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Uma criança morre a cada cinco dias na França vítima da violência de um dos pais

Os maus-tratos às crianças não recuam no território francês. Um relatório divulgado pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), por ocasião do Dia Internacional dos Direitos da Criança, celebrado no domingo (20), revelou um grave aumento dos abusos contra menores: na França, uma criança é morta por um de seus pais a cada cinco dias, em média, segundo a agência da ONU.

Adeline Hazan, presidente do comitê francês do Unicef, está alarmada com o aumento da violência contra menores na França.
Adeline Hazan, presidente do comitê francês do Unicef, está alarmada com o aumento da violência contra menores na França. Thibault Camus / AP POOL / AFP
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Essas tragédias ocorrem devido à falta de prevenção e à falta de detecção de situações de risco para a criança, diz Adeline Hazan, presidente do comitê francês do Unicef. Em entrevista à RFI, ela explica que o número insuficiente de juízes de menores, assistentes sociais, educadores e de outros profissionais especializados contribui para o mau funcionamento da Ajuda Social à Infância, instância pública que deveria proteger as crianças francesas de abusos. 

Em Seine-Saint-Denis, o subúrbio mais pobre do país, ao norte de Paris, os juízes de menores emitem um número considerável de ordens judiciais para a visita de famílias suspeitas de violência contra menores. No entanto, devido ao pequeno número de educadores para percorrer esses lares, a visita pode demorar de seis meses a um ano e meio, segundo o Unicef. "Nesse período, a criança fica exposta, ninguém vai vê-la e a violência perdura", constata a representante do Unicef.  

A situação piorou com a pandemia de Covid-19. Em uma pesquisa, a associação L'Enfant Bleu (Criança Ferida, em tradução livre para o português) observa um aumento de 45% nas chamadas das vítimas ou de pessoas próximas para testemunhar o abuso de crianças no período de 2019 a 2022. "Nunca recebemos tantas chamadas", disse Isabelle Debré, presidente desta entidade, que trabalha há quase 30 anos com crianças vítimas de violência. Segundo ela, os casos de abuso sexual representaram 55% das ocorrências em 2021, "um aumento de 11 pontos em relação a 2019 e de 30 pontos em comparação com 2014".

Unicef alarmado com aumento de abusos

Em 2020, um terço da violência foi descrita como psicológica, de acordo com o grupo de interesse público Infância em Risco (GIP Enfant en Danger), e mais de 9 em cada 10 supostos autores eram membros próximos da família. 

O Unicef está preocupado com as consequências desses abusos. "A França assinou a Convenção Internacional dos Direitos das Crianças há 33 anos", recorda Adeline Hazan, apontando que a proporção de hospitalizações de crianças vítimas de violência cresceu 50%, entre 2017 e 2020. Ela critica o mau funcionamento dos mecanismos de prevenção. "Somos incapazes de detectar sinais de risco, e as situações se tornam arraigadas", lamenta. 

O Unicef também constata um aumento da pobreza na França. "Mais de 20% das crianças francesas vivem em lares com renda familiar abaixo da linha da pobreza, em situação de exclusão social e de grande privação", ressalta Hazan. A especialista nota que vários aspectos relativos à vida das crianças, citados na Convenção Internacional dos Direitos das Crianças, não estão sendo respeitados no país, apesar de a França ter ratificado a Convenção da ONU. 

Em 2019, o governo francês lançou um plano para combater a violência contra crianças e adolescentes. Mas, na avaliação do Unicef, nesses três anos, "se não houve retrocessos, tampouco ocorreram avanços nessa área", de acordo com Hazan. "Acesso à saúde é um problema para as crianças em situação de vulnerabilidade, assim como acesso à educação", enfatiza a representante da agência da ONU.

Pessoas silenciam diante das suspeitas

Desde 2014, a associação L'Enfant Bleu observou um aumento de 10 pontos no número de pessoas pesquisadas que reconhecem ter sofrido abusos físicos ou psicológicos durante sua infância. Este percentual alcançou 24% dos entrevistados em 2022. Entretanto, na maioria dos casos, o silêncio continua sendo a regra e apenas 5% das vítimas dizem ter denunciado o abuso no momento do incidente.

Apesar da liberação da fala nos últimos anos, particularmente impulsionada pelo movimento #MeToo, que denunciou situações de assédio de mulheres, o abuso de menores continua sendo um tabu para 73% da pessoas que responderam à pesquisa da associação. Ao menos 31% dos ouvidos disseram ter suspeitado "de pelo menos um caso de abuso infantil nos últimos anos em seu círculo de amigos e familiares". Destes, 86% (+7 pontos) afirmam ter agido para esclarecer as suspeitas, seja relatando o caso para outros adultos ou conversando diretamente com as crianças atingidas.

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