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Vacina: OMS denuncia "comentários racistas" de cientistas que propõem testes na África

Durante um programa transmitido na última quarta feira (1º) no canal francês LCI, um médico, chefe de serviço de reanimação do Hospital Cochin, em Paris, resolveu ser “provocador” ao fazer uma pergunta ao diretor de pesquisas do Inserm, o Instituto Francês de Pesquisa Médica, que falava sobre as pistas de que a vacina BCG possa prevenir ou atenuar os efeitos da Covid-19 : “Por que não realizar estudos na África, onde não tem máscara, não tem tratamento nem reanimação?”. 

Pesquisador e médico franceses pedem desculpas após a polêmica declaração, na TV francesa, sobre a conveniência de se testar uma vacina contra a Covid-19 no continente africano.
Pesquisador e médico franceses pedem desculpas após a polêmica declaração, na TV francesa, sobre a conveniência de se testar uma vacina contra a Covid-19 no continente africano. Getty Images
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Seus comentários provocaram raiva e indignação na Internet. "A África não é um laboratório", "Nós não somos cobaias", e outras frases antirracistas foram afixadas em um mapa da África e transmitidas massivamente nos últimos dias nas redes sociais, inclusive no Brasil, que teve o selo do projeto Potências Negras e foi repostado por milhares de internautas.

Personalidades fracesas e africanas, como o jogador de futebol marfinense Didier Drogba, reagiram, assim como a associação SOS Racismo, que pediu que o Conselho Superior do Audiovisual francês interviesse contra o programa, e o Partido Socialista, que pediu explicações ao canal de televisão. 

Nesta segunda-feira (6), o diretor-geral da OMS condenou os "comentários racistas" de pesquisadores que recentemente se referiram à África como "um campo de testes" para testar uma potencial vacina contra a Covid-19, denunciando "o legado de uma mentalidade colonial ".

"Esses tipos de comentários racistas não fazem nada para avançar. Eles vão contra o espírito de solidariedade. A África não pode e não será um campo de testes para nenhuma vacina", disse Tedros Adhanom Ghebreyesus, ex-chefe de diplomacia etíope, durante uma conferência de imprensa virtual, de Genebra. "O legado da mentalidade colonial deve acabar", acrescentou, sem citar os cientistas envolvidos.

 

Desculpas e tentativas de explicação

Na sexta-feira (3), o Inserm disse que o pesquisador Camille Locht, questionado dois dias antes no canal francês, pediu desculpas. Este último enfatiza "que ele não fez comentários racistas", "que as condições da entrevista não lhe permitiram reagir corretamente". Segundo ele, sua intenção era afirmar que "todos os países deveriam se beneficiar dos frutos da pesquisa". 

No vídeo original, quando ele responde à “provocação” sobre fazer pesquisas na África, ele diz que elas devem ser feitas também na Europa e na Austrália. Mas o trecho que viralizou foi o que ele responde positivamente à pergunta, feita em forma de provocação, sobre se os testes deveria ser feitos na África. 

O Inserm tuitou que se tratava de “fake news”: “Um vídeo truncado, tirado de uma entrevista na LCI de um de nossos pesquisadores sobre o uso potencial da vacina BCG contra a Covid-19, foi objeto de má interpretação nas redes sociais”. Em seguida, explica que estes estudos já estão ocorrendo ou estão a ponto de serem lançados em países europeus como Holanda, Alemanha, França e Espanha e também na Austrália. 

A Assistência Pública dos Hospitais de Paris (AP-HP), para o qual o médico Jean-Paul Mira trabalha, que lançou a pergunta provocativa ao vivo, também reagiu. O Conselho Executivo da AP-HP diz que está "chocado" com as palavras do médico que também faz seu mea culpa: "Quero me desculpar com aqueles que foram atingidos, chocados e que se sentiram insultados por palavras que eu utilizei de forma desajeitada ”, diz o chefe da unidade de terapia intensiva do Hospital Cochin.

Reação do Ministério de Relações Exteriores da França

A polêmica ganhou níveis tão grandes que o Quai d’Orsay, nome dado ao Ministério das Relações Exteriores da França, falou na sexta-feira (3). Em um comunicado, disse que os comentários feitos pelos médicos no canal LCI "não refletem a posição das autoridades francesas".

Para marcar o apoio de Paris nessa crise de saúde que atinge também o continente africano, o Quai d'Orsay especifica que o presidente Emmanuel Macron se encontrou na sexta-feira por videoconferência com uma dúzia de colegas africanos "para fazer um balanço e ver como apoiar os esforços do continente ”.

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