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Rendez-vous cultural

Brasileiros levam dramas sociais e ambientais ao Festival de Cinema de Biarritz

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A paisagem não está de cinema. O mau tempo não tem facilitado a vida dos convidados do Festival de Cinema Latino-Americano de Biarritz, que até domingo (2) movimenta o balneário do litoral sudoeste da França. Banhada pelo oceano Atlântico, a cidade fica a menos de 25 quilômetros da fronteira com a Espanha e todos os anos recebe os fãs da sétima arte para uma semana intensa de programação cultural. 

O Cassino Municipal é um dos locais da programação do Festival de Cinema Latino-Americano de Biarritz. Apesar da chuva, o público lota as exibições dos filmes concorrentes e da mostra Focus Brésil.
O Cassino Municipal é um dos locais da programação do Festival de Cinema Latino-Americano de Biarritz. Apesar da chuva, o público lota as exibições dos filmes concorrentes e da mostra Focus Brésil. © Maria Paula Carvalho
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Maria Paula Carvalho, enviada especial da RFI a Biarritz

Biarritz está localizada no departamento dos Pirineus Atlânticos, na região da Nova Aquitânea. Com seus quatro quilômetros de praias, é um importante destino de surfe na França. No passado, este já foi um porto baleeiro e se tornou um local de veraneio da realeza europeia, no século 19. Era aqui que Napoleão III e a Imperatriz Eugênia vinham passar férias. No início do século 20, viveu a agitação da Belle Époque. E há 31 anos, é um ponto de encontro cultural entre Europa e América Latina. 

Como tradicionalmente acontece, o Cassino Municipal, a Gare du Midi (antiga estação de trem) e todos os cinemas da cidade ficam lotados. Nesta edição, o festival reúne produções de 11 países latino-americanos, incluindo o Brasil, que concorre em três categorias. 

O longa-metragem Tinnitus, de Gregorio Graziosi, é o único representante nacional entre dez filmes selecionados para a mostra competitiva de ficção. 

Já a paulistana Aline Lata participa na categoria documentário com “O Lugar mais seguro do mundo”.  O filme trata do rompimento da barragem de Mariana, um dos maiores desastres da mineração brasileira.

“Contar essa história aqui é muito importante porque a mineração não está restrita a apenas um lugar. A mineração esta em todos os países, nos objetos que a gente usa, e o filme fala das consequências dessa exploração só pelo lucro, sem pensar em sustentabilidade. Precisamos refletir sobre isso e sobre o nosso consumo”, explica a diretora, em entrevista à RFI Brasil.

No curta “Fantasma Neon”, Leonardo Martinelli, outro brasileiro em competição, explora as relações de trabalho no Brasil. O musical, vencedor do Leopardo de Ouro de curta-metragem no 74º Festival de Locarno e de quatro Kikitos no Festival de Gramado, conta a história de João, um entregador de aplicativo ciclista que sonha em ter uma moto.

"O personagem é uma mistura de vários relatos de entregadores que eu conheci durante o periodo do roteiro", diz o cineasta, que está em Biarritz pela primeira vez. “Eu tive outro filme selecioando no Festival de Biarritz, em 2020, mas não pude vir por causa da pandemia”, completa. “Estou conhecendo a cidade pela primeira vez, é um lugar lindo. E é um festival que eu acho muito bonito por ter um foco no cinema latino-americano dentro da Europa, trazendo novos cineastas e novas perspectivas. Eu estou muito contente de poder participar”, comemora. 

O cineasta carioca Leonardo Martinelli disputa o prêmio de melhor curta-metragem do Festival de Cinema Latino-Americano de Biarritz com o musical "O Fantasma Neon".
O cineasta carioca Leonardo Martinelli disputa o prêmio de melhor curta-metragem do Festival de Cinema Latino-Americano de Biarritz com o musical "O Fantasma Neon". © Maria Paula Carvalho

“Para qualquer realizador hoje no Brasil, é uma luta obter fundos para conseguir realizar seus trabalhos. Ao mesmo tempo, eu acho que o Brasil sempre é muito vibrante e rico nas histórias e narrativas que a gente pode contar. Então, ao mesmo tempo que pode haver dificuldades para realizar, eu acho que há muita vontade por parte da gente também”, destaca o jovem cineasta carioca. 

Literatura em destaque

O festival de Cinema de Biarritz também abriu espaço para a literatura brasileira. A romancista, dramaturga e roteirista Patrícia Melo é uma das atrações, ao lado de nomes como o escritor cubano Leonardo Padura. Considerada uma das figuras emblemáticas da literatura contemporânea, ela lotou o Salão dos Embaixadores, no Cassino de Biarritz. Em seus romances, a autora retrata a realidade da violência social no Brasil. 

“Eu sempre tive muita dificuldade de pensar que a arte tem uma função social. Eu acho que arte é arte e independe de qualquer coisa. Mas, vivendo no Brasil nesse momento histórico, eu sinto que é quase uma obrigação moral e a literatura é, sim, um espaço de resistência para você, no mínimo, denunciar essas situações e fazer com que elas sejam discutidas e debatidas”, diz.

A autora, que mora na Suíça desde 2010, costuma se referir aos seus livros como ficção urbana. Em “Menos que um”, seu último trabalho (2022), Patricia Melo faz uso de um texto provocador para denunciar a apatia e indiferença que marcam a sociedade brasileira diante do descaso com a desigualdade. “Quando eu penso no Brasil de hoje, eu me sinto deprimida, porque a gente sempre teve esse desejo de um Brasil grande, um Brasil do futuro, que nunca aconteceu”, conclui.

A escritora Patricia Melo foi uma das convidadas do Festival de Cinema Latino-Americano de Biarritz, que aconteceu de 26 de setembro a 2 de outubro. Ela falou de seus romances no Salão dos Embaixadores, no Cassino Municipal. Patrícia Melo é uma das autoras brasileiras contemporâneas de maior visibilidade no exterior, com seus livros traduzidos em várias línguas.
A escritora Patricia Melo foi uma das convidadas do Festival de Cinema Latino-Americano de Biarritz, que aconteceu de 26 de setembro a 2 de outubro. Ela falou de seus romances no Salão dos Embaixadores, no Cassino Municipal. Patrícia Melo é uma das autoras brasileiras contemporâneas de maior visibilidade no exterior, com seus livros traduzidos em várias línguas. © Maria Paula Carvalho

Azymuth: 50 anos de música

Além de cinema e literatura, tem música no festival de Biarritz. A grande atração deste ano foi o trio de jazz-funk brasileiro Azymuth, que tem admiradores no mundo inteiro. O grupo comemora 50 anos de carreira com uma turnê pela Europa, como conta o tecladista Kiko Continentino. “Isso é formidável, né? 50 anos, que banda! Com quase 40 discos lançados originais por várias gravadoras, em vários continentes. A gente tinha que estar aqui neste festival da América Latina”, diz. 

A cerimônia de premiação dos filmes vencedores do Festival de Cinema Latino-Americano de Biarritz acontece na noite deste sábado (1°) e no domingo serão exibidos alguns dos títulos premiados. 

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