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O Mundo Agora

Angela Merkel é o “homem forte" da Europa em crise

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Angela Merkel – a “Mutti-Angela”, a Mãe Merkel como a chamam os alemães – é sem nenhuma dúvida o maior estadista da Europa de hoje. Mas a nova “mãezona” do continente só pode aplaudir o novo coelho que Alexis Tsipras acaba de tirar da cartola. O primeiro ministro grego, líder da esquerda radical Syriza, demonstrou que sabe combinar a astúcia de uma velha raposa felpuda com a audácia e velocidade de um jovem adolescente. Eleito em janeiro, com um programa proclamando a rejeição de qualquer arranjo com os credores do país, o novo primeiro-ministro entendeu rapidamente que fincar o pé só conduzir a Grécia a ser cuspida da zona euro.

A chanceler alemã, Angela Merkel
A chanceler alemã, Angela Merkel REUTERS/Hannibal Hanschke
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Para evitar uma bancarrota geral, ele decidiu que não tinha outro jeito senão aceitar as pesadas reformas internas e medidas de austeridade impostas pelos parceiros europeus e pela intransigência da Alemanha de Merkel. Só que os mais radicais do seu próprio partido não queriam saber de uma tamanha reviravolta. Maquiavélico, Tsipras lançou um referendo pedindo um mandato para rechaçar as imposições européias. Voto que ele ganhou fácil, para no dia seguinte trair todo mundo e aceitar concessões ainda mais pesadas. Com isso, ele desbaratou e desmoralizou a esquerda radical do Syriza, e assinou um acordo que praticamente colocou a política econômica e social da Grécia sob a tutela do Banco Central Europeu e da boa vontade do governo de “Mama Merkel”.

Claro, a sua ala mais radical, enojada com tanto cinismo., abandonou o Syriza para criar um partido de esquerda “pura”. O primeiro-ministro, sem maioria para implementar as reformas exigidas pelos credores, deu o pulo do gato: convocou novas eleições parlamentares e ganhou – enquanto os “puros” não conseguiram eleger nenhum deputado. Tsipras vai ter quatro anos pela frente para aplicar o acordo com as instituições européias e tentar manobrar para conseguir um perdãozinho de uma parte da gigantesca dívida grega. Não vai ser fácil e a nova maioria parlamentar é fraquinha. Mas o jovem estadista consolidou friamente o seu poder. Brilhante! Palmas para o artista! Não há outro dirigente europeu, hoje, capaz de tanta ousadia na política interna.

Exigências alemães

Mas se a performance foi espetacular, a dona do circo ainda é Angela Merkel. Nesse psicodrama grego, foram os alemães que impuseram as exigências mais duras e que obrigaram o governo do Syriza a engolir tudo aquilo que não queria. E vão continuar monitorando tim-tim por tim-tim para que Atenas cumpra o prometido. Só que isso cria uma forte reação contra a Alemanha por parte das opiniões públicas nos outros países do Velho Continente. Angela Merkel foi caricaturada com bigodinho de Hitler e Berlim acusada de querer dominar a Europa e impor o seu próprio modelo sócio-econômico.

Mas as centenas de milhares de refugiados batendo às portas da Europa, mudou o panorama. “Mãe-Angela” resolveu jogar pesado a carta da acolhida humanitária, anunciando que os alemães estavam dispostos integrar 800.000 asilados políticos. Angela Merkel virou o ícone dos defensores dos valores humanísticos e cristãos no Velho Continente. Só que desde então, é uma enxurrada de refugiados do Oriente Médio que tentam chegar até a Alemanha, passando pelas ilhas gregas, o sul da Itália e os Bálcãs.

“Mutti-Angela”

A situação está arriscada a ficar completamente descontrolada. De tal maneira, que Berlim resolveu restabelecer controles fronteiriços provisórios para organizar melhor essa onda migratória. Mas Mama Merkel também sabe disciplinar. Já foram convocadas duas reuniões européias, de ministros do Interior e dos chefes de governo, para resolver o problema.

A Alemanha exige que todos os outros países europeus sejam solidários e acolham a sua parte de refugiados e que as fronteiras exteriores da União Européia sejam reforçadas. E ameaça cortar os fundos de ajuda financeira da União para quem não aceitar. Mas também está disposta a ajudar os que fizerem a sua parte. Bate e assopra. Não há dúvida de que “Mutti-Angela” é o homem forte da Europa em crise. Mas todo cuidado é pouco: a arrogância alemã do século passado ainda está na memória do continente inteiro. E o ressentimento também.

* Alfredo Valladão, do Instituto de Estudos Políticos de Paris, faz uma crônica de política internacional às terças-feiras para a RFI Brasil.

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