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Donos de restaurantes brasileiros na França contam como se preparam para quarentena até julho

No próximo dia 11 de maio tem início o fim gradual da quarentena na França. Conforme estipulou o presidente Emmanuel Macron, será um processo lento e por etapas. Na evolução prevista pelo governo francês para a flexibilização do isolamento social, uma categoria deverá ter mais paciência para reaver seus clientes: os donos de restaurantes, bistrôs e bares. Entre eles, alguns pequenos empresários, donos de restaurantes brasileiros na região parisiense, contaram à RFI como estão fazendo para segurar as despesas e o prejuízo até julho, quando poderão reabrir as portas.

“Pastel de Feira”, lanchonete e mercadinho brasileiro em Alfortville, na região parisiense.
“Pastel de Feira”, lanchonete e mercadinho brasileiro em Alfortville, na região parisiense. © Divulgação
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O “Pastel de Feira”, lanchonete e mercadinho brasileiro em Alfortville, que faz serviço de bufê para festas e reuniões, entregas e retiradas no sul da região parisiense, teve que fechar as portas no início da quarentena, em 17 de março. “Somos uma equipe de quatro pessoas, com dois extras nos fins de semana. Trabalhávamos de terça-feira a domingo, das 11h às 22h, diz a proprietária Cristiane Ribeiro.

“Para mim, para minhas despesas pessoais, da casa e da minha família, estou podendo manter. Mas o restaurante não dá. Na ponta do lápis, gasto € 10 mil apenas com funcionários. Neste segundo mês, como no primeiro, o salário saiu do meu bolso”, conta. “O segundo mês eu ainda garanto, mas o terceiro vai ser difícil. Terei que usar o crédito bancário que o governo ofereceu”, admite.

No entanto, segundo Ribeiro, somando todas as ajudas do governo francês aos pequenos empresários durante a pandemia da Covid-19, “não dá para pagar nem o aluguel do comércio”. “Acho que vai ter muita empresa com dificuldade de voltar, principalmente os comércios que não poderão abrir as portas no dia 11 de maio, que terão que esperar até julho. Uma amiga, que tem uma oficina culinária, já me disse que não vai dar conta de manter aberto até lá. Ela é nova no ramo, só dois anos de empresa, ela vai ter que fechar”, conta.

"Plano B"

Cristiane Ribeiro detalha o seu “Plano B”: “Fiz um pedido do PGE [o chamado “Prêt Garanti par l’État”, ou, em português, “Empréstimo garantido pelo Estado”, que o governo francês disponibilizou para pequenas empresas durante a crise do coronavírus] no meu banco, com a gerente. É um empréstimo com taxa zero durante um ano, e é o que vai me ajudar”, afirma. “Fiz também vários outros pedidos de ajuda do Estado, a ajuda de  € 1500 (do Fundo de Solidariedade), e a ajuda complementar às empresas [da Seguridade Social francesa]. Mas até agora não caiu ainda na conta nada dessas ajudas”, diz.

Para o dia 11 de maio, quando acontecerá na França o fim gradual do isolamento social, Ribeiro afirma não ter planejado “nada de especial”. “Até porque o restaurante vai continuar fechado até o mês de julho. Os funcionários ainda estão sem previsão de retorno. A única coisa que consegui fazer durante a quarentena foi reformar o restaurante. Vamos ver, ainda está cedo para ter uma base. Tivemos prejuízos, mais de 50% do lucro normal. Mas não gastei e não entrou, então está equilibrado”, conta.

“Quando começou o isolamento, perdi poucos produtos no estoque, como sobremesas, que acabaram estragando. Meus funcionários moram longe, não havia como buscá-los, tudo estava fechado, algumas coisas tive que descartar”, lembra. “O confinamento me pegou de surpresa”, diz a proprietária do “Pastel de Feira”. “Eu estava no Brasil, cheguei no sábado (14 de março). À noite, mandaram fechar todos os restaurantes. Tenho três funcionários fixos, e tive que colocá-los no dispositivo de ‘desemprego parcial’. Não demiti ninguém. Até agora está dando para segurar a barra”, afirma.

“Não estou fazendo delivery porque meu menu é muito variado, vários tipos de produtos, salgados, lanches, porções, pratos executivos. Seria muito confuso fazer uma seleção apenas para a entrega. Temos uma boa clientela, de repente eles solicitariam algo fora do estoque. Optei por fechar completamente”, admite Ribeiro. “Continuo trabalhando, no entanto, na fabricação de alguns produtos para lojas brasileiras”, conta.

“Acostumados à gestão de crises”

Sébastien Monneret e Claudia Pereira Monneret, donos do tradicional restaurante brasileiro “O Corcovado”, no 14° distrito de Paris, começaram a se organizar quando chegaram as primeiras notícias do isolamento social na Europa. “Quando vimos o que estava acontecendo na Itália, esperávamos que o governo francês tomasse as mesmas decisões (decretar a quarentena), mas ficamos surpresos por ser tão rápido aqui. Durante um tempo, tivemos muito cuidado com o movimento... Então, quando anunciaram o fechamento total no sábado, 14 de março, à meia-noite, tivemos muito pouco prejuízo, talvez € 150”, conta Sébastien Monneret.

“Nós, do setor dos restaurantes, sofremos desde 2015 com os atentados de Charlie Hebdo, do Bataclan, e também com os ‘coletes amarelos’ e as greves de dezembro, portanto, estamos acostumados à gestão de crises, isso não é novidade. Estamos cansados porque nunca vemos a luz no fim do túnel e regularmente existem problemas, mas acabamos gerenciando-os”, conta.  “Antes do coronavírus, tínhamos € 12.000 no caixa da empresa. Hoje não temos nada. Nossos dois funcionários estão parcialmente desempregados. E ainda estamos à espera da ajuda de € 1.500. Fazem duas semanas que estamos esperando”, relata.

O casal também foi obrigado a recorrer a empréstimos bancários, facilitados pelo governo francês durante a pandemia. “Tomamos emprestado do banco € 25.000. É o auxílio de emergência concedido pelo Estado a empresas que reduziram mais de 70% o volume de negócios no mês de março de 2020 em comparação a março de 2021. Então, depois de 14 anos de restaurante, nos encontramos como no começo, em dívida!”, diz o proprietário. “A única diferença é que já temos nossos clientes. Também é esperada uma ajuda de nosso seguro em relação à interrupção dos negócios. Mas saberemos apenas após o final do confinamento”, afirma Sébastien.

“Em épocas normais, trabalhamos com delivery, mas não podemos agora porque nossos fornecedores estão todos fechados. Não poderemos oferecer picanha, por exemplo...”, diz  Monneret. “Mas, senão, está tudo bem. Temos que filosofar”, brinca o francês. “Teríamos preferido que o vírus chegasse durante o inverno em dezembro, quando está frio e todo mundo está cansado. Aproveitamos essa oportunidade para fazer muitas obras no restaurante, reformas, pintura. “E, francamente, há tanta frustração das pessoas em ficar em casa que, quando reabrirmos, acho que teremos uma multidão de clientes”, aposta o dono de “O Corcovado”.

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