em Paris, um dos maiores fotógrafos do mundo explica que não pensa em aposentadoria tão cedo, mas quer dedicar mais tempo à edição do vasto material acumulado em mais de 50 anos de carreira. O franco-brasileiro participou de um evento sobre fotojornalismo na Academia de Belas Artes, na noite de quarta-feira (23).

O fotógrafo Sebastião Salgado durante um evento sobre fotojornalismo na Academia de Belas Artes, em paris, em 23 de novembro de 2022.
O fotógrafo Sebastião Salgado durante um evento sobre fotojornalismo na Academia de Belas Artes, em paris, em 23 de novembro de 2022. © RFI Maria Paula Carvalho
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Maria Paula Carvalho, da RFI

“Eu já estou velhinho, vou fazer 79 anos em fevereiro. Eu acho que está na hora de eu deixar lugar para os jovens fotografarem. O que eu estou fazendo é editar o meu trabalho de mais de 50 anos como fotógrafo. Há muita coisa que eu nunca escolhi, nunca editei e acho que chegou o momento”, disse, momentos antes de compartilhar com o público momentos marcantes de sua longa experiência atrás das câmeras.

“A diferença da fotografia para outro tipo de informação é que se o fotógrafo não estiver lá onde a coisa está acontecendo, ele não tem a imagem. Ele busca a informação na fonte e isso leva você a ter um conhecimento bem vasto do mundo”, afirma.

Ao longo desse tempo, Salgado viajou por mais de 130 países registrando pessoas, paisagens e diferentes culturas. “A fotografia documentária é a forma de vida da pessoa que a realiza”, explica. “De uma maneira geral, tudo me marcou porque dificilmente eu posso dizer que um país ou algo que aconteceu na minha vida seja mais importante do que outro. Pois o que eu fiz em fotografia na vida foi a minha vida, foi a minha forma de vida”.

O mineiro Sebastião Salgado é "imortal" da sessão de fotografia da prestigiada Academia de Belas Artes francesa desde 2016, uma das honrarias culturais mais importantes do país. O debate sobre fotojornalismo lotou o auditório do Instituto de France e reuniu outros grandes nomes da fotografia francesa, como o cineasta Raymond Depardon e Pascal Maître.

“É um evento que eu não faço só, nós somos 4 fotógrafos, e falamos da preparação, de tudo que é preciso para montar uma reportagem”, explica Sebastião Salgado. “Eu acabo de fazer uma reportagem sobre a Amazônia brasileira, em que passei 7 anos na Amazônia e fiz dezenas de viagens e tudo isso exige produção, autorizações e uma preparação interna”, ensina.

O debate sobre fotojornalismo lotou o auditório do Instituto de France e reuniu outros grandes nomes da fotografia francesa, como o cineasta Raymond Depardon e Pascal Maitre (ao microfone).
O debate sobre fotojornalismo lotou o auditório do Instituto de France e reuniu outros grandes nomes da fotografia francesa, como o cineasta Raymond Depardon e Pascal Maitre (ao microfone). © RFI Maria Paula Carvalho

Testemunha de como vivem os homens e do estado atual do planeta, Sebastião Salgado falou à RFI sobre a importância do fotojornalismo em tempos de guerra e de fake news. “Em mais de 50 anos que eu faço fotografia, o que acontece hoje, não é muito diferente do que sempre aconteceu. A única diferença é que hoje está acontecendo muito mais perto do núcleo principal do planeta, que é onde você domina a informação e as finanças, no centro do imperialismo do planeta. Então temos a impressão de que hoje é mais importante do que foi, mas sempre foi a mesma coisa”, compara.

Um novo Brasil

O fotógrado premiado também comentou o resultado das eleições presidenciais no Brasil. “Eu espero que o Brasil agora mude. Nós tivemos um governo profundamente predador, que destruiu as instituições. Não é um problema de ser de direita ou de esquerda, é de um governo que destruiu instituições centenárias”, observa.

“Por exemplo, desmontou-se a Funai, que era o filtro de penetração nos territórios indígenas, era a proteção das comunidades indígenas e a proteção desses territórios. Mas esse filtro deixou de existir. E o território ficou aberto a invasões. Temos hoje invasão de mais de 20 mil garimpeiros no território Ianomâmi”, revela. “Houve uma destruição do Ibama e houve uma destruição massiva da floresta amazônica”, lamenta Salgado. “Espero que o governo que chega respeite as instituições, respeite a cultura, as comunidades, as minorias e seja menos violento. Esse atual governo trouxe uma violência brutal para a Amazônia que não existia”, acrescenta.

A exposição mais recente de Salgado em Paris, "Aqua Mater", lançava um novo alerta à crise climática, convidando o público a uma experiência estética e sensorial em torno de um dos assuntos mais sensíveis da atualidade: os recursos hídricos.

Vivendo em Paris, com viagens frequentes ao Brasil, o fotógrafo nomeado Cavaleiro da Legião de Honra na França comenta sobre a forma como o Brasil tem sido percebido no estrangeiro. “O Brasil hoje é percebido de uma forma muito especial no exterior. Os brasileiros eram vistos como um povo razoável, um povo pacífico, mas o que acontece no Brasil hoje choca profundamente o resto do mundo”, destaca. “Eu acho que uma nação a gente tem que trabalhar de forma pacífica, humana e não violenta. Eu tenho grande esperança que o Brasil vai funcionar de outra forma”, conclui.

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