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Um pulo em Paris

Debate sobre uso do burquíni em piscinas incendeia pré-campanha para eleições legislativas na França

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Depois do véu islâmico ter roubado a cena na campanha das eleições presidenciais, o burquíni domina o debate antes das eleições legislativas francesas, que acontecem em 12 e 19 de junho. O traje de banho usado por muçulmanas foi autorizado nas piscinas públicas de Grenoble, no sudeste do país, incendiando a classe política.

Mulher usa burquíni em praia de Marselha, no sul da França. Foto de arquivo.
Mulher usa burquíni em praia de Marselha, no sul da França. Foto de arquivo. Reuters/Stringer
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Há vários dias o burquíni voltou a ocupar os noticiários e páginas de jornal na França. Na segunda-feira (16), a câmara municipal de Grenoble aprovou o uso do maiô usado por muçulmanas nas piscinas públicas locais, bem como autorizou o topless — que pouco choca a opinião pública ou a classe política. O ecologista Eric Piolle, prefeito dessa cidade de 158 mil habitantes aos pés dos Alpes, defende a iniciativa como "um combate feminista".

A menos de um mês das eleições legislativas, os políticos aproveitam a polêmica para atrair a atenção do eleitorado. É o caso da líder da extrema direita francesa, Marine Le Pen, que anunciou que pretende ser líder da bancada do partido Reunião Nacional na Assembleia Francesa.

Ela promete a criação de um projeto de lei para proibir o uso do burquíni em todas as piscinas públicas da França. Durante a campanha para as eleições presidenciais, em abril, ela suscitou uma forte polêmica ao sugerir uma lei proibindo o uso do véu islâmico no espaço público.

Conservadores contra o burquíni

A extrema direita não é a única a se revoltar contra o burquíni. O conservador Laurent Wauquiez, presidente da região Auvergne-Rhône-Alpes, onde fica Grenoble, acusa o prefeito de "submissão ao islamismo". Ele ameaça cortar verbas que o governo regional repassa à cidade.

Vários representantes do partido Renascimento, do presidente Emmanuel Macron, de centro-direita, também vêm tecendo duras críticas a Eric Piolle. O prefeito de Grenoble é membro o partido Europa Ecologia Os Verdes, legenda que integra a coalizão de esquerda Nova União Popular Ecológica e Social (Nupes). O grupo domina as intenções de voto para o primeiro turno das eleições legislativas, segundo as últimas pesquisas.

O ministro francês do Interior, Gérald Darmanin, chegou a classificar a autorização do burquíni como “uma provocação” por parte de Piolle. Darmanin disse ter registrado um pedido oficial para que a permissão do maiô muçulmano nas piscinas públicas de Grenoble seja revogada.

Para Prisca Thévenot, uma das porta-vozes do Renascimento, o prefeito de Grenoble prejudica os valores republicanos com uma decisão "grave". "Quando entramos em uma piscina municipal, todos os cidadãos devem respeitar as regras", defende. "Agora acabamos de contornar a regra para responder a uma vontade política religiosa", reitera.

No campo oposto, uma centena de personalidades francesas — entre elas algumas célebres feministas — assinaram recentemente uma tribuna de apoio ao uso do burquíni. "As mulheres muçulmanas merecem ter espaço nas piscinas como todas as cidadãs (...) e ninguém deve ser estigmatizado devido à escolha de seu traje de banho", diz o texto.

Separação entre as igrejas e o Estado

A laicidade é um princípio imposto pela lei de 9 novembro de 1905 na França, determinando a separação entre as igrejas e o Estado. Isso impede, por exemplo, que funcionários públicos usem em seu local de trabalho roupas ou acessórios que indiquem sua religião. O mesmo vale para as escolas públicas francesas, onde tudo o que é considerado como símbolo ostentatório de religiões é proibido.

No espaço público, os cidadãos franceses têm direito de usar trajes que indiquem sua crença. Uma das poucas restrições são roupas ou acessórios que cubram o rosto. Por esse motivo,  o niqab, que deixa apenas os olhos à mostra, e a burca integral, que cobre até os olhos com uma tela, são proibidos.

Alguns locais, como as piscinas públicas, têm um regulamento interno, determinado pelas prefeituras. Antes de Grenoble, apenas Rennes, no noroeste da França, havia autorizado o uso da burca para nadar, desde 2018.

Para a prefeita da cidade, a socialista Nathalié Appéré, "a laicidade não pode ser imposta nas piscinas", onde, segundo ela, "as únicas regras que devem valer são higiene e segurança". "A lei de 1905 sobre a separação das igrejas e do Estado não prevê ser a polícia das roupas. A laicidade impõe a neutralidade mais estrita o possível aos serviços público e seus agentes, jamais aos usuários. É o Estado que é laico, não o cidadão", afirmou Appéré recentemente ao jornal regional Ouest-France.

Polêmica teve início em 2016

Essa não é a primeira vez que o burquíni suscita uma forte polêmica na França. Em 2016, após vários episódios de violência entre veranistas, o maiô muçulmano chegou a ser proibido em algumas cidades litorâneas dirigidas por prefeitos conservadores.

Na época, o uso do traje de banho chegou a ser criticado pelo então primeiro-ministro Manuel Valls. Ele defendeu a proibição e afirmou que os burquínis não eram "compatíveis com os valores da França e da República”.

Em 2019, militantes feministas realizaram um protesto em uma piscina no 11° distrito de Paris em defesa do burquíni, apoiando o coletivo Piscine Pour Toutes (piscina para todas). Elas exigiram que o uso do traje fosse liberado, classificando a proibição do maiô muçulmano nas piscinas da capital como "islamofobia". "Nossos corpos nos pertencem, nós os cobrimos ou descobrimos por motivos que não interessam a ninguém", afirmaram em um comunicado divulgado na época.

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