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Escritora negra propõe que símbolo da República Francesa tenha feições ameríndias

A escritora negra Leonora Miano, camaronesa de língua francesa, defende que a Marianne, o símbolo da República francesa, tenha as feições de uma ameríndia. Nesse momento de ampliação do movimento antirracista, ela publica um livro “Afropea” e defende uma visão menos racializada dos descendentes de imigrantes ou de moradores dos territórios ultramarinos franceses.

Destaque na imprensa francesa para Leonora Miano que defende que a Marianne, o símbolo da Republica Francesa, tenha as feições de uma ameríndia.
Destaque na imprensa francesa para Leonora Miano que defende que a Marianne, o símbolo da Republica Francesa, tenha as feições de uma ameríndia. © Fotomontagem RFI
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Leonora Miano é uma premiada escritora de língua francesa, radicada na França desde 1991. Seu novo livro, que chega agora às livrarias, não é um romance e sim um ensaio: "Afropea" traz reflexões sobre as relações entre a África e a Europa. 

No texto, a escritora de origem camaronesa propõe um novo imaginário político e um novo mundo para que as pessoas nascidas da relação entre os dois continentes vivam, enfim, em harmonia. Para isso, ela inventa um novo território descrito com novas palavras: “Afropea” é a contração de África e europeia em francês e “Afropéens”, os filhos nascidos dessa relação, o que em português daria algo como Afropeus.

Em entrevista ao jornal Libération desta segunda-feira (5), Leonora Miano explica que essa nova denominação impediria que os mestiços fossem vítimas de uma visão racializada e passariam a ser reconhecidos por sua vida e cultura, independentemente da cor de sua pele. Assim, eles poderiam viver plenamente sua parte europeia e africana, sem renunciar a nenhuma delas e sem ser vítimas de racismo.

Utopia

O livro sugere "uma utopia onde os indivíduos não seriam mais definidos e tolhidos pela cor de sua pele e também uma outra proposta sobre a identidade da França", define o jornal.

Na entrevista, a escritora negra diz que não pode ser considerada uma “Afropeia” porque nasceu e cresceu na República dos Camarões e por isso não viveu durante muito tempo como minoria.

O livro é lançado em um momento em que, a exemplo dos Estados Unidos após a morte de George Floyd, na França o movimento antirracista e contra a violência policial também ganha uma nova dimensão. Mas para Leonora Miano o país vive uma negação antiga em relação à questão negra. “Há uma história de luta dos movimentos negros na França, mas ela não foi transmitida”, declara.

O que muda atualmente é que os afrodescendentes resolveram não mais se calar e os políticos, que sempre negaram as questões particulares ligadas a essas populações, não têm mais escolha e devem começar a discutir com esses movimentos. “Na França, a cor da sua pele é um limite social que enclausura a pessoa. Uma visão racializada, que retira das minorias seu território de nascimento. Se fala em uma pessoa de origem da migração, mesmo para cidadãos franceses nascidos na França”, lembra a escritora. Esta é uma visão antifrancesa, acredita.

Proposta de identidade nacional

Leonora Miano pede que a França se posicione claramente sobre a sua verdadeira identidade. Ela ressalta, por exemplo, que a assimilação dos territórios ultramarinos franceses, resultado da colonização ­- como a Reunião, Martinica, Guadalupe ou Nova Caledónia - , nunca aconteceu.

Esses territórios não são europeus e seus habitantes não são brancos. No entanto, eles são franceses há muito tempo e, muitas vezes, têm essa nacionalidade por imposição e de maneira brutal, como na Guiana francesa. “Se a França tivesse aceitado as influências dessas populações, ela teria uma relação mais serena com seus cidadãos de ascendência extraeuropeia”, acredita. Por isso, a escritora reivindica uma Marianne (símbolo da República) ameríndia. “É necessário dar corpo ao discurso republicano que teorizamos muito bem, mas não concretizamos”.

 

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