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Saúde em dia

Na França, cientista brasileira ajuda a decifrar o papel do microbiota no tratamento do câncer

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A oncologista baiana Carolina Alves Costa Silva integra há cinco anos uma equipe do instituto francês Gustave Roussy, um dos maiores centros de combate ao câncer do mundo, situado em Villejuif, perto de Paris.

A oncologista brasileira Carolina Alves Costa Silva, que atua cinco anos atua como pesquisadora no instituto francês Gustave Roussy, um dos maiores centros de combate ao câncer do mundo
A oncologista brasileira Carolina Alves Costa Silva, que atua cinco anos atua como pesquisadora no instituto francês Gustave Roussy, um dos maiores centros de combate ao câncer do mundo © Taíssa Stivanin/RFI
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Taíssa Stivanin, da RFI

A cientista brasileira trabalha em um dos inúmeros laboratórios do instituto francês, pioneiro no estudo da ação do microbiota na imunidade e no chamado "processo saúde-doença". De acordo com esse conceito, o estado de saúde de uma pessoa pode ser influenciado por vários fatores, que podem ser biológicos, econômicos, sociais e culturais.

O microbiota humano é formado por vários micróbios (incluindo bactérias, vírus e fungos) que moram no nosso corpo, principalmente no intestino. Em um dos projetos, a pesquisadora busca entender a influência dele na resposta aos tratamentos contra o câncer, e, a longo prazo, como pode se tornar um aliado no tratamento e na prevenção da doença. 

“Há evidências de que essas bactérias e outros micro-organismos podem atuar na diminuição da resposta imune e impedir que alguns tipos de tratamento contra o câncer funcionem bem”, explica.

Inicialmente, os cientistas mostraram que os antibióticos modificam a composição do microbiota. “O uso antes do tratamento afeta negativamente a eficácia da imunoterapia, mesmo quando outros fatores de risco são considerados”, explica a pesquisadora brasileira. A imunoterapia, um dos tratamentos contra o câncer que surgiu há alguns anos, visa reativar células imunes que vão reconhecer o câncer e combater a doença.

Sequenciando o DNA das bactérias

Para investigar a composicão do microbiota, a equipe sequenciou o DNA das bactérias presentes nas amostras fecais dos pacientes com câncer incluídos no estudo conhecido como Oncobiotics, realizado no instituto francês. “Percebemos que os pacientes que respondiam bem aos tratamento contra o câncer, principalmente à imunoterapia, têm bactérias diferentes daqueles que não se beneficiam do tratamento”, diz Carolina.

Esses pacientes têm um desequilíbrio na composição do microbiota, chamado de disbiose. De acordo com ela, a disbiose, ou desequilíbrio do microbiota, influencia negativamente a resposta imune, suprimindo a chamada resposta antitumoral. 

“Em um estudo recente publicado na revista Science, mostramos que a disbiose leva ao êxodo de células imunossupressoras que vem do intestino, e mais especificamente dos gânglios e linfonodos, em direção ao tumor”, detalha. Os linfonodos são pequenas estruturas que fazem parte do nosso sistema imune e responsáveis por filtrar as substâncias que viajam pelo sistema linfático.

No futuro, a modulação do microbiota pode ajudar a prevenir o câncer

A pesquisa engloba pacientes com diversos tipos de cânceres, como o colorretal, do rim, da próstata, da mama e melanoma, de diversas regiões da França, mas também de outros países que colaboram com o estudo, como o Canadá. “É importante ter uma população diversificada para que possamos entender o funcionamento geral e em cada subtipo de câncer e geografia”, ressalta a oncologista brasileira.

O desafio atual dos pesquisadores é validar o que chamam de “assinatura” das bactérias nocivas, capazes de prejudicar a resposta ao tratamento contra o câncer. Desta forma, diz Carolina, será possível desenvolver um teste diagnóstico rápido e acessível, que poderá ser usado facilmente pelos clínicos no dia a dia. Atualmente, o sequenciamento do microbiota com as técnicas existentes é demorado e tem um alto custo.

Outro foco da pesquisa está na prevenção. O objetivo, a longo prazo, seria detectar precocemente o desequilíbrio do microbiota em pessoas sadias, que teriam, teoricamente, maior risco de desenvolver tumores malignos ou outras doenças.

“É possível que essas alterações aconteçam antes da doença aparecer. Estudos recentes mostram que a disbiose é, na verdade, mais geral. Ela não está associada somente ao câncer, mas a outras doenças inflamatórias, como doenças cardiovasculares, intestinais ou obesidade”, observa.

Transplante fecal

Há maneiras de melhorar o microbiota de um paciente que tenha bactérias que podem prejudicar a resposta imunitária? Dados preliminares, diz a cientista, mostraram que o transplante de fezes é uma estratégia promissora para melhorar a resposta à imunoterapia.  As fezes, doadas por pessoas saudáveis, sem patologias conhecidas, ou que têm câncer mas responderam bem ao tratamento, são transplantadas no trato digestivo de pacientes resistentes aos tratamentos.

A pesquisadora lembra que muitos centros no Brasil estão se interessando pelo estudo do microbiota. Ela está em contato com o instituto AC Camargo e a Universidade de São Paulo para investir em estudos sobre o tema. “Como brasileira, eu quero melhorar a cooperação e criar mais projetos com o Brasil”, conclui. 

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