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Rendez-vous cultural

Manto cerimonial de Bispo do Rosário é exposto em mostra em Paris

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"Inextricabilia - Emaranhados Mágicos". Este nome, igualmente um emaranhado linguístico, designa a mostra em cartaz até 17 de setembro na fundação La Maison Rouge.

Manto de Arthur Bispo do Rosário foi escolhido para ilustrar cartaz da mostra Inextricabilia
Manto de Arthur Bispo do Rosário foi escolhido para ilustrar cartaz da mostra Inextricabilia Marc Domage/ Divulgação
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Em torno da temática das coisas enredadas, a exposição apresenta obras da arte sagrada ocidental, arte ritual africana, arte bruta, arte contemporânea e arte popular. A curadora Lucienne Peiry, que dirigiu por 11 anos a Coleção de arte bruta de Lausanne, fala sobre a escolha do nome complicado da mostra: "Inextricabilia é uma palavra difícil de dizer, aliás, foi escolhida de propósito porque é uma palavra que tem algo de mágico. E o que significa? Simplesmente ... coisas emaranhadas. Para essa exposição escolhi objetos de diferentes correntes,  países,  crenças,  séculos e épocas,  que têm todos uma coisa em comum: utilizam fios, barbantes, cordas, fitas, todo o tipo de fibras têxteis, às vezes usam até cabelos, galhos, fibras orgânicas, metálicas, fibras vindas da natureza, desfiadas... Esses criadores e criadoras, esses peregrinos, monges que vivem em claustros, são pessoas que não têm o estatuto de artista, e se lançam de corpo e alma na criação, com total liberdade".

Essas pessoas criativas e anônimas convivem com artistas famosos mundialmente como, por exemplo, a francesa Louise Bourgeois, presente com uma mulher de pano, que nos encara. "Vemos esse corpo, o corpo de uma mulher nua, que é remendada, costurada, feita com um tecido que não foi escolhido por acaso, um tecido rosa, que lembra, é claro, a pele, mas lembra também esparadrapos,  faixas utilizadas para fazer curativos, e as costuras são como cicatrizes. Louise Bourgeois dizia que sentia dores interiores,  sofrimentos, e que ela as curava, através de suas obras, que tinham um valor terapêutico e graças a ela, expulsava seus demônios".

Bispo do Rosário, um fascínio

O visitante Jean-Pierre, apaixonado por exposições que fogem dos rótulos já conhecidos, ficou encantado com a única obra exposta do brasileiro Arthur Bispo

Vista lateral do Manto da Apresentação, diante dos trajes com tiras de pano de chão trançadas, do italiano  Giuseppe Versino
Vista lateral do Manto da Apresentação, diante dos trajes com tiras de pano de chão trançadas, do italiano Giuseppe Versino Inextricabilia/Marc Domage

do Rosário, o maravilhoso "Manto da Apresentação", um traje ceremonial para ser vestido no dia de se apresentar diante de Deus quando tiver cumprido a missão na Terra. O manto foi realizado com uma complexidade de tirar o fôlego, com seu emaranhado de fiols, fitas e cordões multicoloridos costurados, bordados, torcidos e entrecruzados, com passamanarias exuberantes.

Jean-Pierre não conhecia o artista, que viveu isolado no quarto de um hospital psiquiátrico na periferia do Rio de Janeiro, antes de morrer em 1989. Ele tentou compreender a obra: "Não é arte bruta, porque é uma arte bem construída, vemos  signos, números  e formas totalmente reconhecíveis, enquanto que na arte bruta vemos formas que são sobrenaturais, não são verdadeiramente definidas. Há nomes escritos no forro do manto, eu diria que esses bordados formam um código linguístico, é a linguagem do seu pensamento que lembra um código como, por sinal, o estilo pré-colombiano. É sensacional, é magnífico, é o código cultural do seu pensamento. Precisamos somente saber se queremos entrar nesse código ou não, o que ele pode dar a cada indivíduo, é isso que é importante, se a arte dele é uma arte pessoal para se livrar dos seus próprios demônios, ou se é uma mensagem universal transmitida para outras pessoas", reflete Jean-Pierre, sem esconder seu fascínio diante do Manto da Apresentação, que ilustra o cartaz da exposição. 

Esculturas têxteis da americana Judith Scott, que tem Síndrome de Down, realizadas com fios de lã e materiais diversos
Esculturas têxteis da americana Judith Scott, que tem Síndrome de Down, realizadas com fios de lã e materiais diversos Inextricabilia/Marc Domage

Além de Bispo do Rosário, outros criadores internados em hospitais têm seus trabalhos expostos. Uma oportunidade para conhecer a vida e obra da americana Judith Scott, surda-muda e com Síndrome de Down, separada aos sete anos de sua irmã gêmea, com quem tinha grande cumplicidade através de uma linguagem sensorial. Arrancada de sua metade, ela viveu isolada, tendo reencontrado sua irmã 36 anos depois. O impacto emocional e físico do reencontro foi tamanho, que ela começou a desenvolver um trabalho onírico, realizando mais de duzentas esculturas, com todos os tipos de objetos como guarda-chuvas, revistas, chaves, rodas de bicicleta.  

Muitas obras rituais africanas e anônimas também podem ser vistas, como talismãs, amuletos, relicários, sempre tendo fios enrolados como referência.

Inextricabilia - Emaranhados mágicos, fica em cartaz na fundação La Maison Rouge até 17 de setembro.

 

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