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Radar econômico

França aperta o cerco contra empresas acusadas de corrupção no exterior

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Os deputados franceses começaram a analisar nesta semana uma importante reforma na legislação anticorrupção no país, com vistas a tornar as transações econômicas mais transparentes. Desta forma, a França espera recuperar o atraso em relação à maioria dos países desenvolvidos, que enquadram os subornos realizados por suas empresas nacionais em atividades no exterior.

Ministro das Finanças, Michel Sapin, apresentou o projeto de lei nesta segunda-feira (6), na Assembleia Nacional francesa.
Ministro das Finanças, Michel Sapin, apresentou o projeto de lei nesta segunda-feira (6), na Assembleia Nacional francesa. AFP PHOTO / THOMAS SAMSON
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Em 2014, a OCDE (Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico) cutucou Paris e disse que o país precisava melhorar o combate à corrupção. Um dos casos mais emblemáticos é o da gigante Alstom, indústria francesa de transportes e energia. Envolvida em casos de corrupção nos quatro cantos do mundo, a companhia jamais foi punida na França.

No Brasil, a Alstom foi o alvo do escândalo de pagamento de subornos ao governo de São Paulo, para as obras de expansão do metrô da capital paulista. A tendência é que, com a reforma, as autoridades francesas possam, enfim, aplicar multas e sanções às companhias corruptoras.

“O nosso maior atraso era na luta contra a corrupção internacional e o comércio internacional”, atesta Daniel Lebegue, presidente da organização Transparência Internacional na França, uma das que mais pressionava pelas mudanças. “A França adotou a Convenção da OCDE e a Convenção das Nações Unidas, mas a Justiça francesa não pôde realizar investigações e, principalmente, aplicar condenações penais contra sequer uma empresa. Isso estava totalmente errado, porque outros grandes países democráticos e exportadores têm um sistema muito mais eficaz do que o nosso, como os Estados Unidos, a Alemanha, o Reino Unido, a Itália ou a Holanda.”

Fiscalização dentro das empresas

O projeto de lei do ministro das Finanças, Michel Sapin, prevê a criação de uma Convenção Judiciária de Interesse Público, pela qual um magistrado poderá negociar sanções com a empresa acusada de participação em desvios e impor um plano de prevenção de corrupção no futuro. O mecanismo permitirá que a Justiça possa controlar, dentro da empresa, o cumprimento dos compromissos assumidos.

Eric Alt, vice-presidente da organização Anticor, se mostra reticente quanto ao texto final, que sairá dos debates parlamentares. A entidade acompanhou de perto a formulação do projeto de lei e apresentou alguns dos projetos de emendas ao texto.

“Precisamos, evidentemente, construir um arcabouço jurídico para novas práticas, mas tudo vai depender do que será feito de fato e da cultura que será desenvolvida depois”, indica. “Por exemplo, haverá essa autoridade que vai fiscalizar a transparência nas empresas. Mas a sua eficácia depende dos recursos que ela vai dispor e da verdadeira independência que ela terá.”

Lebegue observa que, ao contrário do que poderia parecer, a França não fechava os olhos para as ações ilegais cometidas pelas fabricantes no exterior. “Não era um problema de proteção ou de complacência com as empresas: era um problema de falta de ferramentas, de meios de ação. Acho que, agora, daremos aos magistrados franceses os instrumentos para eles poderem fazer o trabalho deles”, afirma o presidente da Transparência.

O combate será reforçado com a abertura de uma Agência Anti-Corrupção. Mas, para Eric Alt, o pagamento de multas não é o instrumento mais adequado para combater as práticas ilegais no exterior.

“Em todos os países, existe essa dificuldade de sancionar as próprias empresas. Sim, os riscos de condenações são cada vez maiores, as empresas são obrigadas a mudar de conduta e a corrupção empresarial está regredindo. Por outro lado, há um certo fatalismo”, explica Alt. “É rentável corromper, sob o risco de ser pego, porque se isso acontecer, vai bastar pagar uma multa ou, até mesmo, ficar sem pagar nada. Ou seja, houve avanços, mas ainda reina um discurso segundo o qual, infelizmente, em alguns países só pode fechar negócios se for com corrupção.”

Proteção de denunciantes de irregularidades

A proposta apresentada aos deputados ainda inclui uma série de medidas de âmbito nacional, como o enquadramento da atividade dos lobistas, a aprovação prévia dos salários dos dirigentes das empresas e a proteção dos autores de denúncias de irregularidades. Neste quesito, a França poderá se tornar um dos países mais avançados do mundo, ao coibir as represálias e o risco de demissão dos denunciantes, prever indenizações e o pagamento dos custos de eventuais processos movidos pela empresa contra o funcionário.

Os debates na Assembleia francesa prometem ser longos: quase 1.500 propostas de emendas foram sugeridas ao texto, que tem 57 artigos. A esquerda se monstra unida para aprovar as propostas, mas o texto é criticado por uma parcela dos deputados de direita.

 

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