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Governo colombiano deve se desmilitarizar para saída democrática da crise, diz membro da União Patriótica

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O governo colombiano e representantes do Comitê Nacional de Greve voltam a negociar nesta quinta-feira (20) para tentar encontrar uma saída para a tensão social que sacode o país há pelo menos três semanas. Além de atender as demandas de diferentes segmentos da sociedade, o presidente Iván Duque deve “desmilitarizar” as cidades e as áreas rurais do país parar avançar na solução da crise, segundo Pietro Alarcón professor da Faculdade de Direito da PUC-SP e membro da Direção nacional União Patriótica da Colômbia.

Pietro Alarcón é professor de Direito da PUC-SP e membro da Direção Nacional do partido União Patriótica.
Pietro Alarcón é professor de Direito da PUC-SP e membro da Direção Nacional do partido União Patriótica. © Arquivo Pessoal
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A crise atual foi desencadeada por um projeto de reforma fiscal que previa alta de impostos. A proposta foi retirada e o ministro da pasta demitido, mas não foi o suficiente para conter a revolta de milhares de colombianos que foram às ruas manifestar o descontentamento com o governo.

“Há uma crise estrutural que já se alastrava antes da pandemia, mas que se agravou com a crise sanitária”, diz Alarcón lembrando dos protestos de novembro de 2019. Na ocasião, várias categorias de trabalhadores e segmentos da população como os grupos indígenas foram às ruas protestar em um contexto de aumento da pobreza e indignação com a situação social e econômica.

“O governo de (Iván) Duque não deu saída às petições de 2019. A crise sanitária abateu a Colômbia, a pobreza aumentou, o desemprego passou de 14% para até 19% e a informalidade passou a ser uma alternativa para muitos colombianos, o que não resolve o problema dos recursos, das garantias e prestações sociais. Há uma deterioração da vida dos colombianos e colombianas, isso em meio a uma crise sanitária”, acrescenta.

Reprimidos com violência, os protestos já deixaram, segundo estimativas, pelo menos 45 mortos, e centenas de pessoas estão desaparecidas, o que agravou o cenário de insatisfação com a ação governamental e gerou protestos da comunidade internacional.

“Houve um incremento da presença da força militar nas regiões contra indígenas, camponeses, que começaram a ser assassinados. Essa é uma prática antiga na Colômbia, não é o primeiro período em que lideranças sociais são vítimas de planos sistemáticos de aniquilição física”, afirma.  

“O tratamento que foi dado pelo Estado, que deveria ser de diálogo, de atenção ao que o povo reclama, foi de militarizar as cidades”, diz, criticando o chefe de Estado pelo impulso que deu à estratégia de repressão e por ter se referido  aos participantes das manifestações de “vândalos, terroristas, de atentar contra o Estado, de semear o caos” pra justificar a “estigmação e a perseguição violenta contra o povo”.

Pressão internacional

Para o professor da PUC-SP, houve claras ações que violaram os direitos humanos e que chamaram a atenção da comunidade internacional, com a  Câmara de Representantes dos Estados Unidos, a União Europeia e a ONU emitindo pedidos de moderação na ação contra os manifestantes.

Para Alarcón, membro da Direção Nacional da União Patriótica, partido de esquerda fundado em meados dos anos 1980, o presidente Duque continua com seu processo de militarização de diversas regiões do país, o que cria obstáculo para uma saída para a crise.

“Se não houver desmilitarização não há condições de iniciar um diálogo. É difícil criar uma agenda de discussão se as forças públicas e o ESMAD continuarem com esse conjunto de arbitrariedade e violação de direitos humanos nas cidades e nos campos da Colômbia”, diz em referência ao Exército e ao Esquadrão Mível Anti-distúrbio.  “Se o governo se desmilitariza, seria um passo fundamental para dar um respiro aos colombianos e colombianas e iniciar um diálogo para uma saída democrática à crise”, garante

“A desmilitarização é um fator fundamental, que entorpece a possibilidade de iniciar uma negociação”, afirma, dizendo esperar que a pressão internacional force o governo a usar menos a força e a violência contra os cidadãos. “O governo dá as costas para atendar as reivindicações da sociedade colombiana e a cara que mostra é a da militarização”, insiste.

Falta de plano nacional

Além da retirada da polêmica reforma tributária, considerada o estopim da recente revolta popular, o governo colombiano atendeu outras demandas, como a gratuidade para o acesso às universidades para as famílias mais modestas, e recuou de uma reforma do sistema de saúde, considerado pela oposição como prejudicial às camadas mais pobres.

“Nada do que o governo vem fazendo é gratuitamente. O governo vem tentando atender demandas de maneira parcelada. O governo Duque não quer uma negociação conjunta com o Comitê Nacional de Greve”, denuncia Alarcón.

Para ele, além da desmilitarização das cidades e do campo, uma saída para a crise depende também de uma reorientação dos gastos públicos, com mais investimentos na saúde e educação, e maior o reconhecimento da autonomia dos indígenas e atendimento às necessidades dos jovens.  

“O governo Duque não tem um plano nacional nem um projeto de país capaz de gerar uma expectativa favorável à superação da crise. Esse é o problema real que ocasiona os protestos legítimos e o descontentamento”, conclui.

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