"Racismo à venda": Investigação expõe vídeos xenófobos chineses no continente africano
"Racismo à venda" é o título da nova investigação da rede britânica BBC sobre a indústria de "mensagens de vídeo personalizadas" da China. Trata-se de uma massa de filmes curtos rodados na África, às vezes com crianças, vendidos a empresas ou indivíduos, e postados no Tik Tok chinês, conhecido como "Douyin". Os autores denunciam uma verdadeira "pornografia da pobreza", muitas vezes tingida de racismo. Um setor que parecia crescer até alguns meses atrás.
Publicado em:
Stéphane Lagarde, correspondente da RFI em Pequim
Estes vídeos curtos de cerca de trinta segundos explodiram nas redes sociais chinesas entre 2018 e 2020, e agora estão muito menos presentes na rede Douyin, o TikTok local.
Mas eles não desapareceram completamente em 2022, como evidenciado por mensagens de vídeo de africanos musculosos e sem camisa desejando que um complexo residencial no distrito de Putuo, em Xangai, ficasse livre da Covid-19 e tivesse "uma rápida saída" das medidas de restrição contra a pandemia.
Empresas, pessoas que se casam ou celebram a entrada de seus filhos na universidade, e até estrelas do entretenimento encomendam vídeos personalizados, muitas vezes com a mesma sinopse: um cartaz com caracteres em mandarim em primeiro plano, e grupos de africanos dançando, cantando ou entoando palavras em mandarim que não entendem, contra um pano de fundo de palmeiras ou das paredes de lama de vilarejos africanos.
In 2020, a Weibo account called ‘Jokes about Black people club’ posted a video.
— Runako Celina (@RunakoCelina) June 13, 2022
In it, a group of African children huddled round a blackboard are made to say in Chinese:
‘I'm a Black monster, my IQ is low’ pic.twitter.com/QbmhKSR0tV
"Demônios negros"
A investigação da jornalista Celina Runako é baseada em um vídeo de fevereiro de 2020, quando o mundo ainda assistia à pandemia que acabara de ser descoberta na China. Nele, crianças africanas repetem para a câmera: Sou um "hey gui", "monstro negro" ou "diabo negro" — o equivalente à palavra negra em mandarim — e "tenho um QI muito baixo".
Uma mensagem que vai contra o discurso antirracista e de ajuda aos países em desenvolvimento promovida pela China. Durante um ano, a jornalista da BBC seguiu o rastro na internet de um certo Lu Ke, conhecido localmente como "Susu" — "tio" em chinês — apesar de ele ter apenas vinte anos de idade. O "influenciador" chinês costumava gravar até 380 vídeos por dia com crianças em um vilarejo no Malawi. Vídeos que eram então vendidos por entre € 10 e € 70.
Racismo e censura
"Há algo intrinsecamente sinistro em ir à África e oferecer moedas para pessoas menos privilegiadas que você e pedir-lhes que façam o que você quer", escreve a repórter em um texto que acompanha seu filme publicado pela News24.
Além de um próspero negócio às custas dos pobres, o documentário da BBC denuncia a formatação das mentes daqueles que veem essas imagens da humanidade reduzidas ao status de "pessoas dançantes, sorridentes, obedientes, com propensão para roubar, mentir e comportamento imoral".
A questão também é por que, em uma internet tão filtrada quanto a da China, o racismo pode escapar da censura.
"A ironia é que agora temos que recorrer aos censores pela justiça", observa Alexandria Sahai Williams no Twitter. A jornalista da DW trabalhou para uma empresa de streaming na China e ressalta que existe uma "enorme máquina de fazer dinheiro" por trás desses vídeos que, se não for controlada, poderá decolar novamente no futuro.
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