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Veneza: imagens impressionantes na crônica de um Carnaval fantasma da era Covid

Na mítica praça San Marco, em Veneza, mergulhada em uma densa névoa neste domingo (7), passeavam casais disfarçados de nobres da "Sereníssima" e crianças fantasiadas salpicadas de confete. Era o pontapé para a saída do tradicional Carnaval de Veneza, que, na versão Covid, foi transformado em uma folia semivirtual, sem turistas. A magia, no entanto, continua a operar na cidade que inspirou Shakespeare, abrigou em seus subterrâneos prisioneiros como o Marquês de Sade e que produziu gênios como Vivaldi. E que viveu períodos sombrios com a Peste e o Cólera, muito antes da Covid-19.

Com a máscara carnavalesca que evoca a proteção usada pelos médicos na época da "Peste", na Europa, um raro folião se aventura nos arredores da Praça São Marcos, em Veneza, em 7 de fevereiro de 2021.
Com a máscara carnavalesca que evoca a proteção usada pelos médicos na época da "Peste", na Europa, um raro folião se aventura nos arredores da Praça São Marcos, em Veneza, em 7 de fevereiro de 2021. REUTERS - MANUEL SILVESTRI
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Um folião usa uma máscara de carnaval na Praça de São Marcos para celebrar o colorido carnaval anual de Veneza, que foi cancelado este ano devido à pandemia do coronavírus (COVID-19), em Veneza, Itália, 7 de fevereiro de 2021. REUTERS / Manuel Silvestri
Um folião usa uma máscara de carnaval na Praça de São Marcos para celebrar o colorido carnaval anual de Veneza, que foi cancelado este ano devido à pandemia do coronavírus (COVID-19), em Veneza, Itália, 7 de fevereiro de 2021. REUTERS / Manuel Silvestri REUTERS - MANUEL SILVESTRI
“É totalmente surreal. O que mais me impressiona é o silêncio. Durante o carnaval, sempre ouvíamos música, gente se divertindo. Mas Veneza sob as brumas, ainda é um lugar mágico”, diz Chiara Ragazzon, 47 anos.

A assistente administrativa italiana veio com o marido da cidade de Jesolo, a cerca de 50 km de distância. Embora a região de Veneto tenha passado para uma zona amarela, com risco apenas moderado de contágio, os habitantes não podem se deslocar para fora da região italiana.

A poucos passos da famosa praça San Marco, Hamid Seddighi, 63, vestida com bata de pintor manchada de tinta, se dedica a fazer uma tradicional máscara do carnaval de Veneza: ela a molda, esculpe, alisa delicadamente, os movimentos são rápidos, com precisão cirúrgica.

Na oficina de sua loja, a Ca 'del Sol, máscaras de papel machê, renda ou ferro, adornadas com cristais Swarovski, acumulam-se sem encontrar compradores: desde o início da pandemia, seu número de negócios despencou em 70%, por falta de turistas estrangeiros, sua principal clientela.

Os turistas estrangeiros, principal fonte de renda para os artesãos que produzem máscaras para o Carnaval de Veneza, estiveram ausentes em 7 de fevereiro de 2021.
Os turistas estrangeiros, principal fonte de renda para os artesãos que produzem máscaras para o Carnaval de Veneza, estiveram ausentes em 7 de fevereiro de 2021. REUTERS - MANUEL SILVESTRI

 

“Me apaixonei pelas máscaras, faço-as há 35 anos. Mas isso é dramático, só vendi duas para este carnaval”, lamenta a artesã de origem iraniana ajustando sua boina preta.

Antes da pandemia, o carnaval movimentava cerca de € 70 milhões, gastos por uma média de 567 mil turistas, segundo a autarquia de Veneza.

 Em frente à Basílica de São Marcos, cerca de trinta artesãos mascarados, vestindo longas capas pretas, congelam suas poses em silêncio num protesto para "lembrar ao mundo que ainda existem e resistem".

Para incentivar os habitantes da "Cidade dos Doges" a perpetuar a tradição, a associação dos artesãos de Veneza lançou uma campanha com descontos, com o tema: "O carnaval dos venezianos, com as máscaras anti Covid!"

Quem disse que os foliões não estão protegidos contra a Covid-19? Veneza, 7 de fevereiro de 2021.
Quem disse que os foliões não estão protegidos contra a Covid-19? Veneza, 7 de fevereiro de 2021. REUTERS - MANUEL SILVESTRI

 

“Veneza está deserta de turistas, então esta é para os venezianos a oportunidade de se reapropriar e redescobrir sua cidade”, explica o diretor da associação de artesãos, Gianni De Checchi. "Nos últimos 25 anos, o turismo de massa perturbou o tecido socioeconômico do centro de Veneza. E, de certa forma, afastou o carnaval", avalia.

"Peste e cólera"

“Já não íamos mais com a minha mulher ao carnaval, era muita gente. Esta é uma cidade histórica, vazia”, testemunha Peter, um médico austríaco de 65 anos - um dos poucos turistas estrangeiros em Veneza.

“Estava na hora da gente vir, com a pandemia, porque eles tiveram peste e cólera no passado e isso lembra o 'Morte em Veneza', filme de Luchino Visconti", considera o médico.

Antes da pandemia, o carnaval movimentava cerca de € 70 milhões, gastos por uma média de 567 mil turistas, segundo a autarquia de Veneza. Na foto, a cidade na manhã de 7 de fevereiro de 2021, completamente sem turistas.
Antes da pandemia, o carnaval movimentava cerca de € 70 milhões, gastos por uma média de 567 mil turistas, segundo a autarquia de Veneza. Na foto, a cidade na manhã de 7 de fevereiro de 2021, completamente sem turistas. REUTERS - MANUEL SILVESTRI

 

O município de Veneza, que foi forçado a interromper as festividades de carnaval quando a pandemia estourou em fevereiro de 2020, desta vez depende de videoclipes transmitidos online que apresentam venezianos fantasiados.

“É uma forma de revigorar os laços que nos unem aos milhões de amantes de Veneza”, explica a assessora de turismo, Simone Venturini.

"Divertindo-se em plena Covid"

Entre as cenas filmadas pelos habitantes, surge um minueto improvisado na Ponte Rialto por um grupo de carnavalescos em trajes barrocos.

"Queríamos mostrar que Veneza não é uma cidade morta, que podemos nos divertir até no meio da Covid", diz um dos foliões, Armando Bala, 42, usando uma peruca rococó e uma sobrecasaca de veludo vermelho bordada à mão .

Foliões disfarçados com perucas rococó tentam lembrar que é possível festejar, apesar da Covida-19. Veneza, 7 de fevereiro de 2021.
Foliões disfarçados com perucas rococó tentam lembrar que é possível festejar, apesar da Covida-19. Veneza, 7 de fevereiro de 2021. REUTERS - MANUEL SILVESTRI

Com sua esposa Arnisa, ele administra a loja "La Bauta" há mais de 20 anos. Nas barracas, suntuosos trajes de época estão ao lado de máscaras artesanais inspiradas em personagens típicos da Commedia dell'Arte, como o "Arlequim" ou a "Colombina".

O carnaval contribui com cerca de 40% para o faturamento da "La Bauta", e boa parte vem de turistas franceses, grandes fãs do carnaval de Veneza.

“Não estamos tentando ganhar dinheiro, apenas queremos sobreviver”, diz Armando Bala.

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