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Brasil: Descobertas sobre primeiros assentamentos ameríndios podem mudar narrativa arqueológica

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Uma dupla franco-brasileira de pesquisadores publicou um documento que registra uma série de descobertas valiosas sobre os primeiros assentamentos ameríndios no Brasil. Antoine Lourdeau, pesquisador especializado em pré-história sul-americana e Lucas Bueno, pesquisador da UFSC com especialização em arqueologia brasileira, assinam a edição número 21 da revista Brésils sobre os primeiros assentamentos humanos em terras brasileiras, com descobertas que remontam a até 30 mil anos.

Antoine Lourdeau, arqueólogo
Antoine Lourdeau, arqueólogo © RFI
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*Para assistir a entrevista na íntegra, clique na imagem acima

"O trabalho do [paleontólogo dinamarquês Peter Wilhelm] Lund é pioneiro no comecinho do século 19, quando a disciplina da pré-história estava sendo construída", lembra Lucas Bueno, pesquisador da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) com especialização em arqueologia brasileira. "Foi quando ele desenvolveu essas pesquisas no Sumidouro (Minas Gerais) mostrando já uma antiguidade bastante significativa para a ocupação das Américas. Isso mostra como as pesquisas no Brasil, naquele momento, poderiam desenvolver um papel significativo na discussão sobre a dispersão do homo sapiens no globo", aponta.

"A gente quis resgatar essa contribuição do Lund e mostrar como desde o começo dessa discussão, em termos acadêmicos, o Brasil poderia – e deveria – ter um papel proeminente nessa disciplina, pensando no contexto sul-americano", explica o especialista.

"Nossa ideia é resgatar esse papel do Brasil [na disciplina]. Temos dados super relevantes, específicos e únicos para o continente, resultado de pesquisas realizadas no Brasil. Por uma série de questões envolvidas na produção de conhecimento acadêmico, como barreiras linguísticas, muitas publicaões acabam sendo pouco divulgadas e aceitas no stablishment acadêmico. Queríamos trazer para o grande público uma série de questões novas", lembra Bueno.

"Desde meados do século 20, uma série de pesquisas realizadas no Nordeste e no Centro-Oeste do Brasil mostram evidências de ocupações anteriores ao último máximo glacial, há mais de 20 mil anos, o que, de uma certa maneira, entra em conflito com a principal proposta hegemônica [da Arqueologia], construída pela academia norte-americana, que propunha uma ocupação não tão antiga para as Américas", sublinha o pesquisador. "No entanto, temos esses sítios [arqueológicos] no Brasil que, há meio século, apresentam origens chegando até a 30 mil anos. Coisas muito anteriores ao que a teoria [acadêmica] mais aceita ainda propõe", afirma.

"Humanidade veio dos Trópicos"

“É importante enfatizar a antiguidade e a profundidade temporal de uma história relacionada aos povos ameríndios, os povos originários das Américas”, destaca Bueno. “Não é de ontem que eles estão aqui. Estão há milhares de anos construindo territórios, paisagens que certamente foram um legado que nos chega até hoje. Essas são questões relativamente novas que estão sendo apresentadas no âmbito dessa discussão. De um lado, a antiguidade dessa ocupação, que tem contribuições que podem rever as propostas e modelos gerais sobre povoamento da América, e, do outro lado, o contexto contemporâneo, que reforça a ligação dos povos ameríndios com a América do Sul e esse lugar que a gente chama de Brasil”, destaca.

Quanto ao caráter político das novas descobertas, Antoine Lourdeau diz que “na visão clássica da nossa disciplina, o que foi chamado de ‘pré-história’ foi definido a partir dos padrões europeus”. “Existem percepções que são ligadas a essa visão europeia, como a questão dos ritmos dos ciclos glaciais e o fato das populações terem passado por momentos de frio extremos. Isso, num ambiente tropical, não tem o mesmo significado. Esses ciclos de aquecimento e resfrio existiram nos trópicos como no resto do mundo, mas, por exemplo, não tiveram as mesmas consequências”, explica.

"É preciso repensar esse passado remoto não mais somente usando as referenciais europeias, mas trazendo elementos vindos dos trópicos, que são muito interessantes para repensar a nossa trajetória humana. No final, viemos todos dos trópicos. O início da Humanidade, seja na África, seja na Ásia, a maioria das espécies de hominídeos surgiram em ambientes tropicais”, detalha o pesquisador francês.

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