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Linha Direta

Argentinos vão às urnas para eleições primárias com efeito de primeiro turno e impacto na economia

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Na teoria, no próximo domingo, os argentinos decidem quais dos pré-candidatos querem que sejam candidatos nas eleições gerais de outubro, mas as chamadas “PASO” que têm feito decisivo como num primeiro turno, definindo quem deve ganhar e, por isso, qual será o efeito imediato nos mercados financeiros que apostam tudo na oposição. A morte de uma criança nesta semana pode ter impacto no resultado.

Partidários da presidencialista direitista Patricia Bullrich, única mulher na corrida pelo comando da Casa Rosada.
Partidários da presidencialista direitista Patricia Bullrich, única mulher na corrida pelo comando da Casa Rosada. AP - Rodrigo Abd
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Márcio Resende, correspondente da RFI em Buenos Aires

Aquelas eleições primárias que, no mundo, acontecem internamente nos partidos políticos, na Argentina são abertas e obrigatórias a toda a população, mais especificamente Primárias Abertas Simultâneas e Obrigatórias (PASO), quando os eleitores deveriam escolher quais pré-candidatos devem ser candidatos nas eleições gerais de 22 de outubro. Porém, como os candidatos já estão praticamente escolhidos internamente, os argentinos votarão naqueles nos quais voltarão a votar em outubro, revelando antecipadamente qual o seu voto.

“Quando vemos os antecedentes eleitorais, percebemos que os candidatos vão bem ou mal nas eleições gerais, de acordo a como se desempenharam nas PASO. Quem ficar abaixo das expectativas, sai derrotado. Quem superar as expectativas, ganha impulso nas gerais”, explica à RFI o analista político, Lucas Romero, da Synopsis Consultores.

Mesmo naquelas primárias onde há uma concorrência, os argentinos vão revelar em quais partidos vão votar, sem que haja uma alteração significativa. É como se as eleições na Argentina tivessem três turnos.

Propostas opostas

São candidatos a presidente, a governador e a legisladores, mas a disputa se concentra em três coalizões.

Onde realmente há uma disputa, corpo a corpo, cabeça a cabeça, é na coligação opositora “Juntos por el Cambio” (Juntos pela Mudança) para a qual todos os olhares se voltam porque o ganhador tende a ser o próximo presidente da Argentina.

“A definição da ‘Juntos pela Mudança’ é o candidato que, seguramente, terá mais chances de ganhar as eleições presidenciais”, aposta Lucas Romero, um dos mais ouvidos no país.

De um lado a candidata da direita, Patricia Bullrich, quem promete reformas profundas e sem anestesia. “É tudo ou nada”, proclama num discurso que polariza contra o atual governo peronista, sobretudo contra a ala mais radical do partido, o ‘kirchnerismo’, liderado pela atual vice-presidente Cristina Kirchner.

Bullrich levanta a bandeira da segurança pública, da lei e da ordem, do rigor fiscal.

O seu rival interno é o atual governador do distrito federal, Horacio Rodríguez Larreta, quem aponta para a mesma direção, mas de forma mais moderada, procurando uma construção política mais ampla, de diálogo e de consenso. Tem um discurso de centro e defende que não se pode governar na polarização.

“São duas lideranças com estilos diferentes. Rodríguez Larreta põe ênfase na gestão e nos consensos. Patricia Bullrich tem uma liderança de decisões fortes”, indica à RFI a analista política Mariel Fornoni, diretora da Management & Fit, uma referência na Argentina.

Já o governo está representado na recém-criada União pela Pátria que leva como principal candidato o atual ministro da Economia, Sergio Massa, cujo calcanhar de Aquiles é a própria gestão: 115,6% de inflação no último ano. Uma economia quebrada e em agonia, sem dinheiro com as arcas do Banco Central zeradas.

O discurso de Sergio Massa é contrafático. Diz que, graças a ele, o país não terminou numa hiperinflação e o governo não caiu.

O terceiro candidato é da extrema-direita, o economista ultra liberal Javier Milei, um aliado de Jair Bolsonaro. Aliás, nas últimas horas, Bolsonaro enviou uma mensagem de apoio a Milei, da chamada “A Liberdade Avança”.

“Queremos o bem dos nossos países. Defendemos a família, a propriedade privada, o livre mercado, a liberdade de expressão, o legítimo direito à defesa e queremos ser grandes, à altura do nosso território e da nossa população”, elogiou Bolsonaro.

Milei é como Bolsonaro no comportamento e nas propostas (a população deve armar-se), mas um Paulo Guedes ainda mais radical na visão econômica, a favor, por exemplo, de abandonar o peso e dolarizar a economia e de acabar com o Banco Central.

Sondagens incertas

As pesquisas de intenção de voto dizem que a oposição vai ganhar com cerca de 35% dos votos, mas variam na hora de apontar quem vai ganhar, se Patricia Bullrich ou Horacio Rodríguez Larreta. A maioria dá uma vantagem para Patricia Bullrich.

A M&F de Mariel Fornoni atribui 34,8% à dupla, sendo 18,4% para Larreta e 16,4% para Bullrich. A coligação governista deve ficar com 31,7%. Já o candidato da extrema-direita, o aliado de Bolsonaro, Javier Milei, ficaria com 17%.

Já a Consultora Circuitos vê Juntos Pela Mudança com 35,8%, mas Bullrich a liderar com 20,9% e Larreta atrás com 13,9%. A coligação governista soma 30,9%, enquanto Milei fica com 14,9%.

“O problema que temos hoje com as sondagens é que sete de cada dez pessoas não querem responder. Não sabemos se por abstenção ou se por indignação com a política. As sondagens medem sempre o mesmo segmento que aceita responder. Por isso, o resultado pode variar. Javier Milei poderia ter 15%, 19% ou 21%. Não sabemos ao certo. E esse é o número que pode levar a disputa ao segundo turno (em 19 novembro)”, explica Fornoni.

Números mágicos

Para medir se os candidatos foram bem ou mal, se têm mais ou menos chances de serem eleitos em outubro, existem alguns “números mágicos”.

“O cenário atual trabalha com a seguinte expectativa: a oposição de Juntos pela Mudança deve obter 35% dos votos, a governista União pela Pátria deve ficar em torno de 30% e Javier Milei, com cerca de 20%. Nas nossas medições, União pela Pátrica está um pouquinho acima disso e Milei um pouquinho abaixo disso”, revela Lucas Romero.

“Qualquer resultado acima desses números será considerado um bom desempenho. Qualquer resultado abaixo desses números será considerado um mau resultado”, conclui.

Bom ou mau resultado implica ganhar as eleições no caso de Juntos pela Mudança, ou de continuar competitivo, no caso de Sergio Massa, evitando o que se prevê como uma derrota histórica para o peronismo.

Mercados à espreita

Em função desses números, os mercados vão reagir já a partir de segunda-feira. Se o ministro da Economia, Sergio Massa, for bem, significa que tem chances de ganhar em outubro e os mercados vão reagir mal. Vão entender que a política econômica do improviso vai continuar e que não haverá correções na economia.

Se Sergio Massa for mal, os mercados vão reagir bem. A principal âncora que ainda segura a economia argentina é a perspectiva de uma mudança de governo porque os mercados entendem que qualquer novo governo será melhor do que o atual, sobretudo porque a oposição, seja qual for, promete reformas.

“A melhor notícia para o ministro da Economia, Sergio Massa, é que o candidato Sergio Massa tenha um mau resultado”, sintetiza Lucas Romero.

“Mas se Massa for muito mal também pode ser um problema porque, sendo também ministro, pode gerar instabilidade econômica”, adverte Mariel Fornoni.

Se na oposição Patricia Bullrich ganhar e se Javier Milei for mal, tendo os dois pontos de contato de visões, pode haver uma migração de votos úteis de Milei a Bullrich, confirmando que estas primárias funcionam como um primeiro turno.

Suspensão da campanha eleitoral

Na quarta-feira (9), a Argentina entrou num estado de comoção com a morte de uma menina de 11 anos. Morena Domínguez ia à escola, na periferia de Buenos Aires, quando foi assaltada por dois ladrões numa moto. Foi arrastada e acabou morta. O crime chocou o país e levou os candidatos a encerrarem a campanha eleitoral.

Os analistas não acreditam que o episódio tenha muita incidência no voto popular, mas, se tiver, deve beneficiar Patricia Bullrich, que foi ministra da Segurança e é a favor do braço forte contra os delinquentes.

“Não acredito que esse caso leve a uma maior decisão de abstenção. Pelo contrário, acredito que pode incentivar as pessoas a votarem para expressarem a sua raiva com a situação”, avalia Mariel Fornoni.

Já no comitê de campanha do ministro Sergio Massa acredita-se que o episódio pode beneficiar a oposição: ou porque as pessoas não vão votar, enfurecidas com a política, ou porque vão votar enfurecidas com o governo, tido como conivente com a delinquência.

Por isso, na noite desta quinta-feira (10), o ministro e candidato Sergio Massa pediu que “a população vá votar” e que “a violência no país não seja usada de forma eleitoral”.

“Não somos essa sociedade fracassada que falam. Não somos um país de merda”, pediu Massa numa mensagem pelos canais de TV.

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