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Planeta Verde

Estudo aponta risco para Cerrado e Pantanal com adoção pela UE de definição de florestas da FAO

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Estudo lançado na terça-feira (3) pelo MapBiomas - uma rede de ONGs, universidades e start-ups que estuda a transformação ambiental no território brasileiro - faz um alerta sobre a possível adoção pela União Europeia (EU) da definição de florestas usada pela FAO, a Agência da ONU para a Agricultura, para evitar a importação de produtos que causam desmatamento. Caso esse conceito seja adotado, 3 milhões de quilômetros quadrados de vegetação nativa ficariam desprotegidos.

Paisagem típica do cerrado, na Serra dos Pirineus, em Goiás. O bioma está entre os que podem ser ameaçados pelo desmatamento.
Paisagem típica do cerrado, na Serra dos Pirineus, em Goiás. O bioma está entre os que podem ser ameaçados pelo desmatamento. © Ana Carolina Peliz
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Ambientalistas temem que essa área equivalente a mais de cinco vezes o tamanho da França seja alvo de desmatamento para agricultura e pecuária. “O estudo avaliou o quanto de ecossistemas da América do Sul ficariam protegidos com o escopo da lei europeia, que é a definição de floresta da FAO, explica Jean-François Timmers, da WWF Brasil, co-autor do estudo. 

De acordo com a definição da agência, uma floresta é um terreno cujo índice de densidade da cobertura arbórea é superior a 10 % e que tem superfície maior que 0,5 hectares. As árvores devem atingir uma altura mínima de 5 metros quando maduras. "Mas há muitos ecossistemas que não estão dentro dessa categoria e que têm um amplo valor biológico e também são muito ameaçados pela expansão da agricultura e da produção de commodities”, alerta.

O especialista mostra que nem sempre é possível pensar em “classificações fechadas”, quando falamos da natureza, pois “há muitos ambientes intermediários”. Em geral, “você tem transições entre os diversos ecossistemas que dificultam esse limite do que é floresta ou não”, diz Timmers. “Outra coisa importante, é que esses ecossistemas dependem um do outro. Não há um valor maior para um ecossistema porque ele tem árvores maiores, já que você pode ter um ecossistema baixo, mas com uma grande riqueza de plantas, como orquídeas e plantas endêmicas, além de fauna endêmica”, acrescenta.

É o caso do pantanal, um patrimônio da Humanidade, lar de jacarés, onças e jaburus, que tem apenas 24% de sua área coberta por florestas que atendem à definição da FAO.

O assunto ganha relevância diante do desafio climático e de uma crise sem precedentes de extinção de espécies. Evitar a expansão do desmatamento sobre os ecossistemas restantes no planeta deveria ser uma prioridade.

Uma onça-pintada perto de uma área queimada por incêndios florestais no Parque Encontro das Águas no Pantanal, próximo a Pocone, MT.
Uma onça-pintada perto de uma área queimada por incêndios florestais no Parque Encontro das Águas no Pantanal, próximo a Pocone, MT. AP - Andre Penner

Iniciativa da EU é um primeiro passo

Ainda que a iniciativa europeia seja um avanço para evitar a entrada no bloco de produtos oriundos do desmatamento, os esforços ainda não são suficientes, explica Tasso Azevedo, coordenador-geral do MapBiomas. “Nesse estudo, nós pegamos os sete principais biomas da América do Sul, Amazônia, Cerrado, Chaco, Pantanal, Pampa, Mata Atlântica e Caatinga e, para cada um deles, aplicamos qual seria a área protegida do bioma, para que não houvesse desmatamento, ou os produtos não entrariam na Europa”, explica. “E vimos que cerca de 30% desses sete principais biomas não seriam protegidas. Ou seja, se houvesse desmatamento nessa área que não entra na definição da FAO, não haveria problema para os produtos entrarem na Europa. Essa é a questão central”, alerta.

De acordo com Tasso Azevedo, 16% da Amazônia ficaria de fora das ações de proteção; 25% do Chaco, 70% do Pampa, do Pantanal e do Cerrado. Já no caso da Caatinga, mais de 90% não teriam qualquer proteção.

A solução, explicam os ambientalistas, seria considerar todos os ecossistemas naturais remanescentes e que já são bem mapeados. “Muitas vezes, quando se fala do Brasil no exterior se pensa na Amazônia. E ela é realmente um grande desafio global de conservação. Mas você tem o Cerrado, o Pampa, o Pantanal e a Caatinga que são ecossistemas muito valiosos e que não estão no radar”, reforça Jean-François Timmers.

Expandir a agricultura sem desmatar

Além das florestas, esses outros biomas, incluindo campos naturais e as savanas, também estocam muito carbono. Porém, diferentemente das florestas, o acúmulo de carbono se dá abaixo da terra. Para um dos autores do estudo, o desafio atual é inspirar o setor econômico a ter um compromisso com a eliminação do desmatamento nas cadeias produtivas.

“Até hoje, não existe na Europa uma restrição legal sobre a importação de produtos oriundos de desmatamento. A legislação europeia em discussão introduz uma inovação muito importante de você criar uma demanda de mercado para fazer expansão agrícola sem desmatar”, explica Timmers. “E existe possibilidade para isso. No Cerrado, uma terra apta a expansão de soja, dá para duplicar ou triplicar a produção sem cortar uma árvore”, destaca.

Fronteira entre o cerrado e plantações agrícolas em Formosa do Rio Preto, na Bahia.
Fronteira entre o cerrado e plantações agrícolas em Formosa do Rio Preto, na Bahia. AFP/Archivos

A legislação proposta pela EU, ele explica, “cria um precedente para que o sistema alimentar global, aos poucos, possa se tornar sustentável, se diversificar e ser eficiente sem destruir os ecossistemas que sobraram”. No entanto, se não houver uma adaptação das normas, o risco é de haver ainda mais pressão sobre os biomas que não estão contemplados na lei.

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