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Promotores latino-americanos defendem Justiça argentina após ataques de presidentes a acusações contra Kirchner

Promotores de 11 países da América Latina manifestaram uma "profunda preocupação" com os "ataques contra as investigações judiciais" depois que os presidentes da Argentina, México, Colômbia e Bolívia, todos de esquerda, emitiram na noite desta quarta-feira (24) uma nota de apoio à ex-presidente e atual vice-presidente, Cristina Kirchner, acusando a Justiça argentina de promover um processo com "irregularidades" e uma "perseguição judicial para afastá-la da vida pública, política e eleitoral".

A vice-presidente argentina, Cristina Kirchner, cumprimenta apoiadores reunidos em frente ao Congresso Nacional, após fazer um discurso nas redes sociais, se defendendo de acusações contra ela em um caso de corrupção. Buenos Aires, Argentina, 23 de agosto de 2022.
A vice-presidente argentina, Cristina Kirchner, cumprimenta apoiadores reunidos em frente ao Congresso Nacional, após fazer um discurso nas redes sociais, se defendendo de acusações contra ela em um caso de corrupção. Buenos Aires, Argentina, 23 de agosto de 2022. REUTERS - AGUSTIN MARCARIAN
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Márcio Resende, correspondente da RFI em Buenos Aires

"Manifestamos nossa mais absoluta rejeição à injustificável perseguição judicial que tem sofrido a atual vice-presidente da Argentina. Tal perseguição tem como objetivo afastar Cristina Kirchner da vida pública para implementar um modelo neoliberal", denunciam os presidentes Alberto Fernández (Argentina), Luis Arce (Bolívia), Gustavo Petro (Colômbia) e Andrés Manuel López Obrador (México).

Os presidentes também acusam o processo contra Cristina Kirchner de "múltiplas irregularidades" e os "adversários políticos" e "as manchetes jornalísticas" de ataquarem as garantias legais. A nota foi difundida pelo presidente argentino, que tem criticado abertamente os promotores do caso, Diego Luciani e Sergio Mola.

Na última segunda-feira (22), estes promotores pediram 12 anos de prisão para a vice-presidente, acusada de liderar uma quadrilha responsável por fraudes no Estado, ao dirigir licitações de obras públicas a favor do empresário Lázaro Báez, considerado testa de ferro da família Kirchner. De acordo com o Ministério Público, a manobra teria desviado, pelo menos, US$ 1 bilhão.

"Trata-se da maior manobra de corrupção que já se conheceu no país", definiu o promotor Diego Luciani ao pedir uma condenação para as 12 pessoas que, de acordo com a acusação, participaram da quadrilha.

Teoria do 'lawfare"

Cristina Kirchner, de 69 anos, ficaria inelegível se uma eventual sentença fosse confirmada em segunda instância e revisada pelo Supremo Tribunal, um processo que poderia levar muitos anos. No entanto, líderes de esquerda da região vêm se somando ao coro da perseguição política e midiática.

"Cristina Kirchner é vítima de um novo ato brutal de 'lawfare'. Trata-se de pura perseguição política e midiática. É o método que a extrema direita adotou no continente para isolar líderes que vivem no coração do povo", afirmou a ex-presidente do Brasil Dilma Rousseff.

"Lawfare" é o termo usado pela esquerda latino-americana para definir uma guerra judiciária, criada pela direita, com o objetivo de intervir na política e destruir adversários.

"Até agora, Cristina Kirchner não foi condenada em nenhum processo e pôde ser candidata em todas as eleições. Falar de 'lawfare' ou de proscrição pode estar no imaginário político, mas, nos dados concretos da realidade jurídica de Kirchner, não há nenhum fundamento para sustentar isso", garante o advogado constitucionalista Andrés Gil Domínguez.

Uma mulher mostra um cartaz com os dizeres "Não há democracia sem justiça, CFK (Cristina Fernandez de Kirchner) presa", em frente à casa casa da vice-presidente argentina, em Buenos Aires, em 22 de agosto de 2022.
Uma mulher mostra um cartaz com os dizeres "Não há democracia sem justiça, CFK (Cristina Fernandez de Kirchner) presa", em frente à casa casa da vice-presidente argentina, em Buenos Aires, em 22 de agosto de 2022. AP - Natacha Pisarenko

Advertências de ingerência

Por outro lado, promotores de 11 países da América Latina manifestaram uma "profunda preocupação" com os "ataques contra as investigações judiciais" e criticaram a "indevida ingerência do presidente argentino na tarefa judicial", sobretudo quando "o Poder Executivo é o responsável por garantir a integridade física dos promotores".

Nota da Federação Latino-americana de Promotores afirma que o presidente argentino "adota a condição de parte, mesmo antes da participação das defesas, minando irregularmente a credibilidade do Ministério Público e afetando a independência e a imparcialidade dos promotores".

Para a organização Human Rights Watch, a postura do presidente argentino é "grave e inapropriada". "O pronunciamento do presidente Alberto Fernández é grave. Em um estado de direito, cabe à vice-presidente, Cristina Kirchner, defender-se com provas e com argumentos jurídicos; não por meio de ameaças nem de pronunciamentos do presidente", expressou Juanita Goebertus, diretora para as Américas da HRW.

Proteção

Depois deste pedido de prisão contra Kirchner, diversas vozes zelam pela segurança dos promotores, lembrando a morte do promotor Alberto Nisman.

Em janeiro de 2015, quatro dias depois de acusar a então presidente Cristina Kirchner por encobrir a participação do Irã no maior atentado terrorista na América Latina e horas antes de dar detalhes da denúncia no Parlamento, Alberto Nisman foi encontrado morto com um tiro na cabeça. A autópsia, marcada por irregularidades, revelou que Nisman cometeu suicídio, mas poucos acreditam nessa versão.

"Incentivar a ideia de que possa acontecer com Luciani o que aconteceu com Nisman. Até agora, o que se sabe de Nisman é que se suicidou. Espero que o promotor Luciani não faça alguma coisa assim", comparou o presidente Alberto Fernández.

O próprio governo argentino incentiva uma grande manifestação a favor da vice-presidente e contra a Justiça para "defender a democracia". "Não me preocupa que as pessoas saiam às ruas. Acredito que tenhamos de gerar uma grande mobilização para defender a democracia dos direitos humanos e pedir por uma Justiça independente", indicou o presidente.

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