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O Mundo Agora

Geopolítica impulsiona devoluções de bens culturais a países colonizados

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A atual dinâmica da geopolítica, com novas polaridades emergentes entre Estados Unidos, Europa, Rússia e China, coloca na pauta do dia a disputa por espaços no Terceiro Mundo. Um efeito colateral positivo desta nova dinâmica, tão marcada por guerras, agressões e disputas acirradas por mercados, é o de impulsionar a diplomacia de devolução de bens culturais saqueados pelas potências ao longo dos séculos nos países por elas colonizados.

Pirâmides de Gizé, nos arredores de Cairo, no Egito.
Pirâmides de Gizé, nos arredores de Cairo, no Egito. REUTERS/Amr Abdallah Dalsh
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Neste ano de 2022 registraram-nas várias devoluções, notadamente de países europeus em relação à África.

Há poucos dias o governo alemão devolveu 21 peças de bronze à Nigéria, pertencentes ao antigo Reino do Benim (não confundir com o atual e vizinho país do Benim). Estas peças, junto com outras, foram roubadas por militares britânicos no século 19 e em seguida vendidas a diversos museus europeus.

No ato da entrega, a ministra das Relações Exteriores da Alemanha, Annalena Baerbock, comparou a situação a uma hipotética impossibilidade, por parte dos alemães, de contemplarem a Bíblia de Gutenberg.

O ministro da Cultura português, Pedro Adão e Silva, anunciou a decisão por parte de seu governo de inventariar cuidadosa e discretamente, “sem politização” (sic), obras de arte, bens culturais, objetos de culto e até restos mortais tomados a comunidades das ex-colônias, para devolução.

O Papa Francisco I decidiu, também neste dezembro, enviar ao Arcebispado da Igreja Ortodoxa em Atenas, na Grécia, três peças pertencentes ao Partenon, que estavam há séculos no Museu do Vaticano. Em outubro passado o Vaticano já devolvera 3 múmias pré-hispânicas ao Peru e uma cabeça reduzida e mumificada ao Equador.

Em agosto o Museu Horniman, do Reino Unido, anunciou a devolução de 72 peças à Nigéria, também pertencentes ao antigo Reino do Benim.

O presidente francês Emmanuel Macron já ordenara, em 2021, o retorno de 26 peças do Museu do Quai Branly, em Paris, ao atual Benim, vizinho da Nigéria.

Lotes arqueológicos

A tendência também é observada em outras partes do mundo. Em setembro, a Justiça dos Estados Unidos ordenou a devolução de 16 assim chamados “tesouros arqueológicos” ao Egito, que estavam no Metropolitan Museum of Art, em Nova York. O governo uruguaio anunciou a devolução de 39 lotes arqueológicos e culturais ao Equador, Peru e Egito, que haviam chegado ao país através de contrabando.

Mas nem sempre a tendência desperta entusiasmo ou sequer aprovação. Há notícias de que partidários do movimento Chega, de extrema direita, em Portugal, se opõem ao anúncio de possível devolução feito pelo ministro da Cultura daquele país. Alegam que esta política compromete o culto à grandeza do antigo Império Português, e culpam as recentes levas de imigrantes como responsáveis por este comprometimento do nacionalismo em Portugal.

Por seu turno, o Museu Britânico, que há anos discute uma possível devolução das frisas do Partenon à Grécia, até o momento mantém um silêncio obsequioso sobre a reivindicação, por parte do Egito, do retorno da famosa Pedra de Roseta, graças à qual o arqueólogo francês Jean-François Champollion, no século 19, conseguiu decifrar os antigos hieróglifos egípcios.

A Pedra de Roseta foi tomada por Napoleão I, e depois pelos ingleses, como despojo de guerra e levada para o Museu Britânico, em Londres. Este museu também guarda, até o momento, um silêncio sepulcral sobre as peças que obteve daqueles militares que saquearam o antigo Reino do Benim, na Nigéria.

Atitudes negativas como estas justificam o dito irônico de que o Egito ainda tem pirâmides porque elas eram pesadas demais para serem levadas a algum país europeu.

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