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Brexit

Irlanda do Norte: entenda o calcanhar de Aquiles do Brexit

Na quarta-feira (28), a União Europeia apresentou a sua primeira minuta do contrato do Brexit. Isto é, o acordo de saída do Reino Unido do bloco europeu. Os termos do acordo, porém, foram imediatamente rechaçados pela primeira-ministra britânica Theresa May, criando uma nova crise no polêmico processo de divórcio entre os britânicos e os europeus. Na raiz das divergências está, mais uma vez, a questão da Irlanda do Norte.

Theresa May: proposta da UE "ameaça a integridade constitucional do Reino Unido".
Theresa May: proposta da UE "ameaça a integridade constitucional do Reino Unido". REUTERS/Francois Lenoir/File Photo
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O que é a Irlanda do Norte?

Quando a ilha da Irlanda se tornou independente do Reino Unido em 1922, formando a República da Irlanda, o extremo norte da ilha, habitado maioritariamente por protestantes de ascendência inglesa, permaneceu sob o controle do Reino Unido, com o nome de Irlanda do Norte. Durante mais de setenta anos, essa província britânica na ilha da Irlanda foi fonte de conflitos, guerras e terrorismo, provocados pela intolerância mútua entre protestantes (pró-Reino Unido), conhecidos como Unionistas, e católicos de ascendência irlandesa, que se consideravam colonizados pelos britânicos. Só em 1998, as duas partes se reconciliaram na assinatura do Good Friday Agreement ou, em português, o Acordo da Sexta-Feira Santa, que concedeu mais autonomia política à Irlanda do Norte e suspendeu a fronteira física com a República da Irlanda. Foi esse acordo, negociado durante anos, que deu fim ao terrorismo do IRA (Exército Republicano Irlandês), cujos membros, católicos, fundaram o partido político Sinn Féin.

O que aconteceria com essa fronteira no caso do Brexit?

Quem está pedindo para sair da União Europeia é o Reino Unido, e não a República da Irlanda. Logo, a solução simples e direta seria a reinstalação da fronteira entre a Irlanda e a Irlanda do Norte. Só que... Nos últimos 20 anos de paz entre as duas Irlanda, a fronteira foi completamente esquecida pelas pessoas e empresas que puderam desfrutar das vantagens da União Europeia. Cidades cresceram ultrapassando a antiga fronteira; propriedades foram unificadas através da linha divisória; a indústria, a agricultura e o comércio prosperaram sem as barreiras alfandegárias; e, sobretudo, 30 mil pessoas cruzam hoje a linha fronteiriça, sem o perceber, para trabalhar de um lado ou de outro.

Então, qual solução é proposta pela União Europeia?

Que o Reino Unido saia da União Europeia, mas a Irlanda do Norte fique! Claro que a proposta não lança mão de termos tão diretos, mas sugere, entrelinhas, que:

  1. Não se crie uma fronteira entra as duas Irlanda.
  2. Todos os mecanismos comerciais intraeuropeus, como a livre circulação de serviços, mercadorias e pessoas, sejam mantidos entre as duas Irlanda.
  3. A Irlanda do Norte continue respeitando todos as leis, regras e procedimentos comerciais da União Europeia.
  4. Consequentemente, o Reino Unido seria obrigado a criar uma fronteira internacional com a Irlanda do Norte, seu próprio território, para controlar a circulação de mercadorias e pessoas.

Em outras palavras, o Reino Unido estaria, virtualmente, aceitando perder a soberania sobre aquela parte do seu território.

E qual a resposta do governo britânico para a proposta da UE?

Nesta quarta-feira (28), a primeira-ministra britânica perdeu o rebolado que nunca teve. “Nem pensar”, foi a sua resposta à proposta de Bruxelas. Sobretudo porque, depois de uma eleição desastrosa, na qual os conservadores perderam a maioria do parlamento, May só consegue se manter no governo graças a uma coalizão estapafúrdia com um partido de protestantes, ultraconservadores da Irlanda do Norte, o Partido Unionista Democrático (DUP). Por isso, qualquer proposta europeia que tão-somente sugira uma fronteira entre o Reino Unido e a província, isto é, fazendo com que a Irlanda do Norte esteja politicamente mais próxima de Dublin do que de Londres, pode, simplesmente, derrubar o governo de Theresa May, com a debandada do DUP.

Sinuca de bico

Assim, a primeira-ministra está numa das maiores sinucas de bico da história britânica. A reinstalação de uma fronteira entre as duas Irlanda é impraticável – e pode ser perigosa, ao ressuscitar o espírito separatista dos católicos do Norte. Por outro lado, a proposta da União Europeia (fronteira entre a Irlanda do Norte e o Reino Unido) significaria a perda de soberania britânica e, consequentemente, a inevitável queda do gabinete de Theresa May, que ainda veria seu nome cair na lama da história.

Próximo capítulo

Nesta sexta-feira (2), Theresa May deve anunciar a solução proposta pela Grã-Bretanha para a questão da Irlanda do Norte no contexto do Brexit.

Seus inimigos políticos não veem a hora.

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