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ONG britânica denuncia vínculo das marcas Zara e H&M no desmatamento do Cerrado brasileiro

Um relatório da ONG britânica Earthsight denuncia nesta quinta-feira (11) o cultivo industrial de algodão no Cerrado brasileiro, utilizado principalmente na fabricação dos jeans do grupo Inditex, proprietário da Zara, e da marca H&M. Na França, os sites dos jornais Le Monde e Libération publicam as conclusões da investigação intitulada “Crimes da moda. Gigantes europeus envolvidos no escândalo do algodão brasileiro".

Um relatório da ONG britânica Earthsight denuncia nesta quinta-feira (11) o cultivo industrial de algodão no Cerrado brasileiro, utilizado principalmente na fabricação dos jeans do grupo Inditex, proprietário da Zara, e da marca H&M.
Um relatório da ONG britânica Earthsight denuncia nesta quinta-feira (11) o cultivo industrial de algodão no Cerrado brasileiro, utilizado principalmente na fabricação dos jeans do grupo Inditex, proprietário da Zara, e da marca H&M. AFP - KIRILL KUDRYAVTSEV
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A soja não é a única cultura que está destruindo o bioma do Cerrado. "As plantações de algodão também contribuem para o desaparecimento desta savana arborizada, que cobre mais de 1,5 milhão de quilômetros quadrados, valiosos para a absorção de gás carbônico" no combate às mudanças climáticas, afirma a ONG britânica. Em seu relatório, a Earthsight mostra que o algodão brasileiro é exportado para a Ásia, onde esses dois grupos de moda, entre outras marcas, fabricam seus jeans. 

As denúncias são publicadas após um ano de investigações, que envolveram análise de dados e atas empresariais e jurídicas, visualização de imagens de satélite e entrevistas com agricultores. Dois grandes produtores brasileiros de algodão, o Grupo Horita e a SLC Agrícola, "lucram com o desmatamento ilegal", segundo a Earthsight, principalmente com o produto de culturas instaladas no oeste da Bahia. Os fardos de algodão produzidos pelas duas empresas são exportados com a certificação Better Cotton (BC), selo que deveria garantir ao consumidor o “melhor algodão” nas lojas Zara e H&M, destaca o jornal Le Monde.

Os três autores do estudo conseguiram estabelecer, com base em sentenças e multas impostas pelas autoridades brasileiras, que essas duas empresas exploram plantações em áreas onde houve desmatamento ilegal. No oeste do estado da Bahia, a SLC Agrícola, principal produtora de algodão do Brasil, opera 44 mil hectares de plantações de algodão. O Grupo Horita possui 140 mil hectares na região, alternando culturas de algodão, milho e soja.

“Em 2014, o órgão ambiental do Estado da Bahia estimou que 25.153 hectares explorados pela Horita eram provenientes de desmatamento ilegal”, aponta a ONG. Em 2020, a mesma agência estimou que “11.700 hectares desmatados pela empresa entre 2010 e 2018” não tinham sido sujeitos a qualquer autorização, acrescenta o relatório. Entre 2010 e 2019, a Horita recebeu mais de 20 multas ambientais de um valor total de US$ 4,5 milhões. A SLC também estaria por trás do desmatamento de milhares de hectares, em 2022, em uma de suas fazendas, segundo a ONG britânica. Os municípios que tiveram seu bioma mais afetado são Correntina e Formosa do Rio Preto.

As plantações de algodão se expandiram em “detrimento das populações locais” e graças à "corrupção e à violência", denuncia a Earthsight. Um dos coautores da investigação, Rubens Carvalho, menciona “testemunhos arrepiantes de ameaças à mão armada e detenções arbitrárias”.

O Libération sublinha que o setor da moda é uma das indústrias mais poluentes do planeta. "O cultivo do algodão, estrela dos têxteis, é um verdadeiro coquetel explosivo para o meio ambiente, devido à utilização massiva de agrotóxicos e de uma enorme quantidade de água doce". 

Selo suíço e parceria duvidosa com a Abrapa 

O jornal Le Monde mostra que a reconstituição do trajeto de toneladas de algodão do Cerrado até oito fábricas asiáticas também permitiu revelar “conflitos de interesses” que comprometem o selo de qualidade do algodão brasileiro concedido pela associação suíça BC. A organização, fundada em 2005, reivindica ser a “líder mundial da sustentabilidade para o algodão”. A proposta dos fundadores era de “ajudar as comunidades algodoeiras a sobreviver e prosperar, ao mesmo tempo em que protegem e restauram o meio ambiente”.

No Brasil, a BC fez uma parceria com a Abrapa em 2010. E desde 2014, um acordo estipula que qualquer agricultor que respeite os padrões da Abrapa (Associação Brasileira dos Produtores de Algodão) pode usar o selo BC. Mas o que a ONG Earthsight constatou na prática é que faltam “independência real” e “imparcialidade” na certificação [das colheitas] destes produtores e sua fiscalização, já que nos títulos de propriedade das plantações não há referência de que foram instaladas em áreas previamente desmatadas. 

Em 2017, uma reportagem do programa de TV “Cash Investigation”, exibido pelo canal de TV France 2, fez críticas e denunciou irregularidades na certificação da BC. 

Questionada pelo Le Monde, a organização suíça diz que “as questões levantadas demonstram a necessidade urgente de apoio governamental para (…) garantir uma implementação justa e eficaz do Estado de direito”. A associação promete ainda que revelará em breve os resultados de “uma auditoria”.

De acordo com a reportagem do Le Monde, em 8 de abril, a Inditex escreveu ao CEO da BC, Alan McClay, para exigir mais “clareza em relação ao processo de certificação” do algodão brasileiro. O jornal francês teve acesso à carta na qual o grupo espanhol, dono da Zara, afirma que “aguarda os resultados de uma investigação interna da BC” iniciada em agosto de 2023. 

Em 2021, a ONG britânica Earthsight já tinha investigado a madeira utilizada pela gigante sueca de móveis e decoração Ikea e o selo FSC que supostamente garantiria o manejo florestal sustentável, recorda o Le Monde.

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