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"Se a extrema direita tenta abafar nossos direitos, nós avançamos em contra-ataque”, diz deputada trans Erika Hilton

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Mulher trans, negra e deputada federal, Erika Hilton falou dos desafios em lutar pelos direitos da comunidade LGBTQIA+ em meio a um Congresso conservador. E destacou a importância do acolhimento familiar para garantir emprego e renda dignos a jovens trans.

A deputada federal Érika Hilton (PSOL - SP).
A deputada federal Érika Hilton (PSOL - SP). © Divulgação/Rafa Canoba
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Raquel Miura, correspondente da RFI em Brasília,

“O cenário hoje no Congresso Nacional é duro, difícil e de extrema resistência à agenda LGTBQIA+. Mas nós temos pela primeira vez lideranças e parlamentares representativos, em especial transexuais e travestis. Já tivemos homens gays que passaram aqui, o que foi extremamente importante. Mas hoje nós temos pela primeira vez a tecla T da comunidade, e isso abre caminhos para que se comece um processo inovador”, resume a deputada. 

O desafio maior, diz a parlamentar, é mudar a imagem que se tem das pessoas trans, como se fossem aberrações destinadas ao submundo e passíveis de toda agressão. Visão cultural que prevalece ainda hoje e se mostra nos absurdos números da violência no Brasil: no ano passado foram 256 vítimas, assassinadas de forma cruel. 

“Nós somos retratadas e fomos retratadas midiática, filosófica e religiosamente como pessoas não dignas da humanidade, não humanas mesmo, como seres demoníacos, pecaminosos, noturnos, sujos, que deveriam viver à margem porque afrontávamos o direito da família, e uma série de outras falácias discriminatórias que foram construídas. Para dissolver, para diluir essas falácias, nós precisaremos de ações conjuntas por parte de todas as esferas da sociedade”, defende Hilton.

No dia Internacional contra a Homofobia, a Transfobia e a Bifobia (IDAHOTB), data escolhida em referência ao 17 de maio de 1990, quando a Organização Mundial de Saúde (OMS) retirou a homossexualidade do Código Internacional de Doenças, a deputada federal disse que a desconstrução dessa imagem passa por um movimento de toda a sociedade, das escolas às instituições de poder.

“Nós precisamos de legislações específicas que retirem a nossa população das esquinas de prostituição, das drogas. Precisamos garantir a inclusão no espaço escolar, mas também no espaço universitário. Nós precisamos de lei que ampare, que proteja, que dê empregabilidade. E tudo isso perpassa pelas mais diversas áreas da sociedade para que a gente possa alcançar o status de humanidade, porque a violência praticada contra nós no Brasil, ela é uma violência que reflete a desumanização da comunidade LGBTQIA+.”

A parlamentar reconhece o momento complexo da sociedade, que tem de um lado o conservadorismo aflorado e cantado por alguns segmentos, mas também tem um movimento crescente em defesa das minorias. “Ao mesmo tempo em que a extrema direita avança querendo abafar as nossas pautas, porque em todo mundo a extrema direita propaga ódio e mentiras sobre a nossa comunidade, nós também avançamos em conta-ataque, em resposta a tudo isso. E nós temos que disputar o Congresso, porque nós estamos disputando essa narrativa na sociedade.”

Hilton e sua colega Duda Salabert (PDT/MG), eleitas em 2022, foram as primeiras deputadas trans a ocuparem uma cadeira na Câmara Federal. “A relação com os parlamentares vem sendo por enquanto OK, tranquila. Não tive nenhum episódio de dissabor ou de agressividade. Há as nossas divergências pontuais, em plenário, em comissão, mas nos corredores, nas conversas, na troca de assinatura por frentes parlamentares, a relação vem sendo da forma como preconiza a democracia. Nós queremos, sim, conversar com pessoas que pensam diferente de nós, mas que respeitem a democracia. Os colegas que são contra isso, aqueles aos quais nós não dirigimos a palavra, sabemos que eles nos odeiam, que disseminam fake news contra nós, que trabalham contra nossos direitos”.

Família

Erika Hilton passou por vários desafios por questões de gênero, chegando a ser expulsa de casa pela mãe quando jovem. "Esse período conturbado foi muito curto, ao qual ela foi levada pela narrativa enganosa do ódio e do preconceito. Mas ela mesma, dentro da fé dela, com o Deus dela, se conscientizou de que, se uma mãe não ama e não protege sua filha, quem fará isso? Ela me resgatou, e é graças a essa oportunidade, ao amparo e ao acolhimento que recebi, que pude concluir meus estudos, me formar enquanto sujeito, e que eu posso estar aqui hoje representando a minha comunidade como deputada federal”, explica. “A minha relação com a família hoje é extremamente maravilhosa", conclui. 

E desse exemplo de casa ela apela às famílias de jovens trans. “Eu faço um clamor: não permitam, famílias, que o discurso de ódio seja capaz de minar e destruir aquilo que mais precioso, o amor de uma mãe, de um pai, de uma avó, de uma tia. Não é possível que a identidade de gênero ou a sexualidade de um filho, de um neto, de um sobrinho possa ultrapassar esse sentimento. E quando a família deixa de lado o ódio, o preconceito, a mentira, a enganação e acolhe e ama esse filho, esse neto, esse parente, ela assegura futuro a essa pessoa, que poderá trabalhar, poderá estudar, porque a base familiar dará essa estrutura.”

“Os fundamentalistas, os conservadores acusam a comunidade LGBTQIA+ de quererem destruir a família, quando, na verdade, é o discurso de ódio deles que faz com que famílias sejam destruídas e com que meninas e meninos jovens sejam jogadas à margem, às esquinas, à prostituição, à miséria e à violência.”

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