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França: Iranianas fazem colheita de uvas para manter vivo vinho persa, símbolo da 'luta' contra Teerã

Libertadas do véu religioso, um grupo de mulheres iranianas continua sua revolta contra Teerã fazendo colheitas de uva na França com um objetivo em mente: lutar com as mãos para manter vivo o vinho persa.

 Marjan Jangjoo vendimia no terreno do viticultor de origem iraniana Masrour Makaremi,em Dubard, em Saint-Méard-de-Gurçon, França, em 21 de setembro de 2023
Marjan Jangjoo vendimia no terreno do viticultor de origem iraniana Masrour Makaremi,em Dubard, em Saint-Méard-de-Gurçon, França, em 21 de setembro de 2023 © Christophe ARCHAMBAULT / AFP
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No sudeste de França, Marjan Jangjoo e outros compatriotas colhem cachos de syrah, uma casta emblemática de uvas do Vale do Rhône mas que, segundo a lenda, os templários trouxeram da Pérsia.

"Não paramos, continuamos a lutar. A luta contra os mulás, contra a República Islâmica, continua aqui de uma forma diferente", diz Jangjoo, treinadora esportiva, com a cabeça descoberta apesar da chuva.

Esta mulher de 32 anos, que ensinava ioga aérea e snowboard perto de Shiraz (sudoeste do Irã), conseguiu fugir em novembro das forças de segurança que queriam prendê-la.

Depois de vários meses de árdua viagem por montanhas nevadas e sem roupa adequada, a experiente montanhista e maratonista chegou a pé ao Curdistão iraquiano.

Ela obteve assistência no consulado francês em Erbil (norte do Iraque) e conseguiu chegar à França, onde pediu asilo, por ter participado das manifestações pela morte de Mahsa Amini.

Para sua amiga Soodeh Lashkarizadeh, da Holanda, nação onde se refugiou em 2018, os problemas com Teerã começaram quando ela tirou o hijab para jogar críquete. “O regime iraniano quer destruir a felicidade, como dançar, praticar esporte ou beber vinho”, denuncia a mulher de 33 anos, atualmente estudante e instrutora de natação.

A refugiada iraniana Soodeh Lashkarizadeh vendimia nos vinhedos de Dubard, em Saint-Méard-de-Gurçon.
A refugiada iraniana Soodeh Lashkarizadeh vendimia nos vinhedos de Dubard, em Saint-Méard-de-Gurçon. © Christophe ARCHAMBAULT / AFP

"Renascimento"

“No Irã, a repressão atinge duramente os atletas porque a juventude popular se identifica com eles e porque o esporte transmite valores”, explica Chowra Makaremi, antropóloga do Centro Nacional Francês de Investigação Científica (CNRS).

A pesquisadora de origem iraniana é um apoio para Marjan Jangjoo, que colhe, como outros iranianos, no terreno que seu irmão Masrour Makaremi tem nos vinhedos de Dubard e onde busca ressuscitar o vinho persa.

A futura safra, batizada de Cyrhus, em referência a Ciro, o Grande, fundador do Império Persa, envelhece em jarras porosas de terracota, impermeabilizadas com uma camada de resina natural de pistache, inspirada nos métodos de vinificação utilizados há 5.000 anos.

Parte do vinho também foi derramado em uma jarra pós-sassânida – a última dinastia imperial persa antes da conquista árabe-islâmica no século VII – que Masrour Makaremi comprou em um leilão. “A aspiração de liberdade dos iranianos não é simplesmente o resultado de uma revolta contra o regime atual, mas tem raízes distantes na civilização persa”, defende o ortodontista e doutor em neurociência cognitiva.

Neste “ato de resistência ligado ao renascimento da cultura persa”, cada gesto conta, sobretudo “as mãos que colhem”, afirma o homem que produz 6.000 garrafas por ano.

Estas jovens estão travando “a mesma batalha” que a mãe de Makaremi, Fatemeh Zarei, uma opositora política torturada e executada durante o “massacre na prisão de 1988”.

O viticultor francês de origem iraniana Masrour Makaremi posa durante a colheita em seu terreno em Dubard, en Saint-Méard-de-Gurçon, na França. Ele utiliza um método milenar iraniano para realizar seus vinhos.
O viticultor francês de origem iraniana Masrour Makaremi posa durante a colheita em seu terreno em Dubard, en Saint-Méard-de-Gurçon, na França. Ele utiliza um método milenar iraniano para realizar seus vinhos. © Christophe ARCHAMBAULT / AFP

Após a morte da mãe, ele exilou-se com a irmã na França, onde o pai, também adversário político, encontrou refúgio após vários anos na clandestinidade.

Masrour Makaremi não esqueceu os “passeios com a avó pelos vinhedos” perto de Shiraz, a sua cidade natal e berço de uma antiga tradição viticultora. Ele também se lembra do tio “fazendo secretamente seu vinho de mesa”.

Embora as manifestações contra o regime no Irã estejam perdendo força após meses de repressão, ele ainda mantém a esperança de um dia voltar a plantar parreiras em sua terra natal. “Ou serão os meus filhos que continuarão esta aventura”, afirma.

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