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Paris e Berlim celebram 60 anos do tratado de amizade franco-alemão apesar de divergências sobre guerra na Ucrânia

Paris e Berlim comemoram neste domingo (22) 60 anos de reconciliação. A data coincide com a realização de um conselho de ministros franco-alemão, na capital francesa, com presença do presidente Emmanuel Macron e do chanceler Olaf Scholz.

O chanceler alemão, Olaf Scholz (esquerda), ao lado do presidente francês, Emmanuel Macron, neste domingo (22), em Paris.
O chanceler alemão, Olaf Scholz (esquerda), ao lado do presidente francês, Emmanuel Macron, neste domingo (22), em Paris. AP - Lewis Joly
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Paris, 22 de janeiro de 1963, Palácio do Eliseu, sede da presidência francesa: Charles de Gaulle e Konrad Adenauer assinam o célebre compromisso para a cooperação franco-alemã, conhecido como "Tratado do Eliseu". Nas imagens em preto e branco, após a assinatura do documento pelos dois líderes, o general francês surpreende o chanceler com um caloroso abraço.

Uma declaração comum ilustra o texto do acordo, evocando "a reconciliação do povo alemão e do povo francês, que coloca fim a uma rivalidade secular e constitui um evento histórico". Na época, os jovens são convocados a colocar um ponto final nas divisões entre os dois países e têm "um papel determinante na consolidação da amizade franco-alemã", diz o compromisso, que engloba três principais áreas: relações exteriores, defesa e educação. 

A reaproximação também conta com visitas mútuas de Adenauer e De Gaulle. O presidente francês foi acolhido com entusiasmo na Alemanha em 1962, onde pronunciou um discurso em alemão, que fez questão de decorar. A ida do chanceler até Reims, no nordeste da França, também é marcante: a cidade onde foram coroados três reis franceses, foi extremamente castigada por bombardeios alemães durante a Primeira Guerra Mundial. 

O chanceler Konrad Adenauer (à esquerda), e o general Charles de Gaulle se abraçam após assinatura do "Tratado Eliseu", em 22 de janeiro de 1963.
O chanceler Konrad Adenauer (à esquerda), e o general Charles de Gaulle se abraçam após assinatura do "Tratado Eliseu", em 22 de janeiro de 1963. © AFP

No entanto, apesar do simbolismo, por trás do tratado há um projeto de união política da Europa liderado por De Gaulle e rejeitado por outros países que não quiseram colocar em risco a Comunidade Econômica Europeia (CEE), criada em 1957. Na Alemanha, apesar da assinatura do acordo, Adenauer é pressionado a privilegiar as relações com Washington e o Londres. A reticência do general francês sobre a Otan e a rejeição da entrada do Reino Unido na CEE também acaba por irritar Berlim e prejudicar os avanços entre os dois países. 

Na prática, o símbolo da reconciliação entre a França e a Alemanha se mostra como um projeto natimorto. No dia a dia, a cooperação é complicada e os projetos de cada país divergem. Os laços só se reatam com a chegada do francês Valéry Giscard d’Estaing e do alemão Helmut Schmidt ao poder, pouco mais de uma década após a assinatura do compromisso. 

Surpreendentemente é no setor da educação que o tratado mais se mostrou frutuoso, com trocas importantes no pós-guerra. Seis meses após a assinatura do compromisso, o Escritório Franco-Alemão para a Juventude (Ofaj) é criado. Em seis décadas, cerca de dez milhões de estudantes franceses e alemães participaram de projetos implementados pelo organismo. 

Apesar dos altos e baixos, 60 anos depois de sua assinatura, o Tratado do Eliseu é lembrado como um ícone da reconciliação entre os dois países. O acordo contribuiu para momentos históricos, como o discurso do presidente François Mitterrand no Parlamento alemão, nos anos 1980, para apoiar a política de defesa e segurança do chanceler Helmut Kohl. No entanto, ele não elimina as diferenças do passado e os desacordos atuais entre os dois países.

Macron e Scholz exaltam união da "locomotiva" franco-alemã

Neste domingo, na Universidade Sorbonne, em Paris, os dois chefes de Estado fizeram um apelo em prol da "refundação da Europa". O presidente francês garantiu que "o casal" fará as melhores escolhas para o futuro, como, segundo ele, França e Alemanha "souberam fazer a cada momento da construção europeia". Os dois líderes voltaram a se reunir no Palácio do Eliseu para um conselho de ministros durante a tarde.

Macron e Scholz também assinam juntos uma coluna publicada simultaneamente no jornal alemão Frankfurter Allgemeine Zeitung e no francês Journal du Dimanche. No texto, os dois líderes falam da determinação para construir "uma Europa resiliente, poderosa e soberana". Segundo eles, diante da guerra na Ucrânia, é preciso "garantir que as futuras gerações de europeus possam viver em um continente onde paz, prosperidade e liberdade". 

Por trás do lirismo dos discursos, estão as desavenças, a começar pelos temperamentos opostos de Macron e Scholz. Os desacordos também são evidentes nos projetos políticos. O encontro anual entre os líderes da França e da Alemanha foi adiado no último mês de outubro devido à falta de acerto sobre questões-chave, como energia e defesa, que vieram à tona a partir da guerra na Ucrânia. 

Ao lado do presidente francês, Scholz prometeu neste domingo continuar apoiando Kiev "o tempo que for necessário", em prol do "projeto de paz europeu". O chanceler não mencionou, no entanto, a controvérsia envolvendo a resistência de Berlim no envio de tanques Leopold 2 à Ucrânia.

A atitude da Alemanha fez o tom subir entre os aliados neste fim de semana. Depois dos países Bálticos e dos Estados Unidos, foi a vez do primeiro-ministro da Polônia, Mateusz Morawiecki, chamar a atenção de Berlim sobre o impasse. 

"A atitude da Alemanha é inaceitável. Já se passou quase um ano desde que a guerra começou. Há pessoas inocentes morrendo todos os dias", afirmou o premiê polonês. "As bombas russas estão causando estragos nas cidades ucranianas. Alvos civis estão sendo atacados, há mulheres e crianças morrendo", insistiu.

Até o momento, Berlim não respondeu às críticas, nem esclareceu seu posicionamento sobre a reticência em enviar os veículos de guerra à Kiev, como esperava-se após a reunião de representantes de mais de 50 países em Ramstein, na última sexta-feira (20)

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