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Um pulo em Paris

Mulheres vivem inferno cotidiano de assédio sexual no metrô em Paris

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A polícia de Paris revelou esta semana dados alarmantes sobre agressões sexuais a mulheres na rede de transporte coletivo de Paris. O documento revela uma média de 156 denúncias de agressões sexuais por dia, um número que dobrou nos últimos dez anos e ainda é considerado subestimado.

A associação francesa Osez le Féminisme (Ouse o Feminismo) lançou uma campanha no país na tentativa de diminuir a violência contra as mulheres nos transportes coletivos.
A associação francesa Osez le Féminisme (Ouse o Feminismo) lançou uma campanha no país na tentativa de diminuir a violência contra as mulheres nos transportes coletivos. AFP - GEOFFROY VAN DER HASSELT
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Desde 2020, a polícia registrou 57.000 queixas de violência sexual no transporte público em Paris e na região de Île-de-France – o cinturão metropolitano que é servido pela empresa RATP.

Para algumas mulheres, dependendo da linha de metrô, do trem de subúrbio ou ônibus utilizados, o assédio e a importunação sexual são ocorrências do cotidiano.É no transporte que as francesas ficam mais expostas às agressões sexuais, com 43% das denúncias registradas, contra 40% nas ruas e 17% em outros locais, segundo a polícia.  

Atualmente, uma equipe especializada de 60 policiais circula na rede de transporte parisiense à paisana, para identificar os agressores e prendê-los em flagrante. Mas esse número de agentes é considerado insuficiente diante da amplitude do problema. Além disso, esses policiais descrevem um trabalho difícil, que às vezes demora para dar resultados.

De acordo com a polícia, 60% das denúncias são relacionadas com homens que se esfregam nas mulheres, se masturbam ou passam a mão no corpo das passageiras.

Eles atacam nos horários de pico, quando o metrô está lotado, de manhã ou no retorno do expediente de trabalho. Mesmo quando a vítima grita para denunciar a situação, o que tem acontecido com mais frequência, pode ser complicado para o policial se movimentar dentro do trem e na plataforma, se o vagão está cheio. A polícia faz investigações, com base nas câmeras de segurança, mas muitos agressores seguem impunes.

Em Paris, as linhas que mais registram vítimas de assédio sexual são a 2, a 5, a parte norte da 13, que é a mais frequentada na capital no caso do metrô, e os trens de subúrbio chamados RER A e B.

O perfil sociológico dos delinquentes é bastante variado, com idades que vão de 12 a 72 anos. A polícia não estigmatiza uma origem étnica, pelo contrário, diz no relatório que os agressores são de meio sócioprofissional variado.

Com a proximidade dos Jogos Olímpicos de Paris, no ano que vem, as autoridades estão preocupadas. Diariamente, 8 milhões e meio de passageiros utilizam as linhas de metrô, VLT (veículo leve sobre trilhos), que aqui se chama tramway, ônibus e trens de subúrbio.

A linha 13, por exemplo, que já é apontada como problemática no relatório da polícia, transporta diariamente 600 mil pessoas e tende a ficar pior na Olimpíada, porque serve a área de Saint-Denis, onde ficam várias infraestruturas olímpicas.

Além da questão do trauma das mulheres que são submetidas a esse inferno cotidiano de assédio, existe a questão da imagem da cidade, de Paris oferecer aos seus visitantes uma rede de transporte com tantos problemas de violência e delinquência.

Novo dispositivo para usuárias de ônibus

Em 1° de setembro, entrou um vigor uma medida para reforçar a segurança das mulheres que utilizam ônibus. A partir de 22 horas, todos os dias da semana, as usuárias dos ônibus da companhia RATP poderão pedir ao motorista para desembarcar onde quiserem entre dois pontos nos 20 bairros da capital. O objetivo é que elas tenham de andar a menor distância possível até chegar ao local onde vão.

Esta medida vem sendo testada nos subúrbios de Paris desde 2018, com bons resultados para a segurança das mulheres. A partir de hoje, a medida é estendida para os 20 bairros de Paris depois das 10 da noite. É só a passageira avisar o motorista onde prefere descer, que ele vai procurar atendê-la.

Desde 2020, a empresa RATP conta com uma profissional contratada para dirigir campanhas de sensibilização e treinar agentes de segurança da própria companhia, que circulam nos trens e ônibus, além dos policiais. São equipes mistas de homens e mulheres que circulam pelas estações e ônibus. Quando eles são informados de alguma agressão, são orientados a acompanhar a vítima até a delegacia, para a mulher registrar o botelim de ocorrência. A empresa paga um táxi para levar a vítima até o posto policial e mantém contato com ela nas semanas posteriores à agressão. Mesmo assim, tanto a RATP quanto a direção da polícia dizem que o número de denúncias é inferior aos atos de violência cometidos na rede.     

Muitas passageiras ignoram essa possibilidade, outras desconhecem as penas previstas, outras têm medo de sofrer represálias porque usam aquela linha do metrô diariamente. Ainda existem mulheres que ficam traumatizadas, com receio de serem julgadas e acabam desistindo de usar o transporte público – buscam outra forma de locomoção. Nesses casos, os agressores ficam impunes. O que se nota é que são as mulheres mais jovens, estudantes e adolescentes que denunciam com mais frequência graças ao empoderamento gerado pelo movimento #MeToo.

As jovens também são as mais assediadas. Em reportagens, algumas contam que mudaram o jeito de se vestir para não serem perturbadas. Quer dizer, para se proteger, as mulheres acabam abrindo mão de seu direito à liberdade e à dignidade.

A legislação francesa prevê penas duras para os crimes sexuais. Para o estupro, no mínimo 15 anos de prisão, que podem aumentar de acordo com circunstâncias agravantes. A importunação sexual, atos libidinosos e obscenos em público, como o descrito de homens que se masturbam e ejaculam em mulheres no transporte coletivo, entra na categoria dos 5 anos de prisão e € 75.000 de multa; o juiz pode graduar essa pena em função das circunstâncias. Se for assédio de menor de 15 anos, passa para 7 anos de prisão e € 100.000 de multa.

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