Não bastava ter sido em vida um ícone de liberdade - o funeral de Nelson Mandela também entrou para a história como um momento de mobilização mundial raríssima. Dezenas de chefes de Estado e de Governo dos mais variados países e líderes das mais importantes organizações internacionais se reuniram hoje em Johanesburgo para prestar uma última homenagem ao homem que viabilizou o fim do regime do apartheid.
Vários presidentes, como a do Brasil, foram à cerimônia acompanhados de antecessores no cargo, uma forma de exprimir a relevância de Mandela ao longo da história. Ex-embaixador do Brasil em Washington e com uma ampla carreira diplomática, Rubens Barbosa não se recorda de ter visto nada parecido.
“Tem casos parecidos, mas eram outras circunstâncias, como a Diana, o Churchill ou o Kennedy. Eu não me lembro de uma mobilização desta maneira”, afirma. “Essa iniciativa do Brasil e dos Estados Unidos de levar vários presidentes que tiveram contato com ele foi uma coisa muito única. Não é normal que haja tanta mobilização política do mundo inteiro em torno de um funeral de uma personalidade.”
O funeral de Madiba, como era chamado pelos sul-africanos, mobilizou políticos das mais diversas correntes. Na opinião do historiador Adriano de Freixo, da Universidade Federal Fluminense, este consenso é um legado dos mitos, como Mandela.
“É uma mobilização excepcional, mas também era esperada, de certa forma. O Mandela é um daqueles raros casos em que ele transcende a condição de símbolo. Ele se tornou um mito em vida”, explica. “Isso atrai políticos de todas as tendências. O mito é passível de inúmeras interpretações e inúmeras utilizações de acordo com quem as está fazendo”.
Europeus de fora
Além do secretário-geral da ONU, Ban Ki-Moon, seis líderes foram convidados a discursar na cerimônia desta terça-feira, quase todos de países emergentes. A presidente Dilma Rousseff foi uma delas. O americano Barack Obama, primeiro presidente negro dos Estados Unidos, também subiu ao púlpito e exaltou a influência de Mandela na sua própria trajetória.
Nenhum presidente europeu foi chamado a discursar, um sinal de que as cicatrizes do apartheid ainda estão presentes nos corações dos sul-africanos, na opinião de Adriano de Freixo, especialista nas relações internacionais com a África lusófona.
No ponto de vista do tempo histórico, o colonialismo ainda é algo muito presente. E a gente não pode se esquecer que alguns dos líderes dos principais países europeus dos anos 70 e 80 classificavam Mandela como terrorista”, diz. “Eu acho que são coisas que não se esquecem.”
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