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Radar econômico

Crescimento econômico é incompatível com a preservação ambiental?

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Quase 200 países se reúnem em Madri, na Espanha, para negociar meios de diminuir as emissões de gases que provocam o efeito estufa, na Conferência do Clima da ONU (COP25). Na mesa, estão alternativas como aumento das energias renováveis e da reciclagem, o combate ao desmatamento ou a modernização dos transportes. No entanto, esse esforço é realmente útil enquanto o mundo continua a buscar cada vez mais crescimento econômico, que gera invariavelmente mais poluição?

Usina elétrica movida a carvão perto de Datong, na província chinesa de Shanxi, no norte da China.
Usina elétrica movida a carvão perto de Datong, na província chinesa de Shanxi, no norte da China. GREG BAKER / AFP
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Até pouco tempo atrás, o debate sobre o declínio ou decréscimo econômico como a única alternativa para enfrentar a crise climática era reservado a meia dúzia de sonhadores. Hoje, a ideia de parar de buscar o aumento do PIB a todo o custo ganha adeptos no mundo acadêmico e na imprensa, em especial entre aqueles que buscam um mundo com mais equilíbrio entre proteção ambiental, bem-estar pessoal e satisfação profissional.

O engenheiro e pesquisador Vincent Liegey é um dos idealizadores dessa vertente na França. Para ele, o conceito de desenvolvimento sustentável não passa de uma falácia, já que continua a pensar em soluções que dependem da energia e dos recursos naturais.

Vincent Liegey, engenheiro, pesquisador interdisciplinar, ensaísta
Vincent Liegey, engenheiro, pesquisador interdisciplinar, ensaísta Captura de tela

“Infelizmente, temo que todas essas COPs sejam reuniões inúteis porque, se não colocamos as questões corretas, jamais teremos as respostas certas. Desde o início, a noção do desenvolvimento sustentável escondeu o 'x' do problema, o nosso modelo econômico, capitalista e dependente do crescimento do PIB”, afirma. “Não há como termos crescimento sem impacto ambiental. É uma situação absurda: tentam apagar o incêndio colocando petróleo no fogo.”

Pacotes de medidas insuficientes

Philippe Meral, diretor de pesquisas do Instituto de Pesquisas do Desenvolvimento (IRD), é mais moderado sobre a questão – entretanto, concorda que os esforços evocados atualmente para prevenir os cenários mais catastróficos de degradação do clima não bastarão.

“A resposta é clara: é não. Uma atividade que gera crescimento, como a construção de infraestruturas, tem também um custo ambiental que hoje é ignorado. A realidade é que o problema do clima é tamanho que, sem mudanças drásticas dos modos de produção e consumo, as soluções possíveis graças à uma economia verde são insuficientes”, sublinha o pesquisador.

Philippe Méral, diretor de pesquisas do Instituto de Pesquisas em Desenvolvimento (IRD).
Philippe Méral, diretor de pesquisas do Instituto de Pesquisas em Desenvolvimento (IRD). Captura de tela: mobilefilmfestival.com e FB MobileFilmFestival

“Mas os especialistas se dividem bastante sobre como lidar com isso. Os que têm uma posição intermediária tentam conciliar os dois: crescimento econômico e proteção ambiental, através da noção de ‘crescimento verde’, que prega uma mudança no cálculo do PIB. Critérios ambientais deveriam ser incluídos nessa conta”, frisa Meral.  

Ideal mais difícil para países em desenvolvimento

A busca por mais crescimento econômico – que, ao menos na teoria, gera prosperidade - é inerente a qualquer governo do mundo, ao resultar em mais orçamento e popularidade. Por isso, o debate sobre o decréscimo da economia em nome da proteção ambiental é ignorado pelas esferas do poder – seja nas nações desenvolvidas como, principalmente, nas emergentes.

“São países que têm limitações e não podem sequer imaginar visar o decréscimo econômico”, explica o diretor de pesquisas do IRD. “Talvez essa questão devesse ser colocada para países com economias mais maduras, pós-industriais, como as europeias. Mas mesmo nestes países, é muito complicado, por isso tem essa ideia de desconectar o crescimento econômico da exploração do meio ambiente.”

Vincent Liegey pontua que essa dissociação não apenas seria a maneira mais eficaz de evitar a degradação do clima, como viabilizaria um modo de vida mais saudável para as populações – acarretando outros benefícios econômicos como ganho de produtividade e redução de gastos com despesas sociais. Essa mudança, sustenta, começa por diminuir radicalmente a dinâmica de consumo.

“É repensar a nossa relação com a natureza e buscarmos modos de produção em pequena escala, sustentável, como a permacultura, a agroecologia. Com isso, voltaremos a nos apropriar do nosso bem-estar e até da nossa relação com o trabalho”, defende o engenheiro, coordenador de um centro de pesquisas e experiência sobre o decréscimo econômico, Cargonomia, baseado em Budapeste.

“Poderemos sair de um trabalho obrigatório e migrar para uma atividade que nós escolhermos, deixando essa dinâmica mortífera do mundo do trabalho de hoje. O decréscimo econômico nos faz reposicionar no foco a questão do sentido do que estamos produzindo hoje, como e para quê”, planeja o francês.  

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