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Reportagem

Aprovação de pacote de medidas de Milei na Argentina preocupa comunidade brasileira no país

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Com 144 votos a favor e 109 contra, a Câmara de Deputados da Argentina aprovou, em geral, o pacote de leis básicas do governo do presidente Javier Milei, no começo da noite desta sexta-feira (2). Antes de o texto seguir para o Senado, os deputados precisam ainda aprovar cada artigo em particular a partir da próxima terça-feira (6). Ao longo da noite, manifestantes e forças de segurança mantiveram violentos confrontos.

Manifestantes protestam contra pacote de leis de Javier Milei, em Buenos Aires, na Argentina, 2 de fevereiro de 2024.
Manifestantes protestam contra pacote de leis de Javier Milei, em Buenos Aires, na Argentina, 2 de fevereiro de 2024. © Márcio Resende/RFI
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Márcio Resende, correspondente da RFI em Buenos Aires

Após três dias de intensos debates, o pacote com o qual o presidente Javier Milei pretende modernizar o Estado e desregulamentar a economia foi aprovado. Com isso, aumenta a apreensão da comunidade brasileira na Argentina com as mudanças que podem afetar milhares de estudantes brasileiros.

Pouco depois, do lado de fora do Congresso, organizações sociais e grupos políticos de esquerda, contrários ao governo, mantiveram violentos confrontos com as forças de segurança.

Os manifestantes atearam fogo em cestas de lixo, quebraram calçadas e vandalizaram uma filial do banco Patagonia, controlado pelo Banco do Brasil na Argentina. Treze pessoas foram presas.

As forças de segurança (Polícia do Exército, Polícia Federal e membros da Guarda Costeira) responderam com gás pimenta e balas de borracha. Nos confrontos, três agentes ficaram feridos, assim como dezenas de manifestantes e jornalistas.

Os manifestantes tentaram bloquear as ruas ao redor do Parlamento, mas o novo protocolo de segurança, em vigor desde o final de dezembro, proíbe a interrupção do trânsito e só permite os protestos em praças, esplanadas e calçadas.

Apreensão dos brasileiros

Na praça do Congresso, logo após a aprovação e antes do enfrentamento, o brasileiro Paulo Pereira, um referente da comunidade na Argentina, descreveu à RFI a “apreensão e o medo” que existe com as novas leis, principalmente entre os cerca de 11 mil universitários brasileiros no país.

“A gente tem acompanhado com medo e com apreensão o que tem acontecido na Argentina e como isso pode refletir na vida dos brasileiros. A gente sabe que esse projeto de lei propõe não só que as universidades deixem de ser públicas, mas também contempla a possibilidade de poderem cobrar mensalidades de estudantes estrangeiros. Isso afeta diretamente a comunidade brasileira”, aponta Paulo Pereira.

Atualmente, os estrangeiros na Argentina usufruem do ensino gratuito nas universidades públicas. Pelas novas medidas do presidente Milei, as instituições de ensino superior públicas podem começar a cobrar mensalidades dos estrangeiros que não tiverem residência. Nesse universo, os brasileiros são destaque, principalmente no curso de Medicina.

“Não sabemos ainda como será a aplicação dessa cobrança. Não sabemos como vai funcionar, mas sabemos que afetaria diretamente a comunidade brasileira”, afirma Paulo.

Por outro lado, as medidas do novo governo na economia, principalmente através da liberação irrestrita de preços, têm diminuído velozmente o poder aquisitivo dos estudantes brasileiros, na sua grande maioria dependentes dos pais.

“Temos sentido um aumento muito forte da inflação. A qualidade de vida do brasileiro aqui, que costumava se aproveitar de uma relação custo-benefício muito boa no câmbio, pode ter acabado ou pode mudar bastante. A partir da aprovação dessa lei, a realidade da comunidade brasileira será diferente”, prevê Paulo Pereira.

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Pacote diluído

Dos 664 artigos iniciais no pacote de leis, apenas a metade continua de pé. São agora 363 artigos que ainda podem ser modificados porque, a partir de terça-feira, começa a discussão de cada artigo em particular.

Os pontos mais resistidos pela oposição são as privatizações de estatais, a possibilidade de o governo emitir dívida externa sem a aprovação do Congresso e a concessão de “superpoderes” do Legislativo ao Executivo.

A concessão de superpoderes não é uma novidade na Argentina. Antes de Milei, o Congresso tinha transferido superpoderes aos ex-presidentes peronistas Néstor Kirchner (2003-2007), Cristina Kirchner (2007-2015) e Alberto Fernández (2019-2023).

Essa resistência a Javier Milei fez com que a sessão em torno do mega pacote entrasse para a história como a mais prolongada do Congresso argentino. Até agora, foram 31 horas acumuladas de debate durante três dias.

Limitações

Para governar sem precisar do Congresso, o governo queria liberdade de ação em 11 áreas. Aceitou diminuir a seis, mas a oposição ainda resiste em algumas matérias como Tarifas públicas e Segurança. Além disso, a pretensão do governo de um prazo de dois anos, renováveis por outros dois, para os “superpoderes” precisou ser cortado pela metade: um ano, renovável por mais um.

Para aumentar as chances de que o pacote de leis fosse aprovado, o governo retirou capítulos inteiros como o Fiscal e Econômico, que aumentava impostos e o Político, que alterava as regras eleitorais.

O presidente Javier Milei queria privatizar 41 estatais, com foco na petrolífera YPF, na companhia aérea Aerolíneas Argentinas e no Correio Argentino. Da lista, a petrolífera já foi retirada e outras três estatais estratégicas só poderão ser privatizadas parcialmente. O número de privatizáveis é agora de 27.

Durante o fim de semana, as negociações serão frenéticas. Dessas negociações, depende que o pacote de Milei preserve a sua essência ou termine ainda mais desidratado.

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