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Hostilidade do governo em relação às universidades prejudica o país, lamenta reitor da UFBA

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Os reitores das universidades federais se preparam para mais um ano de instabilidade nas instituições públicas de ensino superior. Apenas 70% do orçamento de 2020 está garantido. Os demais 30% dependem de aprovação parlamentar. Segundo o presidente da Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes), João Carlos Salles, reitor da Universidade Federal da Bahia (UFBA), essa incerteza desorganiza as unidades de ensino, a pesquisa e prejudica o avanço do ensino no país.

João Carlos Salles, reitor UFBA e presidente da Andifes.
João Carlos Salles, reitor UFBA e presidente da Andifes. Captrua de Vídeo
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Em entrevista à RFI, João Carlos Salles analisou a polêmica em torno da Medida Provisória (MP) 914. No final do ano, o presidente Jair Bolsonaro pegou a comunidade acadêmica de surpresa ao publicar, na véspera do Natal, uma medida que altera o processo de escolha dos reitores. Tradicionalmente, o reitor das universidades públicas federais é escolhido pelos docentes da instituição, por intermédio de uma votação de uma lista tríplice. O mais votado dessa lista costumava ter o nome sancionado pelo presidente. A MP 914 alterou esta regra e permite que Bolsonaro escolha um dos três nomes da lista.

O deputado Elias Vaz (PSB-GO) entrou com um mandado de segurança no Supremo Tribunal Federal (STF) sob alegação de que o texto fere a autonomia das universidades. O STF vai analisar o caso em fevereiro, quando retornar do recesso.

"Não havia a menor necessidade de utilizar uma MP, que é um expediente para casos de urgência e relevância. Nós já temos uma legislação sobre isso e durante o período de vigência da medida não há previsão de processo eleitoral nas universidades", destaca Salles. Ele observa que, em relação aos institutos federais, que já tinham a prerrogativa de indicar apenas um nome para a direção, agora eles também serão obrigados a enviar uma lista tríplice. Porém, na avaliação do presidente da Andifes, "a lista tríplice é uma anomalia, se considerarmos que as universidades são autônomas e têm a prerrogativa constitucional de gestão". O recuo em relação aos institutos federais é que o processo de escolha do dirigente, que acontecia dentro da universidade, agora terá a interferência do presidente da República. No caso das universidades, a consulta, que antes era informal, após um debate de projetos com os atores da comunidade, fica atrelada a três nomes. "A MP simula um expediente democrático, quando na verdade ela se volta contra a comunidade", diz Salles.

Reitores escolhidos pelo presidente

No primeiro ano do governo Bolsonaro, quase a metade dos reitores nomeados não levou em consideração as listas enviadas e o primeiro colocado, ou seja, o docente escolhido pela comunidade científica. Quebrou-se esse acordo. "A autonomia das universidades tem sido sistematicamente desrespeitada", lamenta Salles. "É preciso que o STF rejeite esta MP como inconstitucional, e tenhamos a oportunidade que o Congresso elabore, entre os vários projetos de lei, uma solução mais adequada à natureza da universidade", estima o presidente da Andifes.

O reitor da UFBA vê um duplo ataque à democracia universitária. De acordo com a nova MP 914, os dirigentes das unidades subordinadas à reitoria passam a ser indicados diretamente sem consulta às comunidades. "Um reitor que tenha recebido um número irrisório de votos e chegado em terceiro lugar, por exemplo, se tiver sintonia com o governo, poderá ser nomeado e exercer um poder abusivo em relação à nomeação dos diretores e seu próprio vice-reitor", critica Salles.  

"Existe um sentimento de hostilidade em relação às universidades. Elas estão sendo depreciadas, agredidas, tendo a imagem de seus gestores atacada por um ministério que deveria proteger e amparar a comunidade universitária", lamenta o presidente da Andifes. Ele condena a emergência de uma visão "mais empreendedora" do ensino universitário em detrimento da riqueza de interação entre as diversas áreas do conhecimento, com um menosprezo injustificável às areas de ciências humanas.

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