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Radar econômico

Aperto de bancos italianos acorda fantasma de nova crise financeira

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O fantasma de uma nova crise financeira ronda a União Europeia desde que os bancos italianos passaram a ser alvo de ataques na bolsa. A fragilidade do sistema bancário italiano é conhecida desde que o bloco europeu passou um pente fino nas principais instituições da comunidade europeia e reviu suas regras para evitar uma nova crise como a de 2008. Porém, poucos avanços permitiram ao país melhorar a confiança no setor, que agora sofre de uma perigosa baixa capitalização.

Banco Monte dei Paschi di Siena,  o mais antigo do mundo e o mais problemático da Itália.
Banco Monte dei Paschi di Siena, o mais antigo do mundo e o mais problemático da Itália. REUTERS/Mal Langsdon
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Sem melhoras, a pressão se acentua desde o início do ano. Com pouca liquidez e dependendo de créditos de risco, diversos bancos italianos estão à beira da quebra. O sistema do país é fragmentado e composto de dezenas de pequenos bancos pouco rentáveis: quatro quebraram no ano passado e dois foram resgatados neste ano com fundos privados, inclusive o tradicional MPS (Monte dei Paschi di Siena), o terceiro maior banco do país.

A recessão fez com que a inadimplência das pequenas e médias empresas subisse de 10%, em 2008, para 28% hoje. Esses créditos representam 17% do capital dos bancos.

Depois da Grécia, no ano passado, e do plebiscito no Reino Unido, no primeiro semestre, as atenções agora se voltam para a Itália, observa o economista Nicolas Véron, especialista em sistema financeiro do think tank Bruegel de Bruxelas. “Acho que os investidores que apostam na Europa estavam muito concentrados na campanha sobre o plebiscito britânico e os mercados são um pouco obsessivos: eles só se concentram em um grande assunto por vez. Uma vez que a poeira começou a baixar sobre o Reino Unido, era inevitável que eles se concentrassem na situação italiana, um problema que já era previsível antes do plebiscito”, explica.

“É claro que o Brexit não facilita as coisas na Itália, porque gerou uma queda geral das valorizações bancárias e dificulta a recapitalização dos bancos italianos. Mas o quadro italiano é um problema deles mesmos, e de forma alguma vem do exterior”, aponta o analista.

Negligência que virou bola de neve

O governo italiano é acusado de ter sido negligente em controlar a situação nos últimos anos e não impedir a bola de neve que agora ameaça a estabilidade bancária – € 360 bilhões distribuídos em crédito podem não retornar, o equivalente a 22% do PIB italiano em 2015.

As incertezas políticas acentuam o impasse. Até o fim do ano, os italianos vão às urnas para responder a um referendo constitucional promovido pelo primeiro-ministro Matteo Renzi. Se o resultado for desfavorável ao governo, o risco de uma verdadeira crise explodir aumenta.

“O problema agora é o lado político, que é muito maior do que o problema dos bancos, sobre o que vai acontecer no referendo sobre a reforma constitucional. Todos esperam que o governo vá ganhar, o que traria mais estabilidade política”, ressalta o economista Andrea Goldstein, diretor da consultoria italiana Nomista. “Mas se isso não acontecer, as dúvidas serão maiores, do ponto de vista da própria sobrevivência do governo Renzi, o que geraria incertezas – e, obviamente, as incertezas seriam muito negativas para os bancos e, em primeira linha, veríamos novos ataques dos mercados financeiros.”

Europa mais forte do que em 2008

Os dois especialistas discordam, porém, que as dificuldades italianas ameacem o sistema bancário europeu. Véron observa que, conforme as reformas adotadas depois da crise de 2008, o Banco Central Europeu (BCE) só deve intervir se a própria Itália não conseguir regularizar a situação.

“Esse problema é muito significativo e será difícil de resolver, mas ele não deve causar uma instabilidade na zona do euro similar à que vimos há quatro anos, nos piores momentos da zona do euro, quando havia inclusive dúvidas sobre a viabilidade da moeda única. É preciso relativizar o risco: é uma crise sobretudo italiana, embora afete a credibilidade do Banco Central Europeu, na sua nova função de supervisor bancário da zona do euro”, afirma o especialista do Bruegel.

Goldstein ressalta que as chances de o sufoco italiano se espraiar pela Europa também dependem da cooperação entre os motores da União Europeia, em especial a Alemanha, e os países que estão em uma situação econômica mais delicada. Não é de hoje que Berlim demonstra dúvidas sobre a capacidade de os países do sul realizar reformas – e essa falta de confiança poderia acentuar as pressões dos mercados.

O analista discorda, porém, que a Itália possa ser rotulada de “ponto fraco” do sistema bancário europeu. “É o ponto fraco no sentido de que é um país muito maior do que os outros que também têm problemas, mas não no sentido de ser um país que está à beira da quebra. É importante diferenciar”, nota o diretor da Nomista. “A Itália tem um grande superávit primário, tem contas externas positivas e, embora ainda muito devagar, a economia está saindo da recessão. Ou seja, não é comparável a uma situação como a da Grécia.”

Um grande plano de resgate dos bancos em dificuldades não parece ser uma boa alternativa, na visão dos especialistas: no momento em que o bloco se recupera do Brexit, significaria apenas colocar mais lenha na fogueira.

 

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