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Uso de madeira para gerar eletricidade vira cabo-de-guerra com ambientalistas na Amazônia francesa

A floresta Amazônica, um dos biomas mais ricos e diversos do mundo, cobre 96% do território da Guiana Francesa. Um ecossistema fundamental diante dos desafios do aquecimento global. No entanto, a Guiana Francesa também é uma área de crescimento demográfico e com fortes necessidades para o bem-estar da população. A floresta e sua madeira oferecem, para alguns, fonte para a produção de eletricidade. Enquanto ambientalistas defendem a máxima preservação da floresta.

Homem caminha no meio da Amazônia francesa, em uma das cinco trilhas que permite explorar o Parque Amazônico da Guiana
Homem caminha no meio da Amazônia francesa, em uma das cinco trilhas que permite explorar o Parque Amazônico da Guiana © Guillaume Feuillet/Parc Amazonien de Guyane
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A vegetação é densa, o caminho é cheio de lama. O trajeto no meio da floresta Amazônica leva a um projeto de plantação e exploração de madeira que mexe com os ânimos na Guiana Francesa.

Não muito longe da cidade de Kourou, sede da base de lançamento de foguetes da França, uma empresa agroflorestal tenta desenvolver um filão de produção de madeira para construção e para uso como biomassa em usinas de energia elétrica. O projeto Mia (Maillet Inovação Agroflorestal) está situado em uma área de restauração floresta.

"Aqui era uma antiga plantação mista e, para que pudéssemos testar técnicas de plantio em terras abandonadas, tivemos que reconstituir a qualidade do solo", explica o empresário Stéphane Maillet. Para isso, ele contou com o apoio do Cirad, um centro de cooperação internacional em pesquisa agronômica para o desenvolvimento.

Nos últimos anos, ele vem adaptando seu plantio e descobrindo formas de exploração que tenham baixo impacto ambiental. Seu objetivo é produzir biomassa local e madeira para construção em uma área maior.

Em um terreno de 10.000 hectares fronteiriço ao centro espacial, 3.700 hectares seriam desmatados com um "método inovador de baixo impacto", explica Maillet. Parte da vegetação desmatada será triturada no local para produzir um tipo de cobertura vegetal que protege o solo contra a ação da chuva e é usado para sua nutrição. 

As árvores cortadas serão usadas para construção e o restante como biomassa para produzir eletricidade para o Centro Espacial da Guiana. A área, em seguida, será usada para plantar espécies interessantes para seu uso na construção civil e como biomassa.

O uso de biomassa em termelétricas seria um caminho de transição para uma fonte mais limpa de energia. Hoje, o gás e os combustíveis fósseis ainda são responsáveis por quase metade da eletricidade usada na Guiana Francesa

Apenas o centro espacial consome 15% de toda a energia elétrica produzida na região. O centro tem um projeto para tornar mais sustentável seu uso energético: duas usinas fotovoltaicas e duas usinas de biomassa estão sendo construídas.

"Estima-se que, no final, as usinas de biomassa precisarão de 100.000 toneladas de madeira por ano. E a Mia desempenhará um papel crucial nesse fornecimento", explica Laurence Monnoyer Smith, diretora de Desenvolvimento Sustentável da CNES, a Agência Espacial Francesa.

Madeira como fonte renovável?

O projeto Mia é um bom exemplo do atual debate explosivo que há na Guiana Francesa sobre os usos da floresta. Enquanto projetos continuam a se desenvolver com o objetivo de explorar os recursos naturais da Amazônia, vários ambientalistas reagem para garantir a conservação do meio ambiente e em prol do combate ao aquecimento global.

"A floresta é um sumidouro de carbono, juntamente com o oceano. Precisamos colocar nossa energia para proteger essas áreas, que são extraordinariamente biodiversas. A floresta está ameaçada pelo projeto. Precisamos preservar essas áreas, precisamos lutar contra o corte na floresta Amazônica francesa, especialmente quando sabemos que a madeira acabará em usinas de biomassa e que 500 cientistas nos alertaram sobre isso em um artigo no início deste ano", defende Claire Albanesi, da associação Mayuri Nature.

"As árvores são mais valiosas vivas do que mortas, tanto para o clima quanto para a biodiversidade. Para atingir a meta de zero emissões líquidas, seus governos deveriam estar trabalhando para preservar e restaurar as florestas, e não reduzi-las", diz Albanesi.

Wolfgang Kramer, diretor de pesquisa do CNRS e um dos autores do último relatório do IPCC, é outra voz contrária ao projeto agroflorestal. "Se queimarmos essas árvores, não será nada virtuoso. É pouco eficiente, temos muita perda de energia no processo, corremos o risco de começar a plantar árvores só", afirma. O pesquisador diz que a biomassa parece renovável, mas só é realmente se "esperamos a escala de tempo necessária para a recuperação das árvores e para que isso se torne energia verde".

No entanto, a chefe de desenvolvimento sustentável da agência espacial argumenta que a biomassa é uma das possibilidades viáveis de energia limpa.

"Não temos dinheiro para implantar o hidrogênio e seu uso para substituir combustíveis fósseis ainda não está maduro. Vamos fazer o quê? Pedir para as pessoas produzirem energia elétrica pedalando bicicletas?", ironiza Laurence Monnoyer Smith. "A gente precisa ser realista sobre o que é possível fazer e fazer isso da maneira mais sustentável possível. Não podemos deixar esse território à própria sorte em termos de energia."

O debate é quente e complexo. E envolve a discussão sobre formas de melhorar a vida de uma população que cresce 3% ao ano, em que nem todos tem acesso à rede elétrica.

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