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Planeta Verde

União Europeia espera aprovar em 2022 lei contra compra de produtos do desmatamento

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A Comissão Europeia deve apresentar para debate e votação neste ano, no Parlamento europeu, um projeto para regulamentar práticas comerciais que envolvem o chamado “desmatamento importado”. O objetivo é que produtos como soja, carne bovina, cacau e outras matérias-primas de áreas desmatadas não possam mais ser vendidos no território europeu.

Nessa imagem ilustrativa, o gado passeia em áreas queimadas e desmatadas perto de Novo Progresso, no estado do Pará.
Nessa imagem ilustrativa, o gado passeia em áreas queimadas e desmatadas perto de Novo Progresso, no estado do Pará. © AP Photo/Andre Penner
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Segundo dados da ONG WWF, a União Europeia teria provocado, em doze anos, a perda de 3,5 milhões de hectares de parcelas florestais ao importar produtos produzidos nessas áreas. A Europa também seria responsável por 16% do desmatamento ligado à produção agrícola do mundo, perdendo apenas para a China, com 24%. A Índia, os Estados Unidos e o Japão respondem, respectivamente, por 9%, 7% e 5%.

A nova legislação permitirá limitar esse fenômeno, além de sensibilizar a população no continente. Uma consulta realizada pela União Europeia mostrou que 81,4% dos europeus consideram que o bloco tem um papel essencial na luta contra o desmatamento.

A França, que está na presidência rotativa da União Europeia desde o dia 1º de janeiro, espera liderar esse combate. “Precisamos de um dispositivo comum e de uma mesma definição do conceito de desmatamento, que possa ser aplicado a todos os produtos", disse. "Precisamos também de uma legislação, para que os critérios sejam similares dentro do mercado europeu, e não haja concorrência entre os diferentes países do bloco. Esse é o dispositivo que será negociado e eu espero que ele seja adotado em nível europeu ”, explicou à RFI  a secretária francesa encarregada da biodiversidade, Bérangère Abba

Vista área de área desmatada no município de Melgaço, no Brasil, em julho de 2020.
Vista área de área desmatada no município de Melgaço, no Brasil, em julho de 2020. AFP Photo/Tarso Sarraf

As organizações de proteção ambiental também pedem que o texto final inclua a lista completa de produtos que contribuem para a destruição do ambiente, como matérias-primas originárias do cerrado ou de áreas úmidas. Outras iniciativas paralelas já foram implantadas para lutar contra o desmatamento importado. 

A ONG  francesa Canopée, com o apoio do Ministério francês da Ecologia, contribuiu à elaboração de uma ferramenta que avalia o risco da destruição da floresta e da conversão dos ecossistemas brasileiros, em função das importações francesas de soja. Isso é possível graças ao cruzamento entre os dados de fluxo logístico fornecidos pelas aduanas e e as informações enviadas por satélite de cada município brasileiro. O risco aparece em função do local e da data das plantações, do produtor, ou do porto de onde partiram as mercadorias.

A ferramenta permite a identificação de empresas e de zonas de produção de risco, que devem ser monitoradas pelas empresas francesas importadoras. A análise dos dados produzidos via satélite mostram, por exemplo, que 273 municípios brasileiros representam 20% da produção de soja e concentram 91% do risco de desmatamento no Brasil. 

Cosechadoras de soja en un campo en Salto do Jacui, en Rio Grande do Sul, Brasil, el 5 de abril de 2021
Cosechadoras de soja en un campo en Salto do Jacui, en Rio Grande do Sul, Brasil, el 5 de abril de 2021 SILVIO AVILA AFP

"Pária internacional"

O professor de geografia das Universidades Federal do Vale do Jequitinhonha e Mucuri, Douglas Sathler, explica que o Brasil poderia ser líder mundial nas discussões sobre mudanças climáticas e no combate ao desmatamento, mas acabou se tornando “pária internacional”.

“A imagem do Brasil na Europa, em relação ao desmatamento e aos produtos do desmatamento, está muito desgastada. A nota recente publicada pela Associação Brasileira dos Produtores de Soja, em relação a essa lei que a Europa pretende aprovar para restringir produtos brasileiros, é puramente ideológica. Ela fala de protecionismo e não representa os interesses do bom agricultor e do potencial que a gente tem”, avalia.

“Parte dos agricultores do Brasil são muito imediatistas, estão surfando na onda do dólar caro, e estão se posicionando de forma a criar problemas sérios para agricultura no Brasil a longo prazo. Mesmo que a gente conseguisse reduzir a taxa de desmatamento, teríamos na mão mais uma burocracia que foi criada, mais um problema para resolver", diz.

"O bom produtor terá maior custo de provar a procedência e a pró-atividade. Então todo esse dano na percepção, que os consumidores europeus ou de outros lugares do mundo têm em relação ao Brasil, infelizmente vai persistir por anos. E mesmo que existam interesses comerciais por trás disso tudo, a gente está colhendo o que plantou”, observa.

Formulário contra desmatamento

A encarregada das florestas tropicais da ONG Canopée, Klervi Le Guenic, explica que, em novembro, a organização disponibilizou um formulário online que permite visualizar as exportações da soja brasileira na França, destinadas à alimentação animal.

“Esses pequenos diagramas ajudam a classificar os principais exportadores e importadores e enxergar o abastecimento ligado a um risco pequeno de desmatamento e o outro relacionado a um alto risco”, explicou.

O dispositivo é proposto às empresas francesas voluntárias. Se a experiência der certo, ela poderá se estender a outros países, como o Brasil, por exemplo, e para outras mercadorias, como cacau, café, carne bovina ou azeite de dendê. Grandes grupos de distribuição se comprometeram a adotar a ferramenta, como é caso da rede Carrefour.

“Nosso objetivo é que haja uma solução que nos permita garantir a ausência de desmatamento de 100% das matérias-primas sensíveis. Nossos clientes querem isso. Nosso desafio é imaginar que o mercado como um todo adotará regras similares. Assim, progressivamente, isso vai incitar os compradores a escolher produtos que comportam menos riscos e também incitar os fabricantes a ter práticas mais éticas”, resume a diretora de projetos da empresa, Agathe Grossmith.

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