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Saúde em dia

Conheça os "nanoblades": as cápsulas orgânicas que ajudam na edição do genoma

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Manipular o DNA é um sonho antigo da Ciência que começa a se tornar realidade desde a descoberta do CRISPR/Cas 9 - ou “tesoura genética”. Criado em 2012, o sistema permite que os cientistas controlem o local onde a proteína "cortara" o genoma, mas também é capaz de “colar” seções especificas do DNA e até mesmo adicionar, ativar ou desativar genes.

Os pesquisadores Emiliano Ricci e Philippe Mangeot no laboratório do Inserm, em Lyon.
Os pesquisadores Emiliano Ricci e Philippe Mangeot no laboratório do Inserm, em Lyon. (Taissa Stivanin/RFI Brasil)
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Para aumentar a precisão dessa ferramenta orgânica, que visa modificar o genoma com objetivos terapêuticos, dois pesquisadores do Centro Internacional de Pesquisa em infectologia, do Inserm (Instituto de Pesquisas Médicas), em Lyon, descobriram uma maneira de tornar mais precisa a intervenção realizada pelo Cas9 – nome da proteína do sistema CRISP que opera os genes.

O sistema CRISP-Cas9 atua utilizando dois agentes: uma proteína e um ácido nucléico, um RNA, que guia o bisturi orgânico. A ação conjunta desses dois elementos visa romper o DNA na região prevista -os ácidos nucléicos contêm toda a informação genética de um organismo.

O problema é que a ação da "tesoura genética" é difícil em células mais frágeis, ou primárias, como as células-tronco humanas - um dos focos das terapias futuras. Para aumentar a precisão da ferramenta, os cientistas criaram uma cápsula orgânica batizada de nanoblade, uma invenção inédita que demorou quase cinco anos para ficar pronta e, graças à sua originalidade, já foi patenteada.

“Na prática, são veículos para posicionar o sistema CRISP-Cas9, um sistema relativamente recente, que permite editar, de maneira precisa, o genoma humano, e de organismos em geral. Esse sistema é uma revolução, mas difícil de administrar. Tecnicamente, somos capazes de visualizar o que deve ser feito, mas não é fácil executar nas células”, explicou o cientista Philippe Mangeot à RFI, na sede do laboratório do Inserm em Lyon.

“A base molecular é que tivemos a ideia de fundir a proteína do sistema Cas9 com uma proteína de estrutura viral. Dessa forma, conseguimos criar vírus vazios, que não são infecciosos, mas que contém em sua arquitetura a proteína Cas9. Quando produzimos essas partículas, elas direcionam a proteína Cas9, que se associam à nossa proteína viral estruturante. Conseguimos, dessa forma, “entregar” a proteína Cas9 em células de difícil acesso, como as células-tronco”, completa. Duas proteínas diferentes usadas na superfície facilitam o acesso das partículas virais em células diferentes.

Cavalo de Troia

A proteína retroviral usada nos nanoblades não tem genoma e possui propriedades ideais para uma intervenção precisa e pouco intrusiva na célula tratada. A camada superficial dos nanoblades, que cerca a capsula, também é formada por duas proteínas que ajudam na fusão das membranas das células e na eficácia do “corte” genético realizado. Os cientistas testaram diversas partículas virais até obterem a combinação desejada. O sucesso foi comprovado em testes com camundongos. Eles conseguiram modificar a cor dos animais alterando o código genético do embrião, criando um transgênico.

No futuro, a nova técnica pode ser usada para corrigir diversas doenças, diz o pesquisador Emiliano Ricci, um dos autores do estudo. “Ela pode ser usada em certas patologias onde é possível recuperar as células troncos de um paciente, trata-las com os nanoblades e em seguida injetar novamente no paciente para que ele recrie um tecido original, sem nenhuma mutação”, especifica.

Essa etapa exige, entretanto, novos protocolos de pesquisa, financiamentos e células-tronco patológicas à disposição no laboratório. E justamente a conexão que falta, explicam os cientistas, entre a pesquisa e a Medicina aplicada. O fato da descoberta ter sido patenteada deve facilitar essa ponte.

O retrovírus deposita uma proteína capaz de mudar o genoma diretamente no corpo, desaparecendo em seguida, explicam os cientistas. “O vírus tem a capacidade de entrar facilmente na célula. Exploramos essa capacidade, mas retiramos todo seu material genético. Assim, ele só pode depositar na célula aquilo que colocamos dentro dele”, detalha Emiliano Ricci. Desta forma, o nanoblade replica reproduzindo a proteína utilizada pelo sistema das "tesouras genéticas", que vai consertar o gene escolhido como alvo terapêutico. Como um cavalo de Troia, compara.

A capsula criada pelos pesquisadores franceses preserva as áreas que não são consideradas como alvos terapêuticos e atua de forma temporária. Ela não insere seu ácido nucleico, macromoléculas que formam o DNA e o RNA nas células tratadas. A expectativa dos cientistas agora é que os nanoblades possam ser efetivamente usados para fins terapêuticos.

A técnica, de toda maneira, é ideal para intervenções precisas e pouco intrusivas. Além disso, é fácil de ser transmitida para outros laboratórios, porque utiliza materiais simples e moduláveis, lembram os pesquisadores. “O que esperamos é que a patente seja comprada para que pessoas que enfrentam uma verdadeira problemática em termos terapêuticos desenvolvam a técnica, investindo, criando uma equipe, e avancem na pesquisa, para que ela seja útil”, resume Philippe Mangeot.

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