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Reportagem

Desmotivados para o 2° turno, jovens franceses se dividem entre bloqueio da extrema direita e abstenção

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Eles têm menos de 30 anos e representam o futuro da França, segundo os próprios candidatos à presidência. No entanto, não escondem a decepção com os partidos políticos tradicionais e podem novamente protagonizar uma grande abstenção nas urnas no próximo domingo (24). Outros pretendem atender à convocação de barrar a extrema direita e votar no presidente Emmanuel Macron, mesmo insatisfeitos com o seu governo. A RFI saiu às ruas de Paris para ouvir a opinião e a expectativa de jovens eleitores.

Eleitores abaixo dos 34 anos votaram em peso para o candidato da esquerda radical Jean-Luc Mélenchon no primeiro turno da eleição presidencial da França, em 10 de abril de 2022.
Eleitores abaixo dos 34 anos votaram em peso para o candidato da esquerda radical Jean-Luc Mélenchon no primeiro turno da eleição presidencial da França, em 10 de abril de 2022. AP - Bob Edme
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Daniella Franco, da RFI

Mais de 40% dos eleitores franceses com menos de 34 anos não votaram no primeiro turno da eleição presidencial francesa, no dia 10 de abril - a faixa etária com maior taxa de abstenção no pleito. No segundo turno, o fenômeno pode se repetir, principalmente porque o candidato preferido da juventude francesa, Jean-Luc Mélenchon, do partido da esquerda radical França Insubmissa, está fora da disputa.

Mélenchon obteve o terceiro lugar no primeiro turno, com 21,95% dos votos, ficando por pouco atrás de Marine Le Pen, que conseguiu 23,15%. Se dependesse dos jovens, Mélenchon teria desbancado até mesmo o presidente-candidato Emmanuel Macron (27,84%) e ficado em primeiro lugar. Na faixa etária de 18 a 24 anos, o candidato da esquerda radical obteve 31% dos votos; 34% entre os eleitores de 25 a 34 anos.

Mas como será que os jovens votarão no segundo turno? Poucos são os que irão às urnas por convicção. As opiniões se dividem entre o voto útil, para barrar a extrema direita, e a abstenção, já que na França o voto não é obrigatório.

É o caso de Meissa, de 19 anos, apostou em Mélenchon no primeiro turno e diz que a decepção com o resultado foi tão grande, que já decidiu se abster no domingo.

“Na minha opinião, Macron está afundando a França, foi isso o que vimos nos últimos anos. E eu não gosto do programa da Marine Le Pen, ela é muito extremista. As pessoas dizem que vão votar no candidato ‘menos pior’, mas para mim não tem condições. Eu não quero nenhum dos dois como presidente e prefiro nem votar”, diz.

Ao lado dela, a amiga Nawelle discorda desta atitude. A estudante se diz insatisfeita com o resultado do primeiro turno e atribui a responsabilidade aos abstencionistas.

“O voto deveria ser de interesse de todos. Mas os jovens na França não se implicam na política, pensam ser uma preocupação apenas das pessoas mais velhas. E é o contrário, escolher seu representante tem um forte impacto na sociedade”, afirma Nawelle, que apostou em Mélenchon no primeiro turno e vai votar em Macron “para evitar Marine Le Pen”.

Hazir, de 21 anos, também não esconde a decepção por Mélenchon não ter passado para o segundo turno. Por isso, a motivação para votar no domingo, não é das maiores.

“Quando eu vi os resultados do primeiro turno, não me animei a votar no segundo. Não queria dar meu voto para Macron, e muito menos para Le Pen. Mas, nos últimos dias, tenho acompanhado as discussões nas redes sociais e estou pensando em votar no Macron, porque ter uma presidente de extrema direita é inaceitável", diz.

William, 22 anos: "Tenho medo do que pode acontecer conosco se Marine Le Pen chegar ao poder".
William, 22 anos: "Tenho medo do que pode acontecer conosco se Marine Le Pen chegar ao poder". © Daniella Franco/RFI

Contra a extrema direita

Apesar de lamentar a derrota de Mélenchon, para William, de 22 anos, não há dilema. Segundo ele, o principal objetivo agora é impedir que Marine Le Pen seja a próxima presidente da França.

"É importante ir votar para que a extrema direita não vença, especialmente para mim, que sou minoria. Tenho medo do que pode acontecer conosco se Marine Le Pen chegar ao poder. Por isso é necessário nos mobilizarmos e votarmos no Macron, mesmo sem estar de acordo com seu programa e insatisfeito com o seu governo", explica o jovem negro.

O discurso é o mesmo de Margaux, de 28 anos, que escolheu o candidato ecologista Yannick Jadot no primeiro turno e vai votar no “menos pior” no próximo domingo.

“Pelo menos Macron respeita o Estado de direito e vai preservar as instituições, o que não é o caso de Marine Le Pen. Então, eu prefiro manter o status quo do que ir em direção a um sistema antidemocrático”, justifica.

Por outro lado, Margaux faz duras críticas à campanha e à atitude dos candidatos que passaram para o segundo turno. “A maioria das pessoas do meu círculo irão às urnas no domingo, mas o problema é que elas não se sentem representadas. Achamos que a campanha foi de baixo nível, teve muita polêmica sobre imigração e acabamos não falando sobre ecologia, por exemplo, uma grande preocupação nossa”, aponta.

Voto por convicção

Mas nem todos os jovens lidam com o dilema do voto útil. Viken, de 20 anos, apostou no conservador Jean Lassalle no primeiro turno e, no próximo domingo, vai votar em Macron por convicção.

“Eu sei que tem muita gente chateada de ter que fazer isso para barrar a Le Pen, mas eu quero votar no Macron por convicção. Ele não prejudicou muito a minha família, então, tudo bem”, avalia.

No entanto, o estudante lamenta que os candidatos, em geral, não tenham conseguido conversar com os jovens. Para ele, isso justifica a abstenção entre os menores de 34 anos.

"Eu não deixei de ir votar no primeiro turno, mas compreendo quem tomou essa decisão. Acredito que os jovens não foram suficientemente mobilizados ou levados em consideração. Apenas Mélenchon conversou com os jovens, os outros candidatos deixaram a juventude de lado”, aponta.

Viken, 20 anos: "Apenas Mélenchon conversou com os jovens, os outros candidatos deixaram a juventude de lado".
Viken, 20 anos: "Apenas Mélenchon conversou com os jovens, os outros candidatos deixaram a juventude de lado". © Daniella Franco/RFI

A falta de interesse dos candidatos pelos jovens repercute nas novas gerações. As amigas Inaya, de 17 anos, Ingrid e Christelle, ambas de 15 anos, ainda não têm idade para votar. Mas, para elas, ir às urnas "não serve para nada". 

"Nos bairros populares de Paris e em outras grandes cidades como Marselha, Toulouse, Lille, foi Mélenchon quem venceu, mas ele foi eliminado no primeiro turno. E isso não é justo. Nós, por exemplo, queríamos que Mélenchon ganhasse. Mas pouco importa o que pensamos. Os presidentes não estão nem aí para a gente. Eles fazem o que bem entendem e fim", afirma Inaya, citando como exemplo o projeto de Marine Le Pen de proibir o véu no espaço público. "Se ela ganhar, meu Deus! Estou ferrada! Vai ser o fim para mim", diz ela apontando para seu hijab.

Já Ingrid expressa sua revolta com a escolha de Macron pela maioria dos franceses. "Eu realmente não entendo. Tinha tanta gente reclamando dele, dizendo que seu governo nos maltratou, etc, mas no final, vamos acabar com mais cinco anos da mesma coisa. Se eu pudesse votar, sinceramente, não iria às urnas no segundo turno", afirma.

Da esquerda para a direita: Inaya, Ingrid e Christelle ainda não têm idade para votar, mas gostariam que Mélenchon se elegesse presidente da França.
Da esquerda para a direita: Inaya, Ingrid e Christelle ainda não têm idade para votar, mas gostariam que Mélenchon se elegesse presidente da França. © Daniella Franco/RFI

Diabolização da extrema direita

Para Mayeul, de 27 anos, se abster no próximo domingo é impensável. Ele apostou no ultraconservador Eric Zemmour no último 10 de abril e vai votar em Marine Le Pen no segundo turno. No entanto, ele discorda em classificar seu posicionamento como extrema direita, preferindo o termo "patriota".

“Acredito que, como eu, há muitas pessoas que são contra essa atual política de imigração, que abre as portas para mais estrangeiros e não se concentra naqueles que já estão aqui e que talvez estejam passando por dificuldades. Mas as mídias impõem a necessidade de ajudar todo mundo, o que é uma coisa boa, mas não é possível”, pontua.

Mayeul não poupa críticas à imprensa francesa, a quem atribui a manipulação dos eleitores e a diabolização de Zemmour e Le Pen. Para ele, o mutirão da frente republicana para evitar o voto na extrema direita é “uma besteira”.

“Essa barragem é algo que já vimos há cinco anos e não me surpreende que isso volte a ocorrer. As pessoas não se dão nem ao trabalho de ler os programas dos candidatos. Os franceses agem frequentemente como se fossem gado, porque alguém ou as mídias lhes disseram para fazer isso ou aquilo. Eles não querem perder tempo conhecendo as propostas. Mas, para mim, isso não é perda de tempo. Eu penso que se soubermos votar, podemos evitar cinco anos de sofrimento”, defende.

86% dos eleitores sabem em quem votarão

Por enquanto, todas as pesquisas de intenção de voto continuam apontando para a reeleição de Macron.

Mais de 70% dos eleitores afirmam que irão votar no domingo, entre os quais 86% já fizeram sua escolha. No entanto, especialistas são céticos sobre a participação dos jovens e apostam em uma alta abstenção entre os eleitores com menos de 30 anos no próximo domingo. 

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