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Radar econômico

Propostas econômicas do governo apagam incêndio da recessão, mas não atacam a crise

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Já diz o ditado: no Brasil, o ano começa depois do Carnaval e, nesta semana, o Congresso inicia a análise das medidas econômicas apresentadas pelo governo para o país reagir à recessão. Em um contexto político que permanece engessado, as propostas de retorno da CPMF e de reforma da previdência são apontadas como bons remédios emergenciais para a crise. Mas economistas advertem que o pacote ainda precisa ser reforçado para combater os problemas mais profundos da economia brasileira.

O ministro da Fazenda, Nelson Barbosa.
O ministro da Fazenda, Nelson Barbosa. Lula Marques/ Agência
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Uma das prioridades do governo é reinstaurar a CPMF, na esperança de ajudar a fechar o rombo nas contas públicas. Apesar de ser impopular, a medida teria um retorno imediato, ao injetar até R$ 35 bilhões nos caixas do governo.

“A capacidade de arrecadação da CPMF está em uma ordem de grandeza diferente de outras medidas de recomposição tributária, como o aumento da CIDE sobre os combustíveis. Para atingir algum nível de superávit primário, como a meta estabelecida pelo governo, de 0,5% do PIB – que aliás, não deve ser cumprida -, o único imposto que tem um volume de arrecadação compatível com isso seria a CPMF, com a qual é possível se chegar a dezenas de bilhões de reais”, explica o economista David Kupfer, coordenador do Grupo de Indústria e Competitividade da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).

Retorno do Congresso vai ser prova de fogo para Barbosa

Com a volta da atividade no Congresso, o governo vai poder testar até que ponto o novo ministro da Fazenda, Nelson Barbosa, terá margem de manobra para agir contra a crise. O antecessor no cargo, Joaquim Levy, insistia em uma pauta de ajuste fiscal a curto prazo, que não teve apoio dos parlamentares. O professor do Instituto de Economia da Unicamp Guilherme Mello, pesquisador do Centro de Estudos de Conjuntura e Política Econômica, avalia que a rigidez desejada por Levy teria levado o país a uma espiral recessiva ainda maior.

“Na espiral recessiva, é muito difícil ou até impossível reencontrar um equilíbrio fiscal. Os países europeus mostraram isso recentemente. Sair da espiral recessiva é a nova orientação do governo, em que a preocupação com o ajuste fiscal é mais de médio a longo prazo, com uma reforma fiscal”, observa.

O governo promete colocar em votação mudanças na lei de responsabilidade fiscal, como a criação de mecanismos de flexibilização dos gastos em função do ciclo de crescimento e de limitação no ritmo do aumento das despesas. Na opinião de Kupfer, a prioridade número 1 deveria ser melhorar a eficiência do uso dos recursos.

“Há uma percepção de que é possível aumentar a produtividade do gasto público realizado correntemente no Brasil. Isso é bastante difícil: envolve mudanças nos mecanismos gerenciais e de gestão de recursos, mas é necessário avançar e, principalmente, sinalizar nessa direção”, destaca o professor da UFRJ.

Guilherme Mello concorda, e destaca que o Planalto está desperdiçando uma oportunidade de promover avanços ainda maiores, que teriam a vantagem de contar com um grande apoio popular. “Se vamos discutir uma mudança na estrutura fiscal brasileira a médio-longo prazo, seria necessário discutir mudanças na estrutura tributária, que é uma das que mais concentra renda no mundo: cobra muito dos pobres e muito pouco de quem tem mais. E em segundo lugar seria necessário fazer uma verdadeira reforma no Estado brasileiro, atacando questões como supersalários em todos os âmbitos, as superaposentadorias e até mesmo a redução dos cargos comissionados”, sugere o especialista da Unicamp.

Clima de confrontos no Congresso pode continuar barrando medidas econômicas

Nada disso, no entanto, vai ser tarefa fácil, em um momento em que os confrontos entre a base aliada permanecem e os clamores por impeachment pela oposição devem retomar. A Constituição estabelece que todo ato novo desejado pelo governo passe pelo Congresso.

O período prolongado de recesso, porém, acalmou o clima de guerra política que reinava no país no final de 2015. A trégua pode ajudar o Planalto a costurar mais apoios para aprovar as medidas. “Isso talvez ajude a desembrulhar o impasse político existente. Se a gente não tivesse parado, não teria melhorado, porque o nível de conflitos estaria se acirrando a cada dia, como no final do ano. Pelo menos agora podemos voltar em um quadro um pouco menos desorganizado”, analisa Kupfer.

O governo não tem tempo a perder: as projeções econômicas para 2016 e 2017 não são nada animadoras. O FMI prevê uma retração do PIB brasileiro de 3,5% neste ano e crescimento zero no ano que vem.
 

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